Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
O sapo fervendo na panela: o futebol é reflexo da sociedade
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No sábado, Goiás x Corinthians foi suspenso pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva, por um imbróglio envolvendo a presença da torcida alvinegra no estádio da Serrinha. O despacho dizia zelar "pela ordem desportiva e pelo equilíbrio das competições", concluindo que "a única medida proporcional e adequada para tanto, diante da moldura que se revela, é a determinação da suspensão da realização da partida". Nem torcida, nem jogo.
Não houve esse problema na partida entre Avaí e Fluminense, que venceu o time da casa por 3 a 0 em uma Ressacada vazia. O clube catarinense foi punido por causa do corte de cabos do VAR no embate contra o Atlético-GO, em 1º de outubro. Com jogo, mas sem torcida.
Já no domingo, cenas de terror tomaram conta da Ilha do Retiro, depois do gol de empate do Vasco contra o Sport. Passaram-se cinco minutos até que o cruz-maltino conseguisse cobrar a penalidade e, na comemoração, uma confusão terrível eclodiu nas arquibancadas e se estendeu para o gramado.
Segundo o relato de Raphael Claus na súmula, "muitos objetos foram atirados ao campo de jogo em direção aos jogadores, entre eles pedras, chinelos, tênis, isqueiros e copos com líquido. Nesse momento, a torcida do Sport estourou o portão atrás do gol onde defendia a equipe do Sport e começa uma invasão de muitos torcedores, não somente pelo portão, mas também por outros pontos da arquibancada".
Bombeiros civis, a postos no local para socorrer cidadãos, foram agredidos covardemente. Uma delas apanhou já deitada no chão, e depois se levantou para ajudar as outras vítimas da desgraça. Tudo isso enquanto o Vasco se recolhia aos vestiários e a arbitragem demorava uma eternidade para chegar à conclusão óbvia: não havia como garantir segurança e o jogo precisava ser encerrado antes do fim.
O mesmo aconteceu na Arena Castelão, quando torcedores do Ceará invadiram o campo atrás dos próprios jogadores, depois do gol de empate contra o Cuiabá. É muito difícil ver as imagens e considerar a possibilidade de levar uma criança a qualquer estádio no Brasil. Chorei vendo um bombeiro carregando um garotinho desmaiado. Chorei imaginando o desespero dos pais. Chorei pensando que não tem jeito. Não tem o que fazer.
Passamos por uma Copa do Mundo. Erigimos arenas de padrão internacional. Falamos em Termos de Ajuste de Conduta. Queremos conversar. Achamos que evoluímos, mas o tempo passa e as mesmas cenas vão se repetindo.
Continuamos chamando de malandragem o que nada mais é que quebra de regras. Passando pano para preconceitos que se embrenham entre nós à guisa de piada. Fingindo que as pequenas e grandes violências fazem parte do pacote futebol. Do pacote Brasil.
Dentro e fora de campo, estamos ficando anestesiados. Aceitando que a barbárie é nossa vizinha. Pior, deixando de defini-la como tal. Votando nela. E, como o primeiro passo para solucionar um problema é reconhecer que ele existe, receio que estejamos no caminho errado. Ou simplesmente estacionados, inertes, operando no modo sobrevivência enquanto os bárbaros tomam o controle.
Somos o sapo lentamente morrendo cozido na água fervente, sem nem se dar conta que precisa sair da panela.
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