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Machismo escancarado do técnico do Vasco é um lembrete para nós

Ramón Díaz falou ontem o que sabemos que muitos homens pensam: ele verbalizou a ideia absurda de que uma mulher é menos capacitada para habitar o meio do futebol. Este lugar aparentemente tão complexo, de regras tão labirínticas, profundas e herméticas, que só um homem seria capaz de interpretar.

Ah, vá para o patriarcado que o pariu, sinceramente.

Na coletiva depois da derrota para o Red Bull Bragantino, o argentino disse: "Com relação aos árbitros, não podemos falar muito. Tem o VAR. Na última partida, em casa, uma senhora, uma mulher, interpretou um pênalti de outra maneira. O futebol é diferente. Principalmente de que o VAR seja decidido por uma mulher. Acho que é complicado, porque o futebol é tão dinâmico, tanta pressão, tão rápido, com decisões tão rápidas. Hoje não sei se o árbitro num pênalti em nosso ponta. Que bate e leva, não sei também se foi pênalti."

Meia hora depois, na saída, ele tentou escapar com a famosa desculpa para quem possa ter se ofendido: "Se interpretou algo mal da minha declaração. Quero pedir desculpas. Me pareceu que o que eu quis dizer é que uma só pessoa não pode tomar uma decisão tão importante como é a participação do VAR no futebol. Se se interpretou mal, peço desculpa, mas não é minha intenção".

É difícil apontar o que há de pior nessa fala machista, mas um dos pontos de destaque é o fato de que, no caso específico que ele escolheu citar, da partida contra o Grêmio, a mulher estava certa. A "senhora do VAR" tinha razão. E o homem do apito, não. Aliás, a rodada de estreia do Brasileirão foi um show de horror da arbitragem como um todo. Mas quem Ramón resolveu crucificar?

Ou seja, até quando erra o homem está certo e a mulher, mesmo certa, não deveria estar ali.

Comentários como estes são nocivos em diversas camadas. Não só pelo fato de perpetuarem a ideia da superioridade masculina e não só por evidenciarem o quanto ainda é socialmente aceitável trazer essas noções a público.

Eles também carregam um efeito inescapável: tornar o ambiente hostil às mulheres. Fomentam a dúvida. Fazem-nas se questionar permanentemente. Até as mais capazes, até quando obviamente têm razão. Pisando em ovos, sempre olhando para o lado com a sensação de que os homens estão esperando um erro seu para confirmar a premissa. Trabalhando de maneira incansável, preparando-se mais do que os homens, sem receber o devido reconhecimento. Sabendo que muitos dos que estão ali do seu lado não as respeitam — e não respeitarão nunca. Segue o jogo, tá valendo tudo isso aí.

O meio do futebol não nos permite esquecer o tanto que nos detesta. Todo dia é um "lava a louça" pra lá, um "cala a boca, vagabunda" pra cá. Momentos como os de ontem, porém, chegam como um tapa na cara. Um sacode para lembrar o tanto que ainda temos por caminhar se o treinador de um dos clubes mais tradicionais do país se sente confortável para falar esse tipo de coisa, diante de inúmeras câmeras e microfones. E, claro, receber apoio nas redes de uma galera que concorda com ele.

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Fico aqui na vã esperança de que este tapa na cara e este sacode cheguem aos machistas também. Com uma mensagem nada velada de que este tipo de coisa não passa mais. Suspensões e multas bem robustas, para ver se tomam tento e vergonha na cara. Já que não aprenderam nada com a vida.

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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