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Varejão revela noite em claro, drama da noiva e medo da morte após doença

Anderson Varejão está recuperado de uma embolia pulmonar e quer voltar às quadras - Luiza Oliveira/UOL
Anderson Varejão está recuperado de uma embolia pulmonar e quer voltar às quadras Imagem: Luiza Oliveira/UOL

Luiza Oliveira

Do UOL, em São Paulo

17/05/2013 06h02

Quem vê o sorriso largo, o jeito tranquilo e a fala mansa de Anderson Varejão jamais imagina que sua vida esteve em risco nos últimos meses por causa de uma grave doença. Hoje, o ala-pivô do Cleveland Cavaliers demonstra até um ar de alívio ao dizer que está curado de uma embolia pulmonar. Mas passou noites em claro, lidou com o drama de sua família e, admite, sentiu medo.

"As pessoas olham e falam ‘ah ele está na NBA, ganha bem, está ótimo’, mas ninguém sabe o que você passou." A frase dita no início da entrevista ao UOL Esporte, em um hotel da Zona Sul de São Paulo, expressa bem o que um dos melhores jogadores de basquete do mundo sente. Os US$ 8, 4 milhões que ele fatura por ano representam pouco diante do valor da saúde e do amor das pessoas ao seu redor.

“Eu poderia ter morrido, paro pra pensar ‘pô... estava tudo bem, minha fase era ótima. E, de repente, em uma semana poderia não estar mais aqui. Por que eu? Porque isso está acontecendo comigo?'."

"Você passa a valorizar cada vez mais o momento que você tem com seus familiares, com seus amigos, alguma coisa que está fazendo, até uma pescaria. Isso faz você viver mais o presente. Parece que estou viajando, né? Mas é sério”, conta, após uma pausa de reflexão.

Varejão viu mesmo sua vida mudar repentinamente. Ele fazia sua melhor temporada em nove anos de NBA, liderava estatísticas e estava cotadíssimo para disputar o All-Star Game (partida comemorativa que reúne os melhores da temporada), feito inédito para um brasileiro. Mas uma joelhada ‘boba’ de um adversário adiou o sonho e gerou uma lesão no quadríceps da perna direita. Pelo terceiro ano seguido, ele teve que interromper a temporada mais cedo vítima de uma lesão - no tendão do pé e fratura na mão nas edições anteriores.

O procedimento no quadríceps era relativamente simples e a previsão de volta era de até oito semanas. Mas, na cirurgia, realizada no início de janeiro, formou-se um coágulo na perna esquerda e no pulmão, algo bem raro. Resultado: uma embolia pulmonar que ele descobriu de forma bem dolorida em uma noite em claro.

“Estava me sentindo bem depois da cirurgia, quando comecei a sentir dor nas costas, no pulmão e na costela. Quando respirava estava muito forte a dor, à noite não consegui dormir direito. Não tinha posição na cama”, disse ele que teve o diagnóstico confirmado após uma bateria de exames. “Tive medo às vezes, ficava me perguntando: ‘Será que o remédio está fazendo efeito?’. Foi um momento de medo”.

HOMOSSEXUALIDADE NA NBA

É um momento de alívio para ele e está fazendo com que se sinta bem melhor depois de 12 temporadas. Todo mundo o respeita e isso não atrapalha em nada. No mesmo dia que ele anunciou, vários jogadores enviaram mensagens parabenizando pela atitude, até o presidente da NBA recebeu de maneira boa. Eu penso da mesma maneira

sobre Jason Collins, primeiro atleta em atividade da NBA a admitir ser gay

Longe da família, que mora no Espirito Santo, foi a noiva Marcelle Bueri quem esteve ao seu lado. Mas o jogador teve ainda que lidar com outro problema, a dor da amada. “Ela ficou muito assustada. Quando o médico falou, ela começou a chorar. Eu que tive que acalmá-la. Falei ‘calma, relaxa, não é assim não. Não vai acontecer nada”, conta.

