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STF julga ação que pode encurtar punição de condenados na Ficha Limpa

8.fev.22 - O ministro do STF Nunes Marques, relator da ação da Ficha Limpa no tribunal - Nelson Jr. / STF
8.fev.22 - O ministro do STF Nunes Marques, relator da ação da Ficha Limpa no tribunal Imagem: Nelson Jr. / STF

Rafael Neves

Do UOL, em Brasília

09/03/2022 04h00Atualizada em 09/03/2022 11h21

O STF (Supremo Tribunal Federal) começa a julgar hoje, a partir das 14h, um processo que pode beneficiar políticos enquadrados na Lei da Ficha Limpa. A decisão dos ministros vai influenciar, na prática, o tempo em que os afetados pela norma ficarão com os direitos políticos suspensos e, portanto, inelegíveis.

Criada em 2010, a lei da Ficha Limpa prevê oito anos de inelegibilidade para quem for condenado por um órgão colegiado, em segunda instância. Segundo a legislação, porém, esses oito anos só começam a contar ao final do trâmite judicial, após o cumprimento da pena. Com isso, alguns políticos ficam inelegíveis por mais tempo que outros, a depender da duração do processo.

A ação foi movida em dezembro de 2020 pelo PDT, que alegou ver discrepâncias na aplicação da Ficha Limpa. O relator do caso, ministro Nunes Marques, deu razão ao partido e determinou que o tempo de inelegibilidade não pode ultrapassar os oito anos previstos na legislação.

Conforme o entendimento de Nunes Marques, o político enquadrado na Ficha Limpa já fica proibido, sob as regras atuais, de concorrer em eleições por todo o período entre a condenação e o cumprimento da pena. Esse período, portanto, deve ser descontado dos oito anos de suspensão, segundo o ministro.

O Supremo vai confirmar ou alterar a decisão de Nunes Marques, que está em vigor. Em setembro do ano passado, o caso foi levado ao plenário virtual da Corte, mas o ministro Alexandre de Moraes suspendeu o processo para analisar os autos. Em novembro, Moraes liberou o caso para julgamento.

Ainda não está claro quantos políticos podem ser afetados. Em janeiro de 2021, semanas depois da decisão de Nunes Marques, o UOL apontou que pelo quatro prefeitos não haviam conseguido tomar posse depois de terem vencido nas urnas dois meses antes, por conta da indefinição.

Em dezembro de 2020, Nunes Marques definiu que a decisão valeria para todos os que saíssem candidatos a partir daquele momento. Mas o ministro Luís Roberto Barroso, que já votou em setembro, defendeu que a nova regra só passe a valer um ano após o julgamento, ou seja, se aplicaria a partir das eleições de 2024.

Embate

Inscrita no processo como amicus curiae (amigo da Corte), condição em que poderá se manifestar no julgamento, o MMCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral) se opõe à ação do PDT.

Segundo a entidade, o artigo questionado pela legenda não pode ser alterado, porque é o "coração" da lei da Ficha Limpa e o "principal motivo que impulsionou a gigantesca mobilização popular havida em favor da sua aprovação".

Além disso, segundo o MCCE, seria aberta uma brecha para "a candidatura de indivíduos que claramente não ostentam vida pregressa compatível com o que se espera de governantes e legisladores".

Outra entidade, o INAC (Instituto Não Aceito Corrupção), afirmou em nota que "teme que o enfraquecimento da Lei da Ficha Limpa possa permitir que candidatos suspeitos de corrupção possam participar das eleições".

Especialistas em direito eleitoral, no entanto, divergem a respeito desse entendimento. Para o secretário-geral da Abradep (Associação Brasileira de Direito Eleitoral), Volgane Carvalho, o pedido do PDT foi correto e a punição dos condenados deve ser uniformizada na Ficha Limpa.

Na avaliação de Carvalho, um político enquadrado na Ficha Limpa fica em uma situação de "chantagem": se recorrer contra uma sentença criminal, o candidato estará prolongando o trâmite do processo judicial contra si e, dessa forma, prolongando sua punição, porque os oito anos só começam a contar ao final do cumprimento da pena.

"A Ficha Limpa tem esse aspecto: se eu sou condenado e resolvo recorrer, fico inelegível por muito mais tempo do que devia. A gente não pode colocar as pessoas para optarem pelo direito que pareça mais favorável. Não é possível impor um ônus desse a quem deseja recorrer de uma condenação criminal", argumenta.