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OPINIÃO

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Longe dos holofotes, Dallas Mavericks é um forte candidato ao título da NBA

Luka Doncic dribla a bola durante jogo contra o Utah Jazz - Tim Heitman/Getty Images
Luka Doncic dribla a bola durante jogo contra o Utah Jazz Imagem: Tim Heitman/Getty Images

31/03/2022 04h00

A essa altura da temporada da NBA, nós sabemos quem são os candidatos ao título, e passamos muito tempo discutindo possibilidades. Os Suns são o melhor time da liga. Os Celtics, o novo bicho-papão. Warriors e Nuggets são candidatos fortes se saudáveis. Os Bucks são os atuais campeões. Os Grizzlies são o jovem time do momento. Sixers subiram de patamar com a troca de Harden. Os Nets, se conseguirem juntar as três estrelas, tem todo o potencial do mundo. O Heat é a seed #1 mesmo com os titulares perdendo tantos jogos. A essa altura, todo mundo já discutiu à exaustão os contenders.

Mas, por algum motivo, o Dallas Mavericks pareceu escapar a essas conversas em 2022. Talvez por não ter o tipo de talento bruto que você busca em um candidato ao título - tirando Luka, o time não tem uma segunda estrela - ou talvez pela falta de uma narrativa interessante, mas se você acompanhasse a NBA apenas de longe, você poderia passar batido pelos Mavericks como candidato ao título. É um time eficiente, consistente e estável, características que de fato pouco chamam a atenção. Mas é um erro: Dallas é um time perigoso, que ninguém vai querer enfrentar na pós-temporada.

Estatisticamente, Dallas é apontado como um time apenas bom: quarto colocado no Oeste, Dallas é o nono melhor time da liga apenas em Net Rating, logo abaixo do Minnesota Timberwolves. Sua defesa é a sexta melhor da liga, mas o ataque é abaixo da média, 17th geral, e os números são piores considerando os jogos desde a trade deadline. Modelos estatísticos, da mesma forma, não tem Dallas em alta conta: suas chances de título nos três principais modelos estão hoje entre 0,8% e 1,6%, 11th e 13th no total. Então realmente parece fácil desmerecer Dallas como um time bom, mas sem aquela marcha extra para os playoffs.

Mas eu não estou totalmente convencido. Pense no que normalmente associamos aos bons times de playoffs: uma defesa muito forte, um criador capaz de bater marcações 1 vs 1 e forçar ajuda, e um elenco de apoio profundo que oferece versatilidade e permite ao time jogar diferentes estilos. Dallas tem todos esses componentes, e se alinha com o tipo de equipe que costuma ser melhor na pós-temporada que na temporada regular. Na verdade, nesse sentido o Dallas de 2022 lembra bastante a versão do time de 2011, que foi campeã da NBA: uma grande estrela (Nowitzki/Luka) carregando o ataque, uma ótima defesa do outro lado da quadra, e um elenco de coadjuvantes que sabia e executava seu papel.

E isso só é possível de se imaginar porque Luka Doncic talvez seja o jogador mais difícil de se defender em uma série de playoffs na NBA. Na pós-temporada, cada time enfrenta o outro diversas vezes em sequência, e tem mais tempo de preparar planos de jogos específicos para contra-atacar suas forças e explorar suas fraquezas; é uma realidade totalmente diferente da temporada regular, e nela por vezes o que você não consegue fazer é mais importante do que você consegue. Luka é basicamente um Super Trunfo nesse sentido, alguém à prova de qualquer esquema defensivo que Dallas pode enfrentar pela frente, que sozinho é capaz de desmontar qualquer tentativa de ajuste e contra-ajuste que costuma ser tão decisivo nos playoffs. Ele já viu tudo, e sabe passar por tudo; é o único motivo pelo qual Dallas levou os Clippers completos a um Jogo 7 um ano atrás, e só perdeu porque Kawhi Leonard jogou como um homem possuído. Luka não pode ser marcado no 1 vs 1, é um passador genial para explorar dobras, tem resposta para defesas agressivas ou conservadoras, e ataca missmatch como poucos na NBA. Ter uma estrela não só desse calibre, mas com esse estilo de jogo tão completo e dominante, basicamente garante aos Mavericks um piso ofensivo; se a defesa fizer sua parte, Dallas pode causar estrago e ter a vantagem tática.

