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Primo de Eder, peso pesado é a 'última' esperança do clã Jofre-Zumbano

Primo do campeão, Raphael Zumbano "vence" Eder Jofre em duelo durante treino - Maurício Dehò/UOL Esporte
Primo do campeão, Raphael Zumbano 'vence' Eder Jofre em duelo durante treino Imagem: Maurício Dehò/UOL Esporte

Maurício Dehò

Em São Paulo

18/11/2010 06h56

O boxe encontra caminho fácil para entrar em lares e uniformizar pais, filhos, irmãos e primos com luvas, calções e sapatilhas. Foi assim com Popó, que aprendeu com o irmão Luiz Claudio a golpear. Maguila, por sua vez, tentou ensinar a nobre arte ao filho. Mas nenhuma família vai superar em importância – e tamanho – a de Eder Jofre. Integrante do clã Jofre-Zumbano, unido pelo casamento dos pais do próprio bicampeão, ele liderou em resultados os parentes pugilistas. Um deles, o peso pesado Raphael, primo de Eder, luta para manter o legado vivo. Mas pode ser o "último dos Zumbanos".

CONHEÇA A FAMÍLIA JOFRE-ZUMBANO

Os avós de Eder:
Salvador Zumbano e Maria Zumbano formaram a mais tradicional família do boxe na cidade de Mococa, onde os primeiros filhos se iniciaram no boxe. A família se mudou para São Paulo.
Os tios:
A primeira geração de Zumbanos, filhos de Salvador, foi uma das mais fortes do boxe nacional.
- Antonio, o peso pesado Zumbanão, foi ídolo por mais de uma década, com uma forte pegada.
- Ralf, apelidado de Bailarino, tinha um estilo  técnico e era o principal ídolo de Eder.
- Waldemar também foi aos ringues, mas não conseguiu ter sucesso.
- Olga também foi para o mundo das lutas. Casou-se com um pugilista austríaco e organizou um espetáculo de luta livre feminina em circos.
- Com menos destaque, Ricardo, Erasmo e Higino também lutaram. Só Walter não seguiu a família.
Os pais de Eder:
Eder nasceu da união de Kid Jofre, um argentino que veio ajudar o irmão Armando numa academia de boxe, e Angelina Zumbano, filha de Salvador e Maria. Kid Jofre foi o maior técnico da história do boxe brasileiro, treinando além de Eder, a seleção e outros grandes nomes do país. Morreu em 1974
Os irmãos:
Além de Eder, Dogalberto também lutou, mas por pouco tempo. Foi importante no corner e como sparring do bicampeão. Se Mauro não lutou, a mais velha Lucrécia teve como curiosidade ser a primeira rival do garotinho Eder, ainda aos quatro anos.
O primo:
Hoje o único integrante do clã Jofre-Zumbano em ação é Raphael, peso pesado de 29 anos. Com 28 vitórias, quatro derrotas e um empate, é campeão interino latino da OMB e persegue título mundial

Para completar 50 anos de seu primeiro título, nesta quinta-feira, Eder contou com uma história digna de filme, retratada com toques de romance pelo jornalista Henrique Matteucci na biografia “O Galo de Ouro”, de 1979 [mais sobre a trajetória dos Zumbano-Jofre abaixo]. Hoje, a realidade é mais dura para Raphael. Sem patrocínio, 29 anos, sem empresário e com um cartel de 28 vitórias, um empate e quatro derrotas.

Como era de se esperar, a carreira do mais jovem Zumbano no boxe começou dentro de casa, no contato com o avô Ralf, tio de Eder, um dos maiores expoentes do clã no meio do século 20. Como técnico, descobriu Maguila e iniciou Raphael.

“Foi só depois que ele morreu que eu resolvi lutar de verdade. Passei a treinar em maio de 2002 e estreei em 2003”, diz Raphael, que logo no início foi para a seleção e para o Pan-Americano de Santo Domingo. O sobrenome era um pequeno incômodo.

“Com certeza me colocaram na seleção pelo nome, eu ainda não tinha provado nada. Fui convocado antes mesmo de estrear na Forja, mas não aceitei, não achava justo. Só com algumas vitórias eu resolvi ir ao Pan”, explica ele, campeão da tradicional Forja de Campeões, mas eliminado na estreia em Santo Domingo.

A carreira como profissional teve início em 2005, mas as dificuldades já eram grandes para os pugilistas profissionais. Raphael teve passagens pela Europa, treinando ao lado do ex-campeão Ruslan Chagaev. Em 2008, lutou na Alemanha, mas perdeu para Gbenga Oloukun, da Nigéria.

Hoje detentor do título interino latino da Organização Mundial de Boxe, cujo campeão mundial é Wladimir Klistchko, tenta ascender no ranking para ter chance com um dos irmãos Klitschko ou David Haye, atuais "reis" dos pesados, categoria que ele mesmo admite estar em declínio. "Está fraco, tanto que só acompanho as lutas quando são de título. Mas desafiaria qualquer um deles", diz o paulistano.

Sem medo de ser Zumbano

Primo de Eder, Raphael conta com as dicas do bicampeão, que sempre que pode assiste às lutas do pesado. "Estamos sempre nos ligando e ele dá os pitacos, que são sempre benvindos", diz o pugilista. Apesar disso, ele evita lembrar o sobrenome famoso quando está vestindo suas luvas.

"Não vejo isso como desafio, eu luto normalmente. Quem está no ringue sou eu, não meu avô, meus tios. É uma responsabilidade só minha", explica Raphael.

Mais jovem representante do clã e único na ativa, ele admite não ter lido a biografia de Eder Jofre. Nem precisava, já que ouviu dos próprios parentes a trajetória da família pugilista.

Pelos Jofre, Aristides "Kid" Jofre trocou as ordenhas na Argentina pelo Brasil, indo atrás do irmão, que fundara uma academia de boxe em São Paulo. Ainda jovem, Arístides abandonou sua cidade quando um amigo morreu em um acidente de charrete. Na grande Buenos Aires, se interessou por uma garota comprometida. O resultado foi um desafio de boxe. Aristides, no entanto, nunca tinha lutado mas após apenas três semanas de treinos venceu o rival. Um talento nato.

A confusão fez com que ele decidisse de vez se mudar para São Paulo, onde o irmão Armando montou uma academia e treinava talentos. Dois deles eram Zumbanos, Higino e Waldemar, vindos de Mococa, no interior paulista. Um dia, levando um par de luvas à casa do velho Salvador Zumbano, pai dos dois, conheceu Angelina, com quem se casou pouco depois. Um dos quatro rebentos foi Eder, que "nasceu" na academia de boxe e fez dela o seu segundo lar.

Entre os seus três irmãos, apenas Mauro não lutou. A primogênita Lucrécia foi oponente no primeiro combate de Eder, quando os dois eram crianças. Já Dogalberto fez poucos combates, mas foi importante como sparring de Eder, ajudando o irmão a superar a morte do pai nos últimos momentos de carreira. O próprio Dogalberto morreu também de câncer e, sem o apoio de seus dois maiores parceiros, Eder encerrou a carreira em 1976.

Com Eder Jofre - que não carregava o mesmo sobrenome - os Zumbano tiveram seu maior sucesso, mas não foram esquecidos. Resta saber se Raphael ou mais herdeiros conseguirão manter vivo o lema de que "sempre haverá um Zumbano sobre o ringue".