Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Força motriz do futebol, jogadores ganham bem menos do que você pensa
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A ilusão de que todo jogador de futebol é milionário carrega um enorme perigo: achar que eles devem se submeter a praticamente qualquer situação de trabalho por ganhar mais dinheiro que a vasta maioria dos trabalhadores.
Pode jogar três vezes na semana. Pode passar duas semanas longe de casa. Pode atuar lesionado. Pode ser xingado. Pode tomar pedrada. Pode levar estilhaço de bomba. Pode tomar sacode de torcida. Pode ser ameaçado fisicamente. Pode ter sua família ameaçada. Pode, inclusive, não receber salário.
Nada disso faria sentido ainda que a premissa fosse verdadeira. Todo trabalhador, independentemente do seu soldo, tem direitos. Todo ser humano tem direitos. E compromissos.
Imagina se a estrela do seu time se recusasse a entrar em campo em um confronto decisivo por não ter recebido o salário do mês? Parecia-lhe aceitável?
O que torna tudo isso ainda mais perverso é o fato de que a premissa é falsa. São muito poucos os habitantes da estratosfera econômica do futebol.
Um levantamento sobre a faixa salarial global de jogadores profissionais, exibido hoje pelo Redação SporTV, mostra que o buraco é bem embaixo:
45,3% recebem até 1.000 dólares por mês
29,1% recebem entre 1.001 e 4.000
11,5% recebem entre 4.001 e 8.000
12,2% recebem entre 8.001 e 60.000
2% recebem mais do que 60.000
Ou seja, praticamente a metade dos atletas mal ganha para dar conta dos boletos. Ou pior, talvez ganhe, mas não receba. Embora varie por continente, a chance de ter o salário atrasado existe em todo o planeta:
40% nas Américas
35% na Europa
55% na África
26% na Ásia
Não faltam evidências de que o futebol gosta de operar em uma realidade paralela, onde racismo, misoginia, homofobia, violências físicas e uma série de outros absurdos não recebem o tratamento que deveriam (crime, no caso). Onde clubes profundamente endividados fazem contratações milionárias. Onde dirigentes corruptos ganham o status de "folclóricos". Onde um presidente pode dizer com naturalidade, sobre os salários atrasados de seus jogadores: "Vai acontecer de novo". Vocês que lutem.
No caso específico do Brasil, os jogadores começam a dar sinais de cansaço. Aliás, quem não está cansado no Brasil de 2022 não entendeu nada.
Na rodada do final de semana do Brasileirão, as partidas ficaram marcadas pelos protestos de jogadores, que não tocaram na bola no apito inicial e levaram a mão à boca mostrando que suas vozes não vêm sendo ouvidas, em alusão a alterações na Lei Pelé.
Em uma sociedade profundamente racista e escravocrata, não se pode deixar de notar também que a vasta maioria destes atletas, em sua maioria explorados e tratados como mercadoria, são negros. Enquanto a vasta maioria, para não dizer todos, os "donos" e tomadores de decisão são brancos.
Todo movimento de revolta daqueles que estão na base da pirâmide me faz pensar que uma hora esse jogo vai virar. Porque uma maioria oprimida ainda é uma maioria, com enorme poder sobre as engrenagens da sociedade. Afinal, elas são a engrenagem.
Sem jogadores não há futebol. Não importa se eles ganham 100 contos ou um milhão. Todos merecem aquilo que lhes foi prometido (inclusive o salário em dia), além de segurança para trabalhar e plataforma para se fazerem ouvir.
Será que um dia eles vão se dar conta e tomar o controle, que sempre deveria ter sido seu?
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