Alicia Klein

Alicia Klein

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
OpiniãoEsporte

A perversidade de cobrar Leila pelos erros de Abel

Hoje, o Palmeiras completa 110 anos de existência. Mas o que todos estão esperando é um pronunciamento de Leila Pereira sobre a fala machista de Abel Ferreira.

Como ela ousa organizar uma coletiva só para mulheres e não dizer nada agora? Logo ela, a única mulher presidente de clube grande no Brasil. Justo a primeira (e única) a se manifestar sobre os estupradores condenados, que seus colegas adoram ignorar. Como pode?

Ah, como é fácil achar uma mulher para culpar pelos erros dos homens, não é mesmo?

"Bom, mas você viu o que ela estava vestindo?"

"Sua mãe não te deu modos?"

"Ela bem que deu motivos para ele ter ciúmes."

Quanto mais a gente sofre ou quanto mais se coloca na linha de frente da luta, mais somos cobradas. Mais se torna nossa responsabilidade fazer algo a respeito.

Ora, ora, não seria muito mais fácil — e útil e justo