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NBA aposenta número de Bill Russell na maior homenagem já feita a um atleta
Após muita especulação e inúmeros pedidos de ex-jogadores ao redor dos Estados Unidos, a NBA finalmente confirmou nessa quinta feira (11) que vai aposentar oficialmente o número #6, usado pelo lendário pivô Bill Russell, em todos os times da liga. O número, é claro, já é aposentado pelo Boston Celtics, onde Russell jogou toda sua carreira e conquistou 11 títulos, mas agora a restrição passa a valer para toda a NBA: nenhum jogador mais na liga poderá escolher a camisa #6.
Essa decisão é a mais recente em uma série de homenagens que a NBA tem anunciado nos últimos dias para honrar o legado do ex-pivô, que faleceu no começo do mês. Todos os times também jogarão a temporada 2022-23 com um símbolo especial no uniforme em referência a Russell, e as quadras das equipes terão igualmente marcas de luto. Os Celtics devem fazer algo especial nesse sentido, mas ainda não foi anunciado o quê. Mas se a aposentadoria da sua camisa não foi a primeira nem será a última homenagem da NBA a Russell, ela talvez seja a mais simbólica e significativa: em seus 76 anos de história, essa é a primeira vez que a NBA enquanto liga aposenta a camisa de um jogador.
Se você não está acostumado com esportes americanos e não sabe do que estamos falando, é comum nos Estados Unidos - e na NBA - que times "aposentem" alguns números em homenagem a jogadores que fizeram história com sua camisa; desse modo, a camisa é eternizada como pertencente a um jogador específico, e não pode mais ser usada por nenhum outro jogador daquele time. Cada time tem seus próprios critérios para quais camisas aposentar e eles variam bastante (os Celtics, por exemplo, tem 23 camisas aposentadas, enquanto o LA Clippers e o Toronto Raptors não possuem nenhuma), mas em quaisquer circunstâncias ter uma camisa aposentada é algo de enorme significância: é uma prova da relação especial que o time tem com a franquia, uma importância e simbolismo que é homenageada e preservada para a eternidade, um reconhecimento da relevância e significado que aquele jogador carregou.
Nesse sentido, fica claro o tamanho da honra que é a NBA decidir aposentar a camisa de Bill Russell não para um único time, mas para a liga como um todo. E ela está absolutamente correta em fazer isso: muito maior do que o que Russell fez pelo Boston Celtics (onde conquistou 11 títulos de NBA) foi o que o pivô fez pela NBA, pelo esporte como um todo, e principalmente pela sociedade norte-americana em geral. Bill Russell foi, indiscutivelmente, o jogador mais importante da história da NBA: ele abriu as portas de vez para a entrada de jogadores negros na NBA não apenas como coadjuvantes ou complementos, mas como as grande estrelas do esporte; a revolução que ele trouxe ao jogo dentro das quadras mudou para sempre a forma de se jogar e pensar basquete, e levou a NBA em uma direção que não apenas a salvou da falência como a transformou em uma potência do entretenimento; e, mais importante, sua luta por igualdade e pelo fim da segregação racial nos EUA deu à liga uma identidade única e causou impactos que foram muito além das quadras. Russell não foi apenas importante para a NBA, ele foi uma das personalidades mais importantes dos Estados Unidos em um momento crítico da sua história recente, e a luta de Bill Russell impactou milhões de pessoas no resto do país e até no mundo em busca de vidas melhores. Muito mais do que o jogador, é o Russell ativista, revolucionário e transformador, que merece receber essa honra única de ter sua camisa aposentada pela NBA.
E existe um precedente. Em 1997, a MLB anunciou que a camisa #42 seria aposentada de todos os times do beisebol como homenagem a Jackie Robinson, o jogador que em 1947 foi o primeiro atleta negro a jogar profissionalmente no século 20 em uma liga principal - quebrando a barreira racial nos esportes americanos e abrindo portas que na época pareciam impossíveis. Como o primeiro, Robinson sofreu extremo racismo dos seus companheiros, adversários, torcedores e basicamente de todo o mundo do beisebol e fora dele, circunstâncias que podem ter contribuído com sua morte precoce em 1972; mas seu carisma, talento, personalidade e resiliência transformaram para sempre o esporte e o mundo, pavimentando o caminho para Russell e todos que vieram depois. A aposentadoria da sua camisa em toda a liga foi a primeira vez que isso aconteceu na história dos esportes americanos - mais adequado, impossível.
E Russell ser o próximo a receber a mesma honra é também de uma poesia histórica incrível. Em 1947, Robinson quebrou a barreira racial, mas tinha poucas condições de dar os próximos passos no caminho pela dessegregação; acima de tudo, o desafio de Robinson era sobreviver na MLB para mostrar que ele e seus semelhantes pertenciam. Foi Russell quem pegou o bastão de Robinson e levou sua luta a um novo nível, transcendendo os esportes de forma inédita e se tornando uma voz ativa fora das quadras. Adequado, portanto, que receba a mesma homenagem da NBA pelo seu papel - ainda que, como no caso de Robinson, seja válido questionar por que essa honra não poderia ter acontecido enquanto ambos ainda eram vivos.
Mas, apesar da camisa #6 ser aposentada para sempre na NBA a partir de agora e nenhum jogador mais possa escolher usá-la, isso não significa que os jogadores que já usam o número precisarão trocá-lo. Hoje, existem (se eu sei contar) catorze jogadores que já usam a camisa #6: LeBron James (Lakers), Kenny Lofton Jr (Grizzlies), David Duke Jr (Nets), Jalen McDaniels (Hornets), Alex Caruso (Bulls), Hamidou Diallo (Pistons), Kenyon Martin Jr (Rockets), Luca Vildoza (Bucks), Jordan McLaughin (Wolves), Quentin Grimes (Knicks), Jaylin Williams (Thunder), Keon Johnson (Blazers), Nickeil Alexander-Walker (Jazz) e Kristaps Porzingis (Wizards). Esses jogadores terão permissão para continuarem usando a camisa #6 normalmente, mas nenhum jogador novo pode pedir a camisa. Isso também emula o que a MLB fez com Robinson, o que levou a um momento icônico: a aposentadoria definitiva do #42 quando seu último usuário, o também lendário Mariano Rivera, finalmente se aposentou.
Será que teremos um momento assim com Russell e LeBron, por exemplo, caso o ala dure tempo suficiente? Não sei dizer. Mas a honra é merecida, e se vem um pouco tarde, pelo menos ela eterniza um simples fato, mas que às vezes pode passar desapercebido pelas gerações, esquecido ao longo do tempo: a NBA não seria sombra do que é hoje se não fosse por William Felton Russell, e tampouco a sociedade norte-americana.
Ao maior de todos, coube, merecidamente, a maior das homenagens.
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