O que me preocupa mais com Dallas é o ataque ao redor de Luka. Depois de ser #1 e #8 nos últimos dois anos em ataque sob o comando de Luka, Dallas despencou até o #17 esse ano, e os números não são bonitos. Sob o novo técnico Jason Kidd, agressor doméstico, Dallas deixou de lado as lindas jogadas de movimentação sem a bola e sequências complexas que usava sob o antigo regime; nenhum ataque da NBA é mais lento com a bola do que os Mavericks, e a equipe trocou arremessos de três e no garrafão por chutes de meia distância pouco eficientes.

Parte disso, naturalmente, vem do maior foco defensivo e das novas exigências da equipe desse lado da quadra, mas a verdade é que Dallas nunca teve o melhor elenco de apoio no ataque. Seus ótimos resultados desse lado da quadra vinham de uma combinação entre jogadas brilhantemente desenhadas que abriam espaços para jogadores ficarem em ótimas posições e sem marcação, e da capacidade surreal de Doncic de encontrar os companheiros com qualquer passe de qualquer lugar da quadra. Agora Dallas não tem mais o primeiro, o que coloca uma pressão gigantesca em Doncic para fazer a mágica acontecer nas costas do seu talento descomunal, e os resultados até aqui não tem sido bons o suficiente (não por culpa de Doncic, que fique claro).

Uma parte importante do que faz de Luka não só muito bom, mas à prova de esquema tático e perfeito para os playoffs, é sua capacidade como pontuador E criador. É a equação mais simples do basquete: defenda Luka no 1 contra 1, e ele consegue pontuar por conta própria. Se a defesa compromete um segundo jogador na ajuda para impedir que isso aconteça - e Luka é o jogador que mais recebe marcações duplas em toda a NBA por uma boa margem - outro jogador dos Mavericks fica livre, e Luka acha ele com o passe. Por causa da sua altura, habilidade no passe, visão de jogo e inteligência tática, Luka consegue fazer esse passe para qualquer jogador, contra qualquer tipo de defesa e rotação.

O problema é que, no momento que a bola sai das suas mãos, Luka para de ter controle sobre a jogada. A vantagem está criada, mas ainda depende que quem receber a bola seja capaz de acertar o arremesso, finalizar a jogada, ou aproveitar o espaço para atacar uma defesa bagunçada. E Dallas é um time com muitos poucos jogadores capazes de fazer isso em alto nível: apenas Finney-Smith arremessa acima de 38% de três, e a grande queda de Tim Hardaway esse ano deixou Jalen Brunson como única segunda opção com a bola além de Luka para criar arremessos. Isso limita de forma significativa o quanto esses passes e a atenção comandada por Luka são aproveitados - fator crítico no decepcionante ataque de Dallas.

O fator chave para Dallas, nesse sentido, é Spencer Dinwiddie. O armador chegou dos Wizards com David Bertans em troca de Kristaps Porzingis, e a princípio a troca foi vista mais como uma forma de se livrar do letão do que outra coisa, uma vez que tanto Bertans como Dinwiddie (este voltando de uma lesão grave no joelho) estavam em péssima fase. Mas, em Dallas, Dinwiddie parece ter recuperado a forma que fez dele um jogador tão importante no Brooklyn Nets: são 17 pontos e 4 assistências, arremessando 50% de dois e 39% de três.

Essa recuperação de Dinwiddie e seu ressurgimento como legítimo bom jogador muda por completo a situação dos Mavericks- não apenas pela adição de talento, mas porque Dinwiddie oferece justamente essa mistura de bom arremesso e capacidade de criação que Dallas tanto sente falta para explorar os espaços criados por Luka. No passado, Dallas também sofreu com a falta de outros criadores em playoffs ao lado de Doncic, relutante em usar Jalen Brunson pelo seu tamanho ser explorado na defesa. Dinwiddie, com 1m98, não tem esse problema; ele pode jogar ao lado de Luka nesses minutos, e Dallas até mesmo tem destruído adversários em formações com Luka-Brunson-Dinwiddie em quadra - formações que maximizam o espaçamento e capacidade de criação que melhor fazem uso dos talentos singulares de Luka. Dinwiddie também tem sido excelente comandando o time sem Luka, o que impede as quedas da equipe com seu astro no banco. Dallas, nesse sentido, agora tem condições muito maiores de maximizar os elementos que dão ao time uma chance real de título.

Então sim, eu entendo por que os modelos estatísticos não tem as chances dos Mavericks em alta conta. Mas a gente também sabe que os playoffs funcionam com uma lógica diferente da temporada regular; e, considerando as variáveis, eu acho que Dallas tem em si os ingredientes para fazer uma arrancada em junho. Isso é diferente de achar que farão de fato, mas o Dallas Mavericks é um time que eu odiaria encontrar pela frente na pós-temporada.