Qual o papel de uma Kombi na vida de um dos melhores atletas do Brasil?
Há sete anos, seu Moacir Romani dirigia um ônibus de sua empresa de turismo levando idosos para uma excursão quando uma carreta colidiu com o veículo na rodovia Erechim-Concórdia (BR-153). Moacir morreu no local. Darlan Romani, um dos maiores nomes do atletismo brasileiro atualmente, perdeu o pai, mas não o esqueceu.
Mesmo com 1,88m e 155kg, ele se espreme atrás do volante de uma Kombi 1974 que comprou após o acidente. Quem olha para o veículo com Darlan lá dentro questiona como alguém tão grande consegue dirigir o veículo.
Mas não importa. A Kombi, que Darlan chama de seu xodozinho, é do mesmo modelo que o pai usava.
A ideia era reformar o veículo e deixá-la igual à do pai. Ainda não conseguiu. "Fiz a parte mecânica e ando com ela para cima e para baixo feliz da vida. É uma forma de homenagear o meu pai, cada vez que eu entro na Kombi eu fico olhando, pensando, eu lembro", diz o catarinense.
Ele se diverte pela desconfiança com o carro. "A funilaria está feia. O pessoal olha, o cara que trouxe no guincho ficou olhando... Eu coloquei gasolina, coloquei a bateria. Ele falou 'isso aí não funciona'. Eu comecei a dar risada. Na primeira virada de chave, ela funcionou e ele ficou doido. É Kombi!"
Carro virou atração para atletas
Darlan foi quinto colocado na Olimpíada de 2016 em sua prova. Entre fevereiro e abril de 2019, foi líder do ranking mundial, com um arremesso de 21,83 metros. Hoje, ele é o terceiro melhor atleta do planeta e uma das esperanças de medalha do Brasil no Pan-Americano de Lima, em julho, e para as Olimpíadas de Tóquio, em 2020.
Mesmo entre a intensa rotina de treinos, ele queria retribuir e mostrar o que o esporte fez para sua vida. Queria fazer eventos para ajudar crianças e divulgar o atletismo, mas ao conhecer a burocracia, aderiu ao instituto do ex-atleta Sanderlei Parrela, em Bragança Paulista. Ex-atleta do salto com vara, sua esposa Sara passou a ajudar Sanderlei na administração, enquanto o catarinense auxilia nos eventos.
A instituição faz o "Atletismo na Rua", com atletas como o campeão olímpico Thiago Braz. A caminhonete que usaria para levar o equipamento do evento quebrou. Foi aí que a Kombi entrou em ação. "Todo mundo que trabalhou no evento, os atletas que foram voluntários, todo mundo queria andar na Kombi, queria dirigir".
Tamanho é incomum também fora da Kombi
Darlan não é grande só dentro da Kombi. Fora também. Passear em um shopping decidido a comprar novas roupas não é uma opção. Não é fácil encontrar roupas de seu tamanho para vestir no dia a dia.
"É bem difícil de achar roupa. Eu uso 4G. Quando você vê uma loja que tem, compra. Não tem aquilo de sair para comprar roupa, como a maioria das pessoas fazem. Às vezes você está andando e vê tamanho grande, entra lá e se serviu, tem que levar, né", explica o atleta que mora em Bragança Paulista.
Além disso, não é qualquer peça que ele pode comprar como qualquer pessoa com o corpo menor. Há roupas que ele gostaria de comprar, mas nunca consegue encontrar no seu tamanho: "Um casaco de couro. Até hoje eu não achei um do meu tamanho".
Imagine um gigante de 1,88m e 155kg no avião
As dificuldades para viajar começam no despacho da bagagem até que Darlan consiga comprovar que é atleta. Ao adentrar o avião, o desconforto aumenta a cada hora nas longas viagens. Medindo 1,88 m e pesando 156 kg, o catarinense fica apertado na poltrona a cada voo. E são muitos para competir no esporte que escolheu.
Darlan carrega uma mala só para o material de treino do arremesso de peso. São bolas de ferro que pesam mais de 7 kg. "Sempre tem treta porque é uma bola de ferro pesada. Os caras várias vezes falaram que era bomba", conta Darlan.
"Dia 29, eu estou indo para Doha para fazer a Diamond League e são 17 horas de voo. Eu sou um cara de 155 kg, sou pesado, sou grande, então imagine num banco do avião. Fica extremamente difícil", diz o atleta do Pinheiros.
Temporada e distância da filha
O catarinense compete no dia 28 de abril em Bragança Paulista, no GP Brasil de Atletismo, antes de uma série de viagens que incluem a Liga de Diamante, os Jogos Pan-Americanos de Lima e o Campeonato Mundial em Doha.
Recordista sul-americano com 22 m, Darlan não gosta de falar as metas para o ano e tem uma preocupação: a filha Alice, de 3 anos. "Minha pururuca", brinca.
Não habituada às viagens do pai, ela foi hospitalizada durante a preparação da Rio-2016. "Ela já sofreu bastante, no ano da Olimpíada ficou internada duas vezes com pneumonia, tadinha", revela o atleta.
"Na primeira vez, eu ligava em casa e minha esposa 'não posso falar agora' e desligava o telefone. No terceiro dia eu falei 'quero saber da minha filha', aí ela me mandou uma foto da nenê com negócio no nariz e acesso na mão", lembra.
"Essa é a parte mais difícil eu acho, tanto ela quanto a esposa, você vai e demora para voltar, só por internet e telefone, não é a mesma coisa de você estar junto. Mas tem que fazer, porque a vida de atleta é uma vida curta", finaliza o atual terceiro colocado no ranking mundial da IAAF.
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