Em novo plano, campanha de Lula muda revogação da reforma trabalhista
O novo texto com as diretrizes para o programa de governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) amenizou o trecho em que cita a "revogação da reforma trabalhista". Após descontentamento e pressão de aliados, a peça fala em revogação apenas dos "marcos regressivos da atual legislação trabalhista".
O documento, ao qual o UOL teve acesso, foi redigido por representantes dos sete partidos da aliança e deverá ser apresentado em coletiva amanhã (21). O texto servirá de base para o programa de governo, que também receberá propostas de setores populares. Pontos como revogação do teto de gastos, reforma tributária e combate à grilagem foram mantidos —ao menos por enquanto. Ainda cabe revisão.
A revogação da reforma tem sido um dos temas mais sensíveis entre as novas propostas do PT. Em seus discursos, Lula já vem falando em criar uma nova legislação trabalhista, mas a palavra "revogação" tem causado desconforto entre aliados, em especial do PSB —partido do pré-candidato a vice, Geraldo Alckmin, e do Solidariedade.
A proposta inicial, enviada pelo PT aos outros partidos no início de junho para discussão, indicava que o grupo "defende a revogação da reforma trabalhista feita no governo [Michel] Temer".
O novo governo irá propor, a partir de um amplo debate e negociação, uma nova legislação trabalhista de extensa proteção social e trabalhista a todas as formas de ocupação, de emprego e de relação de trabalho [...], revogando os marcos regressivos da atual legislação trabalhista, agravados pela última reforma e reestabelecendo o acesso gratuito à justiça do trabalho."
Documento atualizado com diretrizes do plano de governo
Para a campanha de Lula, este texto deixa mais claro o que o ex-presidente já tem repetido a seu público, sugerindo uma legislação discutida pelo governo e por empresas, sindicatos e trabalhadores. O petista tem feito discursos com fortes posições à esquerda, o que chama atenção de parte dos aliados, na tentativa de dialogar diretamente com o trabalhador.
A revisão da reforma, no entanto, estava cada vez mais pacificada na aliança. Até Alckmin, que defendia a manutenção da reforma quando concorreu à presidência em 2018, passou a ressaltar seus pontos críticos.
Em meio à polêmica, a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR), tentou minimizar o caso, na semana passada, e disse que "revisar e revogar são verbos equivalentes".
"O novo governo incentivará o debate e as iniciativas de reestruturação sindical, que democratizem o sistema de relações de trabalho no setor público e no setor privado, urbano e rural, respeitará a autonomia sindical, visando incentivar as negociações coletivas, promover solução ágil dos conflitos, garantir os direitos trabalhistas, assegurar o direito à greve e coibir as práticas antissindicais", diz ainda o texto.
Na área de economia, o texto segue referendando a revogação do teto de gastos e a realização de uma reforma tributária "solidária, justa e sustentável, que simplifique tributos e em que os pobres paguem menos e os ricos paguem mais".
Os posicionamentos contra as privatizações da Petrobras e Eletrobras foram mantidos, mas a parte do texto que citava que a petrolífera seria "colocada de novo a serviço do povo brasileiro e não dos grandes acionistas estrangeiros" foi suprimida.
No total, 117 diretrizes
O novo texto tem, ao todo, 117 diretrizes —27 a mais do que o documento enviado pelo PT— e serve como esboço das diretrizes. Ele deverá ser chancelado e assinado pelos presidentes dos sete partidos em reunião em São Paulo amanhã, antes de ser apresentado à população. Além do PT, compõe a coligação PSB, PSOL, Rede, PCdoB, PV e Solidariedade.
No geral, o texto é moldado por um forte tom contra o governo Jair Bolsonaro (PL), principal concorrente de Lula, com críticas ao enfrentamento "bélico" na política de combate às drogas, ao crime ambiental e grilagem (chamado de "milícias") e no fortalecimento do SUS (Sistema Único de Saúde) e do real.
As diretrizes servirão de base para a construção do programa de governo de Lula e Alckmin, que também receberá contribuição de setores populares.