Já com os sentimentos sob controle, a empresária só confirmou porque foi a eleita do craque para o casamento marcado para o dia 7 de setembro, no Rio de Janeiro, com direito a igreja, véu, grinalda, festa e pompa.

Varejão pode se gabar de ter feito a escolha certa. Marcelle foi quem passou madrugadas em claro, conversou com médicos, controlou remédios, o ajudou a trocar de roupa e mimou de todas as formas possíveis o namorado que precisava de repouso e estava proibido de qualquer atividade física.

E foi também com a ajuda da amada, dos amigos e da família, ainda que por telefone, que Varejão criou forças, obrigou o teimoso tempo a passar com muita televisão e jogos de baralho, e aprendeu na marra uma palavrinha mágica: paciência.

"Comecei a pensar 'se eu estou aqui é porque eu tenho que estar aqui, por algum motivo. Talvez tenha sido algo que aconteceu para me fortalecer ou mais um obstáculo na minha vida que vou passar por cima' e passei".

HISTÓRIA NO BARCELONA

Foi inesquecível para mim. Foram muitos títulos, fui campeão europeu, campeão espanhol duas vezes, campeão da Copa do Rei, uma passagem fantástica. Sinto saudades, sempre que posso, volto para visitar os amigos. Quando fui ainda estava lá Rivaldo, fiquei amigo do Ronaldinho, Thiago Motta, Beletti.

Varejão, sobre o clube espanhol que defendeu de 2002 a 2004

Agora, ele já não toma mais remédios (que servem para dissolver o coágulo sanguíneo). Apenas passa por acompanhento médico, além de adotar medidas de precaução como usar meias de compressão em viagens.

O pensamento já está nas quadras para ajudar o Cleveland, apesar da má fase da equipe que há três anos não se classifica para os playoffs da NBA. Com mais dois anos de contrato, defender outras cores não é cogitado.

“É um time novo em fase de renovação. Eu acho que o ano que vem pode ser uma temporada especial depois de três anos sem classificar. É um grupo muito talentoso, porém jovem, mas pode surpreender”.

O atleta veio ao Brasil para ver a família em Vitória e participar de um evento da NBA, no fim de semana em São Paulo. O próximo passo será encarar uma intensa fisioterapia por causa da cirurgia na perna e, em seguida, a pré-temporada quando voltar aos Estados Unidos. Seu único pedido é uma temporada livre de lesões para voltar a encantar a torcida que já é sua fã.

Nesses momentos, curado e retomando a vida de estrela da principal liga de basquete do mundo, ele olha para trás quando começou no Saldanha da Gama, do Espírito Santo.

“Saí de casa muito novo, deixei família, não tinha Natal, fim de semana, deixei as paquerinhas para virar adulto. Enfrentava viagens de Franca para Vitória de 16 horas no ônibus, viajei de van com 14 pessoas apertadas. Pensei em desistir e voltar para casa. Mas quando é difícil, você valoriza mais. Ainda bem que passei por tudo isso”.

 

VAREJÃO DEFENDE SELEÇÃO BRASILEIRA E RECLAMA DE CRÍTICAS

  • AFP PHOTO / TIMOTHY A. CLARY

    Há mais de dez anos presente nas convocações da seleção brasileira, Anderson Varejão enfrentou a crise da equipe nos últimos anos quando o Brasil passou 16 anos sem conseguir a classificação para as Olimpíadas e ficou com o penúltimo lugar no Mundial de 2006. Em melhor fase, ele está confiante na evolução do time que chegou às quartas de final nas últimas Olimpíadas, mas ressalta os problemas enfrentados pela seleção e reclama das críticas.

    “O maior problema da seleção brasileira multa gente não sabe ou não fala. A seleção teve, durante vários anos, jogadores que ficaram fora por problemas familiares, de lesões ou contrato, como no meu mesmo caso. Essas coisas ninguém fala. A seleção brasileira é um grupo que vem jogando há tempos juntos. Quando você tira um ou dois atletas, isso pode atrapalhar e influenciar nos resultados. Muitas vezes ninguém fala nada”.