Dez pontos para entender um relatório de sustentabilidade

Relatórios de sustentabilidade são ferramentas essenciais de divulgação das empresas em relação a seus resultados, compromissos e metas nas três grandes áreas do ESG: ambiental, social e governança.

Mais do que uma obrigação, esses documentos servem como canal de comunicação transparente para os stakeholders, como investidores, clientes, funcionários e sociedade, e fornecem informações sobre os impactos sociais, ambientais e econômicos das companhias, além das iniciativas para minimizar os impactos negativos de suas atividades.

Veja a seguir dez pontos importantes para a leitura e compreensão desses relatórios:

Materialidade é chave

A materialidade é um dos principais conceitos para entender esse documento, pois indica quais são as áreas prioritárias para as empresas e as partes interessadas. De acordo com o especialista em sustentabilidade Ricardo Voltolini, a melhor forma de saber que a organização ouviu seus stakeholders é por meio de entrevistas ou pesquisas com diferentes públicos de interesse.

Até o começo da década, as companhias indicavam sua matriz de materialidade. Agora, a orientação passou a ser apontar a dupla materialidade. "Além de considerar, na análise dos temas, como as atividades da organização impactam social e ambientalmente o entorno, também avalia-se como essas externalidades afetam o desempenho financeiro da empresa", explica o especialista.

No relatório Reporting Matters, avaliação feita pelo Cebds (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável) com base nos relatórios de 2022, os temas mais materiais compreenderam as áreas de áreas de mudanças climáticas, compliance e combate à corrupção, direitos humanos e condições de trabalho, desenvolvimento local, responsabilidade social, diversidade e combate ao assédio e à discriminação.

Como avaliar os temas mais importantes de E, S e G

Embora a importância de cada tema dependa da materialidade deles para as empresas, há alguns têm se destacado. De acordo com Voltolini, diversidade, equidade e inclusão; e saúde mental e impacto na comunidade têm sido pontos de atenção na área social. Na ambiental, as emissões de gases do efeito estufa são a grande preocupação. E, por fim, na governança, os temas mais materiais pertencem ao tripé ética, integridade e transparência.

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É importante que cada tema tenha indicadores que mostrem o desempenho no último ano, metas e plano de ação para alcançá-las. Segundo Ricardo Mastroti, diretor executivo do Cebds, embora a maioria dos relatórios analisados tragam objetivos prioritários, eles ainda falham em definir metas claras.

Os relatórios devem seguir algum padrão?

Os documentos podem seguir padrões reconhecidos internacionalmente, como o GRI (Global Reporting Initiative) e o ISSB (International Sustainability Standard Boards), ter uma metodologia própria ou não seguir metodologia. De acordo com o Cebds, 91% das corporações utilizam o GRI de forma isolada ou em conjunto com outras diretrizes.

Adotar um padrão é sinal de credibilidade, pois assegura transparência de dados e processos e garante que as informações divulgadas não sejam apenas as de interesse da empresa, argumenta Voltolini.

Por que devemos olhar para a cadeia de valor

Um dos maiores desafios da gestão de sustentabilidade é conseguir medir o impacto ambiental e social de toda a cadeia de valor que envolve o negócio. A cadeia compreende os processos que são feitos antes e depois das atividades da companhia, como fornecimento e distribuição. Em um frigorífico, por exemplo, ela abrange desde a produção do gado até a distribuição para os supermercados.

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"O relatório deve olhar para toda a cadeia porque muitos dos efeitos podem estar não dentro da própria operação da companhia ou de suas plantas industriais", explica Celso Lemme, professor do Coppead-UFRJ (Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro).

Como entender o que é reportado sobre emissões de carbono

A cadeia de valor é importante para entender resultados de emissão de carbono. Usando a terminologia do GRI, as empresas costumam reportar suas emissões citando os escopos 1, 2 e 3, sendo:

  1. Emissões diretas geradas pela organização
  2. Emissões indiretas, provenientes da compra de energia
  3. Outras emissões indiretas durante a cadeia de valor

Elas precisam relatar quanto emitiram em cada um dos escopos e dizer como pretendem neutralizá-las em um prazo determinado.

Segundo Voltolini, aqui é preciso avaliar a precisão da informação oferecida tanto na emissão - pelo uso de padrões confiáveis de medição - quanto nas metas de redução. Também é recomendado seguir orientações do SBTI (Science Based Targets Initiative), aponta.

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Além disso, Lemme alerta que as companhias também devem olhar para o risco climático, trazendo informações de como as mudanças climáticas podem afetar sua atividade e como elas se prepararam (inclusive financeiramente) para isso.

Como avaliar a área de inclusão

Assim como no tema anterior, dados reais de participação e metas precisas são essenciais para entender como a empresa trabalha essa pauta. Nos relatórios, ela deve apresentar seus indicadores de diversidade e inclusão, além de apresentar políticas institucionais não só para atrair, mas também treinar e desenvolver funcionários.

Esses resultados são importantes para a retenção de talentos, alerta Voltolini. Segundo o especialista, empresas que não são percebidas como diversas e inclusivas tendem a perder bons profissionais.

O que o documento não pode deixar de ter sobre governança

Para avaliar a governança, é preciso saber, basicamente, como as decisões são tomadas. E há pistas no relatório que indicam isso. Uma delas é a composição do conselho.

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De acordo com Lemme, as perguntas essenciais são as seguintes: "É um conselho dominado por um grupo de controle específico? Quantos membros são independentes? Tem um número ímpar de membros? Se for uma empresa com participação do governo, ele tem maioria de votos?"

Também é importante ver se a organização tem políticas definidas que dizem qual o compromisso e as práticas em relação a cada grande desafio de sustentabilidade.

Auditoria = credibilidade

A auditoria externa tem a missão de verificar as informações e os processos relatados e atestar se são reais e confiáveis. Portanto, é essencial para a credibilidade.

Segundo Lemme, as empresas "de primeira linha no Brasil e no mundo" já utilizam a certificação de terceira parte, que pode aparecer nos relatórios com a sigla SPO (second party opinion). O professor explica que há quatro grandes auditoras nesse mercado: Deloitte, Ernst & Young, PwC e KPMG.

Relato integrado fornece mais contexto

O processo considerado mais contemporâneo e completo é do relato integrado. Ele explica como a empresa gera valor e impacto em seis tipos de capitais: financeiro, social e de relacionamento, intelectual, manufaturado, humano e natural.

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Mesmo que as organizações não façam um relato integrado ou integrem os relatórios de sustentabilidade e financeiro, é preciso olhar conjuntamente para os resultados dessas áreas, sugere Lemme. Principalmente para checar se os temas apontados como destaque ou prioridade de fato possuem relevância financeira e o quanto representam no faturamento.

Segundo Carla Crippa, vice-presidente de Impacto e Relações Corporativas da Ambev, que teve um dos 10 relatórios mais bem avaliados pelo Cebds no ano passado, a empresa tem implementado elementos de integração e "acompanha as divulgações da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) com relação a novas padronizações".

Em 2023, a CVM lançou uma resolução que obriga as companhias de capital aberto a publicarem relatórios de sustentabilidade a partir de 2026.

Comparação é fundamental

Para entender o impacto de um resultado, é preciso comparar com outras empresas do mesmo setor e com resultados anteriores da companhia, alerta Lemme. Esta é também uma das prioridades da Ambev, aponta Crippa, que preza pela constância em métricas, cálculo, mensuração de dados e gestão interna a cada ano.

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