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NBA: Como Warriors desmontaram a defesa de Dallas para abrir 3-0 na série

Andrew Wiggins, do Golden State Warriors, deu uma enterrada desmoralizante em Luka Doncic, do Dallas Mavericks  - Jerome Miron/USA TODAY Sports
Andrew Wiggins, do Golden State Warriors, deu uma enterrada desmoralizante em Luka Doncic, do Dallas Mavericks Imagem: Jerome Miron/USA TODAY Sports

24/05/2022 04h00

De certa forma, o sentimento nas finais de conferência do Oeste é de anticlímax. Depois de uma série épica de 7 jogos contra o favoritíssimo Phoenix Suns, o Dallas Mavericks chegou embalado para enfrentar os Warriors, sonhando com as Finais... e agora Golden State acabou de abrir uma vantagem de 3-0 na série, uma da qual nenhum time na história da NBA jamais retornou. Um dia, algum time vai virar uma série que perdia de 3-0, mas tudo indica que não vai ser agora. A história nos indica que os Warriors já estão nas Finais, uma decepção para quem esperava uma série mais equilibrada depois do que os Mavericks fizeram com Phoenix no Jogo 7.

Parte disso, claro, é pura imprevisibilidade dos esportes. Dallas chutou 45 bolas de três pontos no Jogo 3, e acertou 28% delas; entre isso e seu colapso no Jogo 2 depois de liderar por 14, existe um mundo onde os Mavs estão ganhando a série de 2-1 e nós não estamos tendo essa conversa. Mas no basquete as margens de erro são minúsculas; Dallas errou mais do que podia, Golden State aproveitou, e aqui estamos. Mas uma parte significativa da dominação dos Warriors em contraste com a eliminação dos Suns vem de um elemento que Phoenix era singularmente incapaz de acionar, e que Golden State tem tirado o máximo de proveito contra um Dallas totalmente despreparado: a capacidade de colocar pressão no aro.

Durante a temporada regular, o Phoenix Suns foi o segundo time que MENOS pontuou perto da cesta (ironicamente, o que menos pontuou foi justamente o Dallas Mavericks). Sua força ofensiva - quinto melhor ataque da NBA - veio da sua capacidade nos arremessos, especialmente nos de meia distância, mas não era um time dominante em atacar o aro para gerar pontos fáceis ou lances livres. E, contra um time de Dallas que se encontrou jogando com formações mais baixas sem um protetor de aro tradicional, essa deficiência ficou exposta. A defesa de Dallas, em especial nos dois últimos jogos, massacrou os Suns acertando todas as leituras e rotações, executando com perfeição as trocas, e parte disso era pela total confiança de que os Suns iriam buscar o arremesso e não atacar a cesta (ajuda que DeAndre Ayton, o cara que deveria ter feito esse papel no garrafão, tem alergia a contato físico). Golden State oferecia um desafio diferente nesse sentido, um dos fatores críticos que eu inclusive tinha destacado na prévia da série.

E, até aqui, essa diferença entre Suns e Warriors tem ficado evidente de forma brutal. Apesar de ser conhecido como o time das bolas de três, os Warriors de Steve Kerr sempre foram excelentes atacando a cesta e pontuando no garrafão, se aproveitando do espaçamento que os chutes de fora geram (e vice versa). Nessa temporada em especial, Golden State foi apenas médio no quesito (em parte por causa das lesões), mas voltou a aumentar a intensidade na pós-temporada. A primeira vítima disso foi Memphis, ironicamente um dos melhores times da NBA em pontos perto do aro, mas que não foi capaz de acompanhar os Warriors no quesito. E agora é a vez de Dallas, que simplesmente não consegue acompanhar as movimentações e trocas de passe dos Warriors sem ceder espaços. Curry em particular está destruindo todos os defensores dos Mavs a partir do drible, forçando ajudas e iniciando as rotações de bolas tão mortais pelas quais os Warriors ficaram conhecidos.

Esse é o momento onde acaba se criando um cobertor curto para Dallas. Quando Curry, Wiggins ou outro bate seu marcador e ataca a cesta, eles tem caminho livre para a cesta; para impedir isso, Dallas precisaria manter um pivô como Dwight Powell em quadra para proteger o aro, mas manter Powell compromete o espaçamento do time e cria um alvo fácil para ações no perímetro. Mas sem Powell e com Kleber, formação que Dallas mais usa atualmente e que maximiza seu espaçamento ofensivo, a falta de um protetor de aro tradicional força rotações maiores e mais agressivas dos Warriors para impedir as cestas fáceis perto do aro, o que abre todo o resto da quadra para os Warriors (de novo, veja o vídeo acima e como Curry atraindo quatro defensores na infiltração abre Wiggins para a enterrada). Se até agora nenhum time nos playoffs tinha mostrado resposta na defesa para a formação com cinco jogadores espaçados dos Mavericks, os Warriors mostraram como castigar do outro lado da quadra.

O maior símbolo dessa dominação no garrafão talvez seja Kevon Looney. Nos primeiros 10 jogos de Golden State nos playoffs - cinco contra Denver e os cinco primeiros contra Memphis - Looney teve média de 14 minutos por jogo, com 4 pontos e 5 rebotes por jogo. Desde então são 31 minutos por jogo, com 11 pontos e 13 rebotes por partida, incluindo 5,5 ofensivos (!!). Os Mavericks simplesmente não tem resposta para ele na série, seja cortando para a cesta em meio a ações orquestradas no perímetro, ou simplesmente vindo do pick-and-roll.

Looney, aliás, tem média de 4 assistências por jogo nessas partidas, e é fácil ver como essa gravidade dele cortando para o aro tem aberto espaços ao redor da quadra.

Golden State também tem 29 rebotes ofensivos na série contra 20 de Dallas, o que é sintomático de duas coisas. A primeira, naturalmente, é o quanto os Warriors estão colocando pressão no aro e dominando o garrafão nessa série, mas a segunda é simplesmente o quão bagunçada a defesa de Dallas está quando algum arremesso é dado, depois de tantas rotações, improvisos e mudanças de padrão em cada posse de bola. Isso cria matchups esquisitos e deixa todos os reboteiros dos Mavericks fora de posição, abrindo espaços para os rebotes ofensivos dos Warriors que estão fazendo a diferença.

Rebotes ofensivos, pontos atacando a cesta e um pivô dominante. Essa pode não ser a fórmula que estamos acostumados a ver nos sucessos do Golden State Warriors, mas no fundo esse é exatamente o que é tão assustador: Golden State está descobrindo ainda mais novas formas de se vencer jogos, e expandindo seu repertório. E, mais importante, sem perder de vista o que fez do time tão especial em primeiro lugar. A meu ver, a sequência mais importante da partida veio no fim do segundo quarto, quando Dallas liderava por 9 pontos faltando 4 minutos para o intervalo. Golden State tinha apenas 33 pontos, e parecia que precisaria de outra grande virada no segundo tempo. Só que então Curry e Klay Thompson acertaram três bolas de três pontos em um espaço de dois minutos, a movimentação sem bola de Steph gerou mais duas bandejas fáceis para Draymond e Wiggins, e de repente o que era uma desvantagem de 9 pontos virou uma vantagem no intervalo que Golden State não entregaria mais. A segunda bola de Steph em particular foi um microcosmo do que faz dele e dos Warriors tão especiais - com direito a virar para encarar o banco com a bola ainda no ar.

E, como consequência, os Warriors estão a uma vitória de voltarem às Finais da NBA.