BB emprestou mais de R$ 10 milhões a acusado de usar agente laranja
de Ecoa
30/04/2024 13h49Atualizada em 01/05/2024 11h59
Um levantamento a partir de dados públicos realizado pelo Greenpeace Brasil mostra que o Banco do Brasil concedeu mais de R$ 10 milhões em crédito rural ao fazendeiro Claudecy Oliveira Lemes, acusado de utilizar ilegalmente em suas fazendas no Pantanal agrotóxicos desfoliantes, dentre eles a substância 2-4-D - um dos componentes do "agente laranja".
O que diz a investigação da ONG?
- O pecuarista teve quatro financiamentos concedidos pelo Banco do Brasil entre março de 2021 e março de 2022. Os contratos estão vigentes e somam R$ 10.017.840,00, com vencimentos entre 2027 e 2029. Todos eles foram concedidos à Fazenda Soberana.
- Em 2021, o BB concedeu três empréstimos a Claudecy para aquisição de 3 mil cabeças de gado. Em 2022, um novo empréstimo do BB foi concedido para a aquisição de um avião.
- De acordo com o Greenpeace, em 2021 a JBS comprou gado da fazenda, que estava embargada por desmatamento.
- Claudecy Oliveira Lemos é proprietário de 11 fazendas no Pantanal. A Fazenda Soberana foi multada em R$ 6.853.650,00 no ano de 2020 por desmatamento ilegal em uma área equivalente a 1.370 hectares aplicado pelo órgão SEMA/MT.
- Há indícios de uso ilegal do fogo em 2023, com registro de uma área queimada estimada em 2.500 hectares dentro dos limites da fazenda.
- Em um dos autos de infração emitidos em 2023 pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente/MT (Auto de Infração nº 1369000223), a Fazenda Soberana também aparece como receptora dos agrotóxicos possivelmente utilizados para a prática de desmate químico realizado nas fazendas vizinhas, todas de Claudecy.
- Além da Soberana, outras quatro fazendas de Claudecy no Pantanal foram objeto de embargo da SEMA/MT. Sete autos de infração foram registrados nessas propriedades rurais entre 2017 e 2021. No total, esses autos somam R$ 37.896.943,50 em multas aplicadas.
O caso dos agrotóxicos
- Em depoimento virtual no dia 16 como parte de uma investigação da Polícia Civil de Mato Grosso sobre o desmatamento químico, o pecuarista ficou em silêncio.
- O caso do uso ilegal do componente do "agente laranja" no Pantanal veio à tona após uma reportagem do "Fantástico" de 14 de março. Os agrotóxicos são usados para a prática de desmatamento químico de vegetação nativa para a criação de gado.
- Segundo o Ministério Público do Mato Grosso, Claudecy terá que pagar R$ 5,2 bilhões entre multas aplicadas pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e valoração do dano ambiental, considerado o maior já registrado no estado mato-grossense. Ele também já foi alvo de outras ações judiciais que resultaram na indisponibilidade de 11 fazendas, na apreensão judicial dos animais dessas propriedades e no embargo das áreas afetadas.
O que diz o BB
Procurado por Ecoa, o BB disse por meio da assessoria de imprensa que o banco não comenta casos específicos em respeito ao sigilo bancário e reiterou o compromisso para seguir as legislações e regulamentações sobre o tema. "O BB está seguro sobre a conformidade em seus processos de concessão de crédito, que são acompanhados por órgãos reguladores e fiscalizadores."
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O que diz a JBS
Em nota enviada a Ecoa, a JBS afirma que "as fazendas cadastradas em nome do pecuarista em questão estão bloqueadas para compra pela JBS. Em todos os biomas, a Política de Compra Responsável de Matéria-Prima da Companhia impede a aquisição de animais em propriedades com desmatamento ilegal, terras indígenas, territórios quilombolas ou unidades de conservação ambiental. Também é exigido que não utilizem mão de obra em condição análoga à escravidão nem tenham embargos ambientais."
Para se aprofundar
- Os dados da investigação do Greenpeace Brasil, imagens e documentos do caso estão disponíveis aqui.
- O BB é personagem do relatório "Bancando a Extinção: bancos e investidores como sócios no desmatamento" - lançado em abril pelo Greenpeace Brasil - que denuncia como a falta de controle adequado dos bancos na concessão de crédito rural. (Relatório liga bancos a fazendas com ficha suja na Amazônia).
- Brasileiro ganha prêmio por investigação que ligou carne a desmatamento
- Leia a íntegra da nota do BB:
"O BB não comenta casos específicos em respeito ao sigilo bancário.
Afirmamos, com veemência, que o BB toma medidas proativas e voluntárias que observam todas as legislações e regulamentações sobre o tema, atuando na vanguarda da sustentabilidade bancária.
O BB está seguro sobre a conformidade em seus processos de concessão de crédito, que são acompanhados por órgãos reguladores e fiscalizadores.
As nossas políticas seguem critérios socioambientais na análise e condução de todos os empréstimos e financiamentos.
Exigimos dos tomadores de crédito a apresentação de documentos que comprovem a regularidade socioambiental dos empreendimentos.
Diante dessa premissa, não concedemos crédito rural a empreendimento localizado em imóvel rural em que exista embargo de órgão ambiental competente, Federal ou Estadual, decorrente de uso econômico de áreas desmatadas ilegalmente no imóvel rural e desde que registrado na lista de embargos do Cadastro de Autuações Ambientais e Embargos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), conforme previsto no MCR 2-9. Além da base de embargos do Ibama, o BB verifica a lista de embargos emitidos pelo ICMBio.
O Banco do Brasil possui processo automatizado, com uso de soluções analíticas que verificam se a área a ser financiada possui restrições legais ou vedações normativas, utilizando bases públicas. As operações são submetidas à ferramenta Diagnóstico Geo Socioambiental, com uma verificação caso a caso, que impede a contratação da operação no caso de sobreposição com as bases geográficas impeditivas.
Ainda assim, todas as operações de crédito contam com cláusulas que permitem a decretação do vencimento antecipado e a suspensão imediata dos desembolsos em caso de ocorrência de infringências socioambientais; e o Banco faz valer essa cláusula sempre que qualquer irregularidade é constatada. De forma diligente e conforme previsto no MCR, o BB efetua o monitoramento constante e a fiscalização das operações de crédito rural para verificar a adequação da condução do empreendimento pelo mutuário; a situação das garantias vinculadas e a compatibilidade do empreendimento ou do mutuário com o programa ou a linha de crédito objeto do financiamento. Este processo de monitoramento e fiscalização busca identificar operações com indícios de irregularidades e prevenir possíveis desvios de finalidade na contratação e na condução dos empreendimentos financiados, conforme definido na regulamentação aplicável ao crédito rural.
Na página de sustentabilidade do BB constam exemplos da aplicação prática de nossa diligência social, ambiental e climática."