Topo

Alicia Klein

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Presença LGBTQIA+ no esporte e fora dele: quem pediu tua opinião, meu bem?

Torcida do Vasco se manifesta contra a homofobia antes de jogo contra Operário - Thiago Ribeiro/AGIF
Torcida do Vasco se manifesta contra a homofobia antes de jogo contra Operário Imagem: Thiago Ribeiro/AGIF

28/06/2022 14h41

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Hoje é o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+. Dia que muitas pessoas usam para celebrar quem são. E que todas e todos deveríamos usar para refletir.

Refletir por que esses dias ainda são necessários. Para as mulheres, as pessoas negras, LGBT. Por que não podemos simplesmente existir, sem precisar falar de orgulho, de respeito e, socorro, de segurança.

A declaração do multicampeão Richarlyson na semana passada, contando de sua bissexualidade, trouxe à tona um assunto há tanto tempo conhecido quanto evitado no futebol. Homens só podem ser héteros. Ao menos publicamente, sob o risco de, no mínimo, não ter uma carreira.

No mundo real, a pessoa não hétero pode não só perder a carreira, o apoio da família, da sociedade, mas também a vida. O Brasil é um dos países que mais mata pessoas trans, mulheres e negros. A cada 27 horas, uma pessoa LGBT é assassinada por aqui.

A dura verdade é que o Brasil odeia quem não é homem e branco e hétero. Claro, nem todo brasileiro é LGBTfóbico, racista e misógino. Mas quase todos aceitam caladamente viver em uma sociedade que o é estruturalmente, sem falar muito a respeito.

Até que as pessoas morrem, apanham, são estupradas e depois perseguidas mais do que seus estupradores, aí a gente acorda. Poxa, não pode. Nossos direitos estão ameaçados, nos respeitem, nos deixem em paz. E depois tudo volta ao que sempre foi.

Na sexta, o Vasco e sua linda torcida fizeram uma ação emocionante em homenagem ao orgulho LGBTQIA+. Coletiva. Pública. Comprometida. No domingo, botafoguenses usaram xingamentos homofóbicos contra jogadores do Fluminense. É isso.

E falar, esbravejar, lutar todo dia cansa. Abre a porta para o esgoto. Expõe-nos a um lamaçal deveras deprimente. Eu mesma digo menos do que deveria. Comento amenidades porque vivo esgotada.

Mas não iludida.

Pode ser tentador sucumbir à ilusão da evolução. As coisas estão melhorando, antigamente era bem pior, ao menos agora podemos falar sobre isso. Sim, tudo verdade. Tudo muito pouco também.

Não é que ainda não atingimos a equidade. É que as pessoas estão sendo tolhidas, ameaçadas, vivendo escondidas ou mesmo morrendo. Morrendo. Pelo simples e cretino fato de não serem hétero. Ou de não atenderem às expectativas heteronormativas inventadas por sei lá quem.

No futebol masculino de elite, não há sequer um jogador em atividade declaradamente gay. Nenhum único. Nunca houve. Nos outros esportes de alto rendimento também são raríssimos. Por motivos que não se originam no respeito, mas em uma visão deturpada da homossexualidade feminina, atletas lésbicas encontram mais espaço para existir publicamente. O que certamente não significa uma vida de paz no mundo exterior.

Como mulher cis e hétero, confesso que só consigo pensar: por que te importa de quem a pessoa gosta? Que diferença faz na tua vida o gênero de alguém? Quem te ungiu sommelier de amor? O que te faz acreditar que a sua opinião é necessária?

Quem deu ao ignorante o direito de se manifestar, com palavras ou violências piores? Quem disse que cabe a você aceitar ou não alguém? Quem te colocou nesse pedestal, meu bem? A você, a mim e a todas e todos que vivemos em sociedade cabe apenas respeitar, conviver pacificamente e, se possível, amorosamente. É o mínimo dos mínimos, sério.

Às pessoas LGBTQIA+ deixo meu beijo, meu abraço apertado e meu imenso desejo de que vocês possam amar e existir em paz, com alegria e segurança.

Desculpem não conseguir ser mais positiva neste dia, amigas, amigos e amigues. O Brasil não facilita.