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Por eleição, Congresso trava pauta bolsonarista e mira em assistencialismo

Bolsonaro com o presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco, ao lado do presidente da Câmara, Arthur Lira - Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Bolsonaro com o presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco, ao lado do presidente da Câmara, Arthur Lira Imagem: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Gabriela Vinhal

Do UOL, em Brasília

05/07/2022 04h00

A quase três meses das eleições, parlamentares governistas têm pressa para articular o andamento das pautas defendidas pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) para dar recado ao eleitor até 2 de outubro. Enquanto os projetos defendidos pelo "bolsonarismo raiz", mais ideológicos, naufragam, ganham fôlego ao menos aqueles de viés econômico e, principalmente, os que miram no assistencialismo.

Mas o prognóstico é ruim: de agora até o dia do primeiro turno, a tendência é que o ritmo de votações diminua, uma vez que congressistas se dividem entre Brasília e suas bases eleitorais para dar andamento às campanhas. O Centrão, contudo, está empenhado em tentar reduzir a rejeição do presidente e conquistar o eleitorado mais pobre, por exemplo.

Com isso, a "PEC (proposta de emenda à Constituição) das Bondades", que autoriza o gasto de mais de R$ 40 bilhões para financiar subsídio a caminhoneiros e taxistas em ano eleitoral, além de autorizar a ampliação das parcelas do Auxílio Brasil, avançou no Congresso e foi aprovada na última quinta no Senado.

O texto deve ser aprovado na Câmara nesta semana, se tiver a tramitação encurtada pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). Isso porque Lira, aliado de Bolsonaro, pode apensar a proposta à PEC dos biocombustíveis, que já é analisada pelos deputados. A manobra regimental, entretanto, é criticada pela oposição.

Prioridades esvaziadas

A lista de 45 propostas enviadas neste ano por Bolsonaro como prioridade para análise dos parlamentares não avançou e apenas sete delas foram aprovadas na Câmara e no Senado até o momento — o equivalente a 15% do total.

Regulamentação do homeschooling, flexibilização do porte de armas e redução da maioridade penal são algumas das propostas bolsonaristas que fracassaram no Congresso.

Na Câmara, por exemplo, foi aprovado o texto que cria regras para a educação domiciliar. Apesar de ser uma pauta do Executivo, era também defendida pela bancada evangélica, aliada do presidente. No entanto, desde que chegou no Senado, não caminhou.

O líder do governo no Senado, Carlos Portinho (PL), admitiu a falta de consenso em torno do texto e afirmou que o foco do governo neste ano é reduzir o preço dos combustíveis e combater a alta inflação que assola a população brasileira. Apesar do revés, Portinho afirmou que o Palácio do Planalto ainda tem poder de pautar o Legislativo.

Mas, das 38 propostas que ainda não foram analisadas, além do homeschooling, apenas seis chegaram a passar por ao menos uma das Casas Legislativas, mas não tiveram sucesso na outra. O restante nem sequer saiu das comissões — primeira etapa de tramitação — ou foram formalizadas.

Composição da base

Para o analista André Santos, da Contatos Assessoria Política, o baixo aproveitamento reflete a "base aliada instável" de Bolsonaro no Legislativo desde 2019, primeiro ano do mandato.

De lá para cá, o presidente conseguiu eleger um aliado à Presidência da Câmara, o deputado Arthur Lira (PP-AL), que deu sobrevida às propostas com convergência entre partidos do Centrão, como é o caso das bancadas classificadas por ele como "independentes".

Esse grupo reúne 206 deputados nas seguintes siglas: MDB, PSDB, União Brasil, PSD, Cidadania, Solidariedade, Podemos, Avante, PTB e Pros. "São partidos que não têm alinhamento completo com Bolsonaro, mas votam com o governo em assuntos em comum, principalmente em projetos do agro e de retomada econômica", explicou Santos.

Por isso a dificuldade em aprovar pautas ideológicas, que alimentam a narrativa bolsonarista. A base aliada do presidente é basicamente composta pelos partidos PP, PL, Republicanos, Patriota e PSC, que somam, ao todo, 190 parlamentares. Para Santos, o grupo não é alinhado a Bolsonaro, mas a Lira, que intermedeia as demandas do Executivo.

"A base aliada está associada principalmente às questões econômicas. Quando entram as questões ideológicas, a base se afasta. O Lira mesmo não assume o compromisso com o mérito delas, como foi o caso do voto impresso", completou.

Em agosto de 2021, a Câmara enterrou o projeto que determinava a impressão dos votos das urnas eletrônicas. À época, o texto foi aprovado por 229 deputados. Mas, por se tratar de uma mudança na Constituição, eram necessários 308 apoiamentos.