Veja outros pontos ressaltados no documento:
Reestruturação previdenciária
"Buscaremos um modelo previdenciário que concilie o aumento da cobertura com o financiamento sustentável. A proteção previdenciária voltará a ser um direito de todos e de todas."
Reforma agrária e agroecológica
"A construção de sistemas alimentares sustentáveis, incluindo a produção e consumo de alimentos saudáveis. Daremos apoio à pequena e média propriedade agrícola, em especial à agricultura familiar. Políticas de compras públicas podem servir de incentivo à produção de alimentos saudáveis e de qualidade."
Fortalecimento do real
"Reduzir a volatilidade da moeda brasileira por meio da política cambial também é uma forma de amenizar os impactos inflacionários de mudanças no cenário externo."
Política de valorização do salário mínimo
"Visando a recuperação do poder de compra de trabalhadores e dos beneficiários de políticas previdenciárias e assistenciais, essencial para dinamizar a economia, em especial dos pequenos municípios."
Reindustrialização
"Reverter o processo de desindustrialização e promover a reindustrialização de amplos e novos setores e daqueles associados à transição para a economia digital e verde."
Contra a privatização da Petrobras
"A Petrobras terá seu plano estratégico e de investimentos orientados para a segurança energética, a autossuficiência nacional em petróleo e derivados, a garantia do abastecimento de combustíveis no país."
Contra a privatização da Eletrobras
"Será mantida como patrimônio do povo, preservando nossa soberania energética, e viabilizando programas como o Luz para Todos, que terá continuidade, e uma política sustentável de modicidade tarifária."
Renovação do Bolsa Família
"Um programa que, orientado por princípios de cobertura crescente, baseados em patamares adequados de renda, viabilizará a transição por etapas, no rumo de um sistema universal e uma renda básica de cidadania."
Desenvolvimento justo, solidário, soberano e sustentável
"Mobilizar de maneira virtuosa as potencialidades da economia brasileira e suas principais frentes de expansão: o mercado interno com potencial de produção e consumo em massa, as capacidades estatais com potencial de gasto social e investimento público, as infraestruturas econômicas, urbanas e sociais, além do uso ambientalmente sustentável de recursos naturais estratégicos com inovações industriais e proteger os bens de uso comum."
Fortalecimento do SUS
"O aprimoramento da sua gestão, a valorização e formação de profissionais de saúde, a retomada de políticas como o Mais Médicos e o Farmácia Popular."
Nova política sobre drogas
"O atual modelo bélico de combate ao tráfico será substituído por estratégias de enfrentamento e desarticulação das organizações criminosas, baseadas em conhecimento e informação, com o fortalecimento da investigação e da inteligência."
Promover transição ecológica
"Cumprir as metas de redução de emissão de carbono que o país assumiu na Conferência de 2015 em Paris e ir além, garantindo a transição energética; a mudança das atividades produtivas para um padrão ambientalmente sustentável; a recuperação de terras degradadas por atividades predatórias; reflorestamento das áreas devastadas; e um amplo processo de preservação da biodiversidade e dos biomas. "
Combate à grilagem
"Combater o crime ambiental promovido por milícias, grileiros, madeireiros e qualquer organização econômica que haja ao arrepio da lei."
Fortalecimento dos blocos internacionais, com foco regional
"Fortalecer novamente o Mercosul [Mercado Comum do Sul], a Unasul [União de Nações Sul-Americanas], a CELAC [Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos] e os BRICS e estabelecer livremente as parcerias que forem melhores para o país, sem submissão a quem quer que seja."
Promoção da igualdade racial e de combate ao racismo estrutural
"Construiremos políticas que enfrentem o genocídio e a perseguição à juventude negra, com o superencarceramento, e que combatam as violências policial, contra as mulheres negras, contra a juventude negra e contra os povos e comunidades tradicionais de matriz africana e de terreiro."
Proteção dos direitos dos povos indígenas
"Temos o dever de assegurar a posse de suas terras, impedindo atividades predatórias, que aviltem seus direitos. "
Aprimorar o combate à corrupção
"Assegurar que os instrumentos de combate à corrupção sejam restabelecidos, respeitando o devido processo legal, de modo a impedir a violação dos direitos e garantias fundamentais e a manipulação política."
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