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Aras e Lira mantêm silêncio sobre reunião de Bolsonaro com embaixadores

Rafael Neves

Do UOL, em Brasília

20/07/2022 14h22Atualizada em 20/07/2022 14h24

Entidades e autoridades públicas têm se posicionado, desde a última segunda-feira (18), contra a reunião que o presidente Jair Bolsonaro (PL) conduziu no Palácio da Alvorada para expor a embaixadores um conjunto de suspeitas infundadas sobre o sistema eleitoral brasileiro. Houve reação de políticos da oposição, chefes de Poderes, presidenciáveis, procuradores de todo o país e entidades jurídicas.

O volume de reclamações tem contrastado, até o momento, com o silêncio do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do procurador-geral da República, Augusto Aras. Passados dois dias dos ataques do presidente às instituições, ainda não houve manifestação de Lira, que chegou ao comando da Câmara em aliança com o governo, nem de Aras, indicado de Bolsonaro para chefiar a PGR.

Aras, que até o momento não apresentou nenhuma denúncia contra Bolsonaro ao longo de quase três anos de mandato, deverá ser provocado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) a se posicionar sobre a reunião com os diplomatas. No dia seguinte à reunião, líderes de sete partidos de oposição pediram ao Supremo que o presidente seja investigado por crime contra o Estado democrático de Direito.

A petição, que já foi recebida pelo Supremo, deverá ser encaminhada pelo ministro relator diretamente à PGR, que vai determinar se há indícios para a abertura de um inquérito e, eventualmente, de uma acusação formal. A tendência, no entanto, é que isso não ocorra: segundo a colunista Carolina Brígido, do UOL, o órgão não vê crimes na manifestação de Bolsonaro.

Segundo integrantes da PGR ouvidos pela coluna, Bolsonaro apenas emitiu a opinião dele sobre o sistema eleitoral, sem fazer ataques que possam caracterizar crime. A oposição aponta o delito de "tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais", que prevê de 4 a 8 anos de prisão.

Arthur Lira também não emitiu comentários sobre o caso. Interlocutores próximos de Lira, ouvidos pelo UOL, afirmam que ele não compactua com as avaliações do presidente e que já defendeu publicamente a democracia e as urnas eletrônicas.

Desde a fala aos embaixadores, contudo, o deputado não repudiou a fala publicamente, seja por nota oficial ou por manifestações em redes sociais. A postura é diferente, por exemplo, da adotada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (União-MG), que declarou que a segurança das urnas eletrônicas e a lisura do processo eleitoral não podem mais ser colocados em dúvida.

O UOL procurou as assessorias de imprensa de Lira e da PGR, mas nenhuma delas emitiu comentários até o momento.

Reações

As respostas à fala de Bolsonaro começaram ainda na tarde de segunda-feira. O ministro Edson Fachin, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e um dos principais alvos do discurso do presidente, afirmou em evento da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) que "há inaceitável negacionismo eleitoral por parte de uma importante personalidade pública".

Sem citar Bolsonaro nominalmente, Fachin disse que o presidente levou aos diplomatas uma "grave acusação de fraude, acusação de má-fé a uma instituição, mais uma vez sem apresentar prova alguma". Ao lado dos ministros Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes, Fachin foi a figura mais atacada pelo presidente no discurso no Alvorada.

Os chefes dos tribunais superiores em Brasília também repudiaram o discurso. O presidente do STF, ministro Luiz Fux, fez ontem uma videochamada com Fachin para discutir os "recentes ataques" de Bolsonaro às instituições. O presidente em exercício do STJ (Superior Tribunal de Justiça), Jorge Mussi, também condenou as falas do presidente, afirmando que "jamais houve evidência de fraude" nas urnas.

Apesar da avaliação inicial da PGR de que não haveria crime na atitude de Bolsonaro, o órgão tem sido pressionado para tomar providências. Ontem, um grupo de mais de 40 procuradores federais dos Direitos dos Cidadãos, representando todos dos estados e do Distrito Federal, entregou a Aras uma notícia-crime contra o presidente.

Outra manifestação partiu das três maiores entidades de delegados e peritos da Polícia Federal. Em nota, os profissionais desmentiram uma declaração feita por Bolsonaro durante a reunião: a de que um inquérito aberto pela corporação em 2018, para apurar uma ataque hacker ao TSE, teria concluído que o sistema do tribunal "é um queijo suíço, como uma peneira".

A nota é assinada pela ADPF (Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal), a APCF (Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais) e a Fenadepol (Federação Nacional dos Delegados de Polícia Federal).

Em conjunto, as organizações afirmaram "que as urnas eletrônicas e o sistema eletrônico de votação já foram objeto de diversas perícias e apurações por parte da PF e que nenhum indício de ilicitude foi comprovado nas análises técnicas".