Do sertão para o mercado nobre: capacitação melhora criação de ovelha no RN

No sertão do Nordeste, o sustento de muitas famílias vem da produção agrícola e de animais, com o uso de técnicas tradicionais desenvolvidas por seus antepassados. Durante anos, esse foi o caso do agricultor Gilson Peixoto, 45, da comunidade Riacho das Carnaúbas, em Upanema, no Rio Grande do Norte.

Ele cresceu rodeado pela criação de cabras e ovelhas do avô e do pai. "O meu avô amava criar ovelhas", recorda, contando que no passado os produtores da família mal sabiam a diferença entre a carne da cabra e a de ovelha, por exemplo.

"Pra gente era tudo igual, nem sabia que a ovelha tinha maior valor de mercado", explica.

Ao aprender sobre cruzamento genético, Gilson passou a criar ovelhas que engordam mais rapidamente e têm mais carne, como as raça Santa Inês e Dorper
Ao aprender sobre cruzamento genético, Gilson passou a criar ovelhas que engordam mais rapidamente e têm mais carne, como as raça Santa Inês e Dorper Imagem: Gilson Peixoto/ Arquivo pessoal

Mas isso mudou. De um tempo para cá, a criação desses bichos deixou de ser feita apenas com ensinamentos passados de pai para filho. Com a ajuda da tecnologia, cruzamento genético e capacitações, Gilson descobriu formas de melhorar sua produção e aumentar o lucro de 15% para 35%, o que elevou a renda e a qualidade de vida de toda a família.

A virada aconteceu quando ele realizou o cadastro no Pronapp (Programa Nacional de Gestão da Agricultura Familiar). O sistema operacional reúne informações, cruza dados e produz relatórios que analisam as condições da atividade produtiva. Além de fornecer informações sobre a propriedade, a área de cultivo e a produção animal, Gilson passou a ter cada passo na comunidade monitorado pela plataforma.

A partir desse acompanhamento digital, ele descobriu, por exemplo, que apesar de a criação de gado também ser uma tradição na sua área, a produção de ovelhas oferecia melhor custo benefício.

No programa ainda são registradas vacinas e outros procedimentos veterinários realizados nos animais, garantindo a saúde da criação e perdas por doenças que poderiam ser evitadas. "Tudo isso deixa o animal mais forte", explica.

Gilson foi convencido a aderir à novidade pela Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente do município de Upanema, que teve a ideia de usar a plataforma. A ideia era conhecer melhor os produtores locais para identificar formas de aperfeiçoar as atividades rurais.

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Responsável pelo setor, Aisameque Dalyton conta que mobilizar os produtores a realizar o cadastro não foi fácil. No entanto, ele explica que assim que as informações foram colhidas, muitos descobriram potenciais que eram desperdiçados.

Dalyton conta que, para aproveitar as orientações que os dados da tecnologia apontavam, criou, com apoio do Sebrae, o Podema Rural (Programa de Assistência Técnica e apoio à Produção e Comercialização). "Esse programa de computador [Pronapp] é a cabeça do nosso trabalho, a gente não dá um passo sem ele. Com o sistema, a gente conheceu melhor os agricultores para apoiar o crescimento da produção", explica.

Gilson planta o sorgo que serve de alimentação para os animais, reduzindo custos da produção e garantindo a boa qualidade da dieta de suas ovelhas
Gilson planta o sorgo que serve de alimentação para os animais, reduzindo custos da produção e garantindo a boa qualidade da dieta de suas ovelhas Imagem: Gilson Peixoto/ Arquivo pessoal

Carne nobre e cuidados especiais

Nas capacitações, o produtor rural de Riacho das Carnaúbas aprendeu a distinguir a forma de manejo [o jeito de criar] e o valor de mercado da cabra e da ovelha —que seu pai e avô desconheciam.

Ele descobriu que a ovelha é uma carne nobre, que custa mais caro. Também entendeu que o animal necessita de cuidados especiais, para reduzir o número de mortes principalmente nos primeiros meses de vida.

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A perda de muitas ovelhas logo ao nascer sempre foi comum. Nem o avô, muito menos o pai e o próprio Gilson sabiam a causa de tantas mortes. Em uma das capacitações das quais participou no Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), o agricultor descobriu a causa.

"É preciso amamentar as ovelhas recém-nascidas com o colostro [o primeiro leite que a mãe ovelha]. Se o filhote nascer e você der outro tipo de leite, ela já não ganha resistência", afirma em tom didático.

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Imagem: Gilson Peixoto/ Arquivo pessoal

Também entendeu a necessidades de outros cuidados especiais, como mudar a dieta dos animais conforme a fase da produção: "Quando está gestando, a ovelha precisa de uma alimentação com 25% de proteína. Quando está amamentando, a quantidade já é outra", diz.

Outro diferencial é que Gilson planta o próprio sorgo, grão que serve como base da alimentação das ovelhas. Com isso, não só reduz os custos da produção, como garante a boa qualidade da comida oferecida para os bichos.

Cruzamento genético

Foi também nesta fase de unir os conhecimentos tradicionais com a capacitação que Gilson descobriu que há raças de ovelhas que são mais lucrativas. "Aquelas que engordam rapidamente, em seis meses, são melhores para vender." Para garantir um rebanho com esse tipo de animal, o agricultor passou a fazer cruzamento genético.

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Hoje, ele "mistura" as raças Santa Inês com Dorper. A Santa Inês é uma raça típica do Nordeste, que não possui pelagem. É resultante das seguintes variedades: Morada nova, Somalis e Bergamácia. Mesmo com a presença de variedades europeias no sangue, caso da raça leiteira Bergamácia, a Santa Inês é essencialmente rústica, com traços genéticos herdados da Morada nova.

A Dorper, por sua vez, tem origem na África do Sul e é conhecida por sua facilidade de engorda e capacidade de produção de carne. Essas características fazem dela uma raça de corte. Sua origem vem do cruzamento das raças Dorset Horn e Blackhead Persian.

Gilson vende suas ovelhas em feiras e exposições, sem atravessadores
Gilson vende suas ovelhas em feiras e exposições, sem atravessadores Imagem: Gilson Peixoto/ Arquivo pessoal

Empolgado com os novos aprendizados e o cruzamento genético, o agricultor ampliou o rebanho de 45 para 80 ovelhas em apenas seis meses.

Com isso, hoje Gilson tem mais animais para comercializar em feiras e exposições. É a carne de cordeiro saindo do sertão e indo direto para compradores do mercado nobre.

Ele vende os animais em condições para o confinamento e também comercializa cortes diretamente para o consumidor final.

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"Agora, que eu descobri como chegar direto ao consumidor, não tem atravessador, o lucro é muito melhor", destaca.

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