"A democracia do plenário dessa Casa deu uma resposta a esse assunto. E, na Câmara, espero que esse assunto esteja definitivamente encerrado", declarou Lira ao proclamar o resultado à época.

Articulação desorganizada

Para Adriano Loureno, gerente de Análise Política e Econômica da Prospectiva Consultoria, essa agenda de votação gira em torno de Lira, devido à "desorganização" na articulação do Palácio do Planalto com o Congresso Nacional: "O governo não foi uma liderança relevante para puxar a pauta do Legislativo, vemos sendo votados os interesses do Centrão, do Lira".

E completou: "Temos visto uma falta de interesse do próprio governo de avançar nas próprias agendas. Não tem um plano, não tem empenho". Ele citou os projetos de reforma tributária, do imposto de renda e da privatização dos Correios. São pautas econômicas, mas que não avançaram e nem devem avançar no Congresso neste ano.

Durante praticamente o mesmo período no ano passado, 10 propostas das 35 — o equivalente a 28% — da lista do governo havia sido aprovada — foi o ano de maior proximidade de Bolsonaro com o Centrão.

Em 2020, como houve a pandemia da Covid, os projetos aprovados foram basicamente voltados ao estado de calamidade. Mas, em 2019, quando Bolsonaro não queria negociar com o Congresso, foi apenas de 11%. Das 34 apresentadas, quatro foram aprovadas.

"Existe uma certa produção de propostas da economia que não vão ser levadas adiante, por serem 'podadas'. Isso foi muito claro no início do governo, em 2019. O Ministério da Economia apresentou novas propostas, mas houve um desencontro nas secretarias. Havia ainda o empenho para a reforma da Previdência e depois perdeu o protagonismo", completou.

Relação de projetos

Aprovados nas duas Casas:

MP 1085/2021 - MP dos Cartórios - Sistema Eletrônico dos Registros Públicos

PLP 11/2020 - Tributos sobre o diesel (ICMS com redução de alíquota e zerou Pis/Cofins, que seria uma atribuição do Legislativo)

MP 1076/2021 - Benefício Extra Auxílio Brasil

MP 1077/2021 - Programa Internet Brasil

MP 1090/2021 - Renegociação e perdão de dívidas do FIES

MP 1089/2021 - Voo Simples - gratuidade no despacho de bagagens

PL 1613/2021 - Incorporação de tecnologias ao SUS

Aguardando análise (ou em comissões em no plenário de alguma das Casas):

PL 4188/2021 - Marco Legal das Garantias

PL 3887/2020 - Cria a Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS), em substituição ao Pis/Cofins

PEC 110/2019 - Reforma tributária dos impostos sobre consumo

PL 2337/2021 - Reforma do Imposto de Renda

PL 591/2021 - Privatização dos Correios

PL 3228/2021 - Identificação Civil Nacional

PL 4391/2021. Apensado ao PL 1202/2007 - Regulamentação do Lobby

PL 490/2007 - Marco Temporal das terras indígenas

PL 4315/2021. Apensado ao PL 751/2007 - Acessibilidade para leitura para pessoas com deficiência

PL 6160/2019 - Contrato Verde e Amarelo, que flexibiliza a CLT

PL 4847/2019 - Recursos para ações de fiscalização ambiental e reflorestamento

PL 3729/2004 - Licenciamento ambiental

PL 6539/2019 - Política Nacional sobre a Mudança do Clima

PL 528/2021. Apensado ao PL 290/2020 - Mercado de Carbono

PL 5518/2020 - Concessões Florestais

PL 360/2021. Apensado ao PL 5530/2019 - Veda a saída temporária da prisão

PL 6438/2019 - Porte de armas (categorias)

PL 3723/2019 - CAC (armas)

PEC 3/2019 - Auxílio-reclusão

PEC 115/2015 - Maioridade Penal

PL 1776/2015 - Pedofilia como crime hediondo

PL 3780/2020 - Abuso sexual praticado por pessoas de confiança

PL 6299/2002 - Lei dos Agrotóxicos Lei do Alimento Mais Seguro

PL 1293/2021 - Autocontrole na Produção de Alimentos

PLS 510/2021. Apensado ao PL 2633/2020 - Regularização Fundiária

PL 191/2020 -Mineração em Terras Indígenas

PL 2401/2019. Apensado ao PL 3179/2012 - Regulamentação do ensino domiciliar (homeschooling)

PL 6/2020 - Progressão Continuada / Educação

PL 414/2021 - Modernização do Setor Elétrico

PL 2646/2020 - Debêntures de Infraestrutura

PLS 589/2021 - Controle de qualidade de medicamentos

PL 2552/2021 - Rastreamento de medicamentos