Depoimento de Textor em CPI é o puro suco de Brasil
A passagem de John Textor pela CPI que investiga a manipulação de resultados no futebol foi o mais puro suco de Brasil.
Teve senador mostrando a falha de Andreas Pereira, depois do "tijolo" que chegou do lateral mal batido por David Luiz e que resultou no gol de Deyverson, na final da Libertadores de 2021. Teve senador cornetando os zagueiros do Botafogo e pedindo reforços a Textor. Teve o americano dizendo ao senador Romário que uma de suas perguntas era a mais idiota que ele já ouviu. Teve análise de lance de VAR. Teve Jorge Kajuru no comando. Ele, que tem tatuados pelo corpo os rostos de Adriane Galisteu, Cláudia Leite, José Luiz Datena e Alvaro Dias.
Só não teve prova. Ao menos não publicamente. Em reunião secreta, Textor apresentou documentos e, segundo os parlamentares, "indícios" suficientes para justificar investigações mais aprofundadas.
Aí vem a minha dúvida: se, para além de convicção, há evidências, por que não mostrá-las de cara? Se há uma "smoking gun", por que bradar corrupção em praça pública e só compartilhar os elementos que a comprovariam em uma sala fechada? Por que acusar jogadores do São Paulo de entregar uma goleada ao rival sem apontar nomes, colocando em xeque a credibilidade de todo um elenco? Por que levar um lance ajustado para o debate aberto, expondo os árbitros da partida em questão, e deixar os absurdos para o petit comité?
O empresário parece estar se utilizando de uma tática bastante familiar para quem acompanha dramas de tribunal gringos. A tal "reasonable doubt", a dúvida razoável. Não é preciso provar culpa ou inocência, apenas plantar uma pulga atrás da orelha e deixar o circo pegar fogo — quem sabe, até que alguma prova caia do céu. Esperto, ele se beneficia do fato de que essa pulga, a da corrupção, não carece de muita explicação ou convencimento. Aqui é Brasil. Corrupção é dia a dia.
Ademais, todo torcedor e torcedora (inclusive os sentados no Congresso) têm certeza de que seu time foi roubado em algum momento da vida.
Só falta provar. E provar erros não basta. A gente sabe que a arbitragem é ruim. E jogadores de futebol, mesmo os melhores, cometem erros bisonhos. Está aí o segundo turno do Botafogo no Brasileirão 2023 que não nos deixa mentir.
Desnecessário dizer que é preciso investigar o futebol, especialmente com a invasão das casas de aposta e a fragilidade de um sistema ainda não regulamentado. O risco é transformar um assunto sério em meme, em rixa de bilionário, em motivo de piada. E a gente ficar aqui passando vergonha bilíngue em vez de avançar na profissionalização do esporte mais importante e mais rico do país.
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