Pacheco: Discurso contra as urnas não vai vingar; tema está superado
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), rebateu falas dadas ontem pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) durante uma transmissão ao vivo. O chefe do Executivo revelou a intenção de, junto a seu partido, contratar uma empresa privada para auditar as eleições deste ano e criticou o sistema atual brasileiro, pontos refutados por Pacheco.
O senador falou ao UOL News hoje ser "óbvio que uma auditoria de voto impresso no Brasil é inexequível porque não há voto impresso no Brasil, é eletrônico e assim será esse ano", contrariando uma afirmação de ontem feita por Bolsonaro: "[a empresa privada contratada] pode falar que é impossível auditar e não aceitar fazer o trabalho, olha a que ponto nós vamos chegar".
"Esse questionamento é muito antigo. Antes de Jair Bolsonaro assumir a presidência ele já falava isso, mas ele esbarra na obviedade de que é seguro, não há mais dúvida. Está superado isso", reforçou.
O presidente do Senado disse que a insinuação do chefe do Executivo é desnecessária, "porque cabe à Justiça Eleitoral o começo, meio e fim da auditoria" e a interferência pode gerar ainda mais atrito entre os Poderes.
Não podemos permitir que o discurso eleitoral possa descambar em uma crise institucional, nosso papel é demonstrar que a sociedade pode confiar nas urnas
Rodrigo Pacheco
Pacheco ocupa a presidência da República hoje já que Bolsonaro, o vice Hamilton Mourão (Republicanos) e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), estão fora do país.
Não há fraude comprovada
Desde que as urnas eletrônicas foram implementadas —parcialmente em 1996 e 1998, e integralmente a partir de 2000— nunca houve comprovação de fraude nas eleições brasileiras, mesmo quando os resultados foram contestados. A segurança da votação é constatada pelo TSE, pelo MPE (Ministério Público Eleitoral) e por estudos independentes.
Em outubro, o TCU (Tribunal de Contas da União) emitiu um relatório técnico reforçando que as urnas são seguras e auditáveis, e que a impressão do voto traria riscos e exigiria recursos que não estão disponíveis atualmente na Justiça Eleitoral.
Entenda a auditoria do voto pelo TSE
O processo de auditoria das urnas eletrônicas começa um mês antes da eleição, quando a Justiça Eleitoral nomeia, em sessão pública, as Comissões de Auditoria de Funcionamento das Urnas Eletrônicas. Elas devem ser formadas por um juiz de direito e no mínimo seis servidores da Justiça Eleitoral. O Ministério Público escolhe um procurador para acompanhar o processo. A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e representantes de partidos políticos também costumam participar da auditoria.
Depois, a Justiça Eleitoral precisa divulgar, com pelo menos 20 dias de antecedência, os horários e locais do sorteio das urnas a serem auditadas; e da auditoria no dia da eleição.
Na véspera da votação, tem início a Auditoria de Funcionamento das Urnas Eletrônicas — o nome oficial do processo conhecido como "votação paralela", que serve para verificar se as urnas estão registrando votos corretamente. A auditoria é feita por amostragem. Nas eleições municipais de 2020, o número de urnas a serem auditadas em cada estado variou de três a cinco, dependendo do número de seções eleitorais que a unidade da federação possuir.
A Justiça Eleitoral sorteia as urnas para auditoria em cerimônia pública. Elas são retiradas das seções eleitorais e levadas para o local onde será feita a auditoria. As urnas removidas são substituídas.
Ainda na véspera da votação, representantes de partidos políticos preenchem cédulas com seus votos. As cédulas são guardadas em urnas de lona lacradas.
No dia da votação, a "votação paralela" começa junto com a votação oficial. Depois da emissão da zerésima — a prova de que não há votos nas urnas, ou seja, estão zeradas — os votos das cédulas preenchidas no dia anterior são digitados na urna eletrônica e num sistema paralelo, em um computador. O procedimento é público e costuma ser exibido ao vivo pela internet (veja aqui um exemplo do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul).
Com a votação encerrada, a própria urna imprime o boletim de urna, que mostra o resultado da eleição naquele equipamento. O sistema auxiliar também emite um boletim. Os dados dos dois são comparados pela comissão de auditoria.
Na votação oficial, os boletins de urna podem ser conferidos por qualquer cidadão. Além disso, os partidos podem fazer, de forma independente, a soma dos votos a partir do Registro Digital de Voto (RDV) de cada urna e comparar com o resultado final apresentado pelo TSE.
O RDV é um arquivo digital similar a uma tabela. Ele grava os votos de cada eleitor e os posiciona de forma aleatória no arquivo, como se a ordem fosse embaralhada, para preservar o sigilo da escolha de cada pessoa. O boletim de urna é gerado a partir das informações do RDV.
Se houver fraude na transmissão, na soma ou na divulgação dos votos, o RDV de cada urna pode ser consultado. Uma fraude nesse registro dependeria da violação das várias camadas de segurança no hardware e no software da urna, o que o TSE considera extremamente difícil de acontecer.
Cúpula do TSE defende processo eleitoral
Em dois eventos distintos da semana passada, os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Roberto Barroso, respectivamente presidente, vice e ex-presidente do tribunal, marcaram posição contra a ofensiva do presidente à Justiça Eleitoral.
Ao ser questionado, durante visita ao Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, sobre o papel das das Forças Armadas nas eleições, Fachin disse não existir no Brasil a figura de um poder moderador para intervir na Justiça Eleitoral. A declaração foi feita dois dias depois de Bolsonaro pedir uma "apuração paralela" das urnas feitas por militares.
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