Chicotada climática: o que é o fenômeno que pode intensificar fogo nos EUA?
Do UOL, em São Paulo
10/01/2025 10h22
Diversos bairros de Los Angeles foram devastados por um dos piores incêndios da história da Califórnia. O fogo na região não é uma novidade, mas as mudanças climáticas podem estar intensificando o processo. Isso é o que mostra um estudo publicado nesta quinta-feira na Nature Reviews Earth & Environment.
Ainda que os ventos de Santa Ana impulsionem a devastação dos incêndios, um fenômeno denominado "chicotada climática", reflexo do aquecimento global, está tornando o território ainda mais vulnerável.
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Só no bairro de Pacific Palisades, o fogo consumiu 6,9 mil hectares, o que foi descrito como "um dos desastres naturais mais destrutivos da história de Los Angeles", segundo a chefe dos bombeiros.
Estamos num evento de chicotada: de chuva a seca, no sul da Califórnia. A evidência mostra que a chicotada hidroclimática já aumentou devido ao aquecimento global, e um maior aquecimento da Terra provocará aumentos ainda maiores.
Daniel Swain, cientista climático da UCLA ao Los Angeles Times
Oscilações bruscas de chuva para seca podem ter agravado os incêndios. O estudo mostrou que nos últimos dois anos os invernos na Califórnia foram excepcionalmente chuvosos —o que provocou o crescimento de arbustos e grama no território. Com a chegada da primavera, o clima esquentou e tornou a área de Los Angeles muito seca. Essa mudança brusca foi nomeada de "chicotada climática" pelos cientistas.
Essa sequência de chicotadas na Califórnia aumentou o risco de incêndio duas vezes: primeiro, aumentando enormemente o crescimento de grama e arbustos inflamáveis nos meses que antecederam a temporada de incêndios e, em seguida, secando-os a níveis excepcionalmente altos. (...) Quando os ventos fortes se sobrepõem a condições de vegetação extremamente seca, como é o caso atualmente, podem ocorrer condições de incêndio florestal muito perigosas.
Daniel Swain, cientista climático da UCLA ao Los Angeles Times
Fenômenos atmosféricos explicam mudanças bruscas. No estudo, os pesquisadores comparam a função da atmosfera como uma esponja: a cada grau de aquecimento da Terra, a atmosfera evapora, absorve e libera 7% mais água que o normal. Em poucas palavras, isso significa que é possível ver ambientes mais úmidos —mas quando a seca se instala, eles podem tornar-se também mais secos que antes.
O problema é que a esponja cresce exponencialmente, como os juros compostos num banco. A taxa de expansão aumenta com cada fração de grau de aquecimento.
Daniel Swain, cientista climático da UCLA
Aquecimento global influenciou o aumento das 'chicotadas climáticas'. Os pesquisadores identificaram que, com o constante aumento da temperatura da Terra, este fenômeno de oscilação brusca de tempo está mais frequente. Eles examinaram dados meteorológicos do século 20 e concluíram que as "chicotadas climáticas" cresceram de 31% a 66%. A previsão é a de que elas mais do que duplicarão nos próximos anos, caso a temperatura média global aumente 3ºC em comparação com os níveis pré-industriais.
Fenômeno não está restrito aos EUA. Entre exemplos citados pelos cientistas, estavam as chuvas torrenciais e inundações na África Oriental em 2023, que antecedeu uma longa seca. "O aumento da chicotada hidroclimática pode acabar por ser uma das mudanças globais mais universais numa Terra em aquecimento", disse Swain ao Los Angeles Times.
Além dos incêndios, "chicotadas" trazem riscos de inundações repentinas, deslizamentos de terra e surtos de doenças. Os pesquisadores afirmam que será necessário mudanças nas práticas de gestão de água e infraestrutura para lidar com o novo cenário. Além disso, eles apontam a necessidade de frear o aquecimento global para mitigar os danos.
Não podemos olhar apenas para chuvas extremas ou secas extremas, porque temos de gerir com segurança estes fluxos de água cada vez mais enormes, ao mesmo tempo que nos preparamos para interlúdios progressivamente mais secos.
Daniel Swain, cientista climático da UCLA ao Los Angeles Times