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Vitor: A arrancada improvável dos Pelicans pode incendiar o Oeste na NBA

Herb Jones e Willy Hernangomez comemoram o bom momento dos Pelicans - NBA/Twitter
Herb Jones e Willy Hernangomez comemoram o bom momento dos Pelicans Imagem: NBA/Twitter

07/03/2022 04h00

O New Orleans Pelicans deveria estar acabado. Simplesmente deveria. Seu melhor jogador, a superestrela Zion Williamson, ainda não jogou um minuto sequer de basquete nessa temporada, e tampouco esteve com o time ao longo do ano. Eles começaram 2021/22 com uma campanha abismal de 3 vitórias contra 16 derrotas, pior sequência da NBA. E apenas o Portland Trail Blazers enfrentou um calendário mais difícil do que os Pelicans nessa temporada.

E, mesmo assim, aqui estão eles, ainda vivos conforme a NBA entra na sua sequência decisiva. Com menos de 20 jogos faltando para o fim da temporada, os Pelicans estão em plena posse da décima colocação do Oeste (e, portanto, da última vaga do play-in), com dois jogos de vantagem sobre os Blazers e quatro sobre o San Antonio Spurs, e apenas um atrás dos Lakers. Claro, essa não é uma grande campanha nem nada do tipo, mas considerando as circunstâncias e tudo que deu errado ao longo do ano para New Orleans é incrível que ainda estejam sonhando com uma vaga na pós-temporada - e vindo de quatro vitórias seguidas, todas por mais de 15 pontos e contra três times de playoffs, os Pelicans ainda são um dos times mais quentes da NBA no momento.

Parte da recuperação incrível dos Pels, é verdade, tem a ver com as circunstâncias do Oeste: quando Damien Lillard se machucou e ficou claro que ele perderia o resto da temporada - e com a subsequente decisão do Portland Trail Blazers de desfazer a equipe e pensar em 2023 - abriu uma vaga inesperada no que parecia ser um grupo de dez times muito bem definidos que garantiriam as seis posições de playoffs e mais quatro de play-in da conferência Oeste. Sem Portland, a disputa pela vaga ficaria entre os Pelicans e times bem questionáveis de Spurs e Kings, não exatamente a competição mais difícil do mundo. Mas não foi apenas por falta de concorrência que os Pelicans assumiram a liderança na disputa por essa última vaga do play-in, pois desde aquele começo horrendo de 3-16 os Pelicans têm sido legitimamente um bom time de basquete, com campanha de 24-20, uma defesa Top10 da NBA e um ataque acima da média.

Essa virada de chave coincidiu com o momento que os Pelicans pareceram perceber que encontraram algo verdadeiramente especial em Herbert Jones, seu calouro de segunda rodada do Draft, um excelente defensor extremamente versátil que encaixou perfeitamente no buraco deixado por Zion ao entrar no time titular para não sair mais em meados de novembro. A entrada de Jones ajudou a equipe a se equilibrar e encontrar uma identidade nova na ausência do jogador que era para ser a identidade em si (Zion, claro). Com a força defensiva que Jones trouxe e temporadas excelentes de Jonas Valanciunas (18 pontos e 12 rebotes com excelente eficiência) e Brandon Ingram (23 pontos, 6 assistências, 6 rebotes), o time ganhou consistência e foi aos poucos subindo na tabela.

A peça final (*cof cof*) foi a chegada de CJ McCollum na data limite de trocas. A defesa dos Pelicans estava solidificada o suficiente, mas o ataque sempre fora um problema, em parte pela falta de bons arremessadores e criadores no perímetro. Nesse sentido, McCollum era um encaixe ideal para a equipe: 39% de aproveitamento nas bolas longas e o criador dinâmico, ágil com a bola nas mãos que faltava à equipe. Em nove jogos com os Pelicans, McCollum tem médias de 26 pontos, 6 rebotes e 6 assistências por jogo, com 41% nas bolas de três. Com CJ, Ingram e Jones em quadra desde a troca, os Pelicans estão +43 em 194 minutos jogados, e um saldo de pontos de +10,6 por 100 posses de bola que lideraria com folga a NBA. A troca por McCollum levanta algumas questões negativas em termos de idade, salários e pelo preço pago (incluindo uma escolha de Draft) por um jogador com quase 31 anos e histórico de lesões, mas considerando o efeito de curto prazo, ele tem sido positivo - e foi exatamente nesse efeito que os Pelicans estavam pensando.

Porque você pode argumentar que, normalmente, essa arrancada dos Pelicans importaria muito pouco no grande esquema das coisas; na melhor das hipóteses, os Pelicans garantem a décima ou nona posição do Oeste, e precisariam vencer dois jogos consecutivos de play-in (o primeiro contra os Lakers, o segundo contra Wolves ou Clippers) só para chegar nos playoffs e enfrentar de cara o poderosíssimo Phoenix Suns - valioso para um time jovem e de mercado pequeno que busca ascender na NBA, mas dificilmente algo pelo qual valha sacrificar tanto quanto os Pelicans pagaram por McCollum. Mas a verdade é que os Pelicans não estão apenas jogando por 2022; com a estranhíssima situação de Zion Williamson, os Pelicans estão sentindo uma grande pressão para mostrar algo de concreto para sua grande estrela a fim de evitar um afastamento (que, alguns alegam, já existe em boa medida) e que Zion se torne a próxima jovem estrela da NBA a forçar a saída de um time de mercado menor. A vontade de mostrar evolução e resultados em 2022, nesse sentido, pode ser chave para o futuro dos Pelicans.

E esse, afinal, é o elefante na sala dos Pelicans: Zion Williamson. Em quadra, Williamson é um monstro: uma força da natureza, uma mistura surreal de extrema capacidade física e atlética com refinamento e técnica apurados, alguém absolutamente incapaz de se manter longe da cesta. O problema é que, ainda não tendo jogado em 2022, Zion já passou mais tempo da sua carreira profissional longe das quadras do que dentro delas. Sua lesão, que a princípio deveria ser apenas para o começo da temporada, foi se prolongando cada vez mais; a princípio foi um reagravamento, depois parecia que havia um diagnóstico problemático, depois novos problemas adiando sua volta aos treinos, cercado de problemas de comunicação e relatos vagos... e, enquanto tudo isso, Zion se mantinha longe da equipe e circulavam boatos sobre seu distanciamento da equipe e dos companheiros, o mais relevante deles sendo pelo ex-jogador (e ex-companheiro de time de Zion) JJ Redick. Fosse realmente apenas tratamento para sua lesão ou algo a mais, esse é um filme que times de mercado pequeno já viram muitas vezes, e não querem viver de novo.

Agora, no entanto, o cenário parece ter mudado. Os Pelicans estão jogando bem, perto do play-in (e com chances inclusive de desbancar os Lakers para jogar em casa a primeira partida do mini-torneio), e começaram a circular boatos de que uma volta de Zion Williamson às quadras pode acontecer ainda esse ano - como diz a velha máxima da NBA, vencer é o melhor remédio que existe. A última informação é que o astro dos Pelicans foi liberado para começar atividades de quadra, e com pouco mais de um mês de temporada ainda pela frente, isso possivelmente colocaria o camisa 0 em trajetória de voltar bem a tempo dos play-ins. E, caso seja verdade, isso levanta outras questões muito interessantes: como Zion voltaria para essa equipe? Será que sua entrada mexeria com a identidade e ritmo da equipe, ou a adição de um pontuador de extrema eficiência (e excelente passador) como Zion apenas elevaria ainda mais essa equipe? Será que Herb Jones e a nova boa defesa dos Pelicans seria capaz de cobrir defensivamente seu astro, ou sua entrada implodiria o pilar central ao redor do qual a equipe foi construída? São questões difíceis de responder, em parte porque Zion é um jogador diferente de tudo que nós já vimos na NBA. Os Pelicans estão lidando com uma situação ao mesmo tempo única e bastante familiar.

Caso você acredite que Zion pode acrescentar ao time sem atrapalhar o que está funcionando, então a situação parece ficar mais interessante: certamente aumenta as chances dos Pelicans no play-in, para começar. As chances ainda estão contra eles, e mesmo que cheguem aos playoffs o mais provável é uma eliminação direta na primeira rodada, mas isso já seria suficiente por enquanto: para criar uma base para a franquia, para dar o impulso necessário para 2022/23, e talvez para construir algo mais definitivo e sustentável ao redor de Zion, que mantenha a grande estrela do time em casa por mais tempo.

Afinal, boatos e fofocas à parte, times da NBA quando vivem uma crise só tem uma solução universal: vencer. E, para os Pelicans, ir aos playoffs esse ano já seria uma grande vitória que daria ao time respiro para pensar no amanhã.