'Policiais da água' fazem de Las Vegas uma cidade-modelo em tempos de seca
Conhecida no mundo por ser um oásis para a indulgência excessiva, a desértica cidade de Las Vegas emergiu como um surpreendente modelo de austeridade quando se trata do uso da água.
Aproximadamente 2,3 milhões de pessoas vivem na árida região, e 40 milhões de turistas visitam seus enormes cassinos e hotéis a cada ano.
No entanto, como Nevada pode usar apenas menos de 2% da água do ressecado rio Colorado, o governo teve de tomar medidas drásticas: desde proibir a irrigação do jardim até limitar o tamanho das piscinas nas residências.
Mesmo com a cidade tendo quase duplicado de tamanho nos últimos 20 anos, reduziram em mais de 30% o uso do poderoso, porém, minguante rio.
"Las Vegas fez um grande trabalho vendendo uma imagem de excessos e decadência, mas nossa comunidade é extremamente eficiente no uso da água", declarou o porta-voz da Autoridade da Água do Sul de Nevada, Bronson Mack.
Isso se deve a um pacote de leis rígidas, incentivos econômicos e campanhas educativas, criado durante a severa seca dos anos 2000, quando Nevada consumiu além da cota que lhe correspondia do Rio Colorado, sua principal fonte de água.
Agora, no momento em que autoridades federais estudam cortes obrigatórios no abastecimento para o impactado oeste dos Estados Unidos, Las Vegas "se tornou uma estrela da conservação da água" e "um modelo para as cidades" da região, disse o pesquisador Brian Richter.
A patrulha da água
Na Strip de Las Vegas (a região mais turística da cidade), as exuberantes atrações dos cassinos, como as águas dançantes do Bellagio e os canais do Venetian, utilizam água não potável de poços privados.
Nos crescentes subúrbios, as "Patrulhas da Água" circulam desde cedo em busca de irrigadores quebrados e de mangueiras com goteiras.
Filmam as infrações antes de colocar uma placa no gramado, caso seja o primeiro descuido, ou uma multa para transgressores reincidentes.
"Têm duas semanas para pagar a infração por desperdício de água", disse Cameron Donnarumma.
Alguns donos se sentem "um pouco insatisfeitos" ao encontrarem "policiais da água" em seus jardins antes do amanhecer, comentou Donnarumma, mas a maioria coopera.
De fato, seu trabalho depende de que moradores denunciem, em um aplicativo, os vizinhos que desperdiçam água, o que resulta em 20 a 50 visitas por dia.
Em 2027, estará proibido regar grama apenas decorativa, exceto em residências unifamiliares.
Las Vegas oferece 3 dólares (R$ 15) aos donos por cada pé quadrado (0,3m) de grama que removam e substituam por alternativas que demandem irrigação mais eficiente.
O programa foi copiado por outras cidades americanas, como Los Angeles e Phoenix, mas é difícil de replicar em localidades menores.
"Orçamentos reduzidos e uma capacidade limitada para oferecer incentivos financeiros em cidades pequenas podem ser um obstáculo para programas de conservação de água", observou um estudo recente.
Política
Os programas nem sempre contam com boa recepção popular.
A dona de casa Tedi Vilardo disse à AFP que rega seu jardim de acordo com as regras, por não mais de 12 minutos, mas encontrou "vários pontos mortos".
"Vou desafiar as regras", disse ela, lembrando que, no último inverno, "choveu bastante".
Tedi não quer grama artificial, porque tem dois filhos e "ela queima os pés deles".
A recente regra que limita o tamanho das piscinas a 56m² também irritou pessoas como Kevin Kraft, que desenha modelos enormes delas.
Segundo Kraft, a indústria do setor não foi consultada antes de as normas serem adotadas, e um limite baseado no percentual do tamanho total do terreno de uma casa economizaria mais água.
Para ele, "grande parte é política". As autoridades de Nevada estavam "sob pressão" do governo federal e "tinham que economizar", explicou.
Ele questionou, por sua vez, outros estados do oeste pela conservação da água. "Sequer se aproximam [de Nevada]", comentou.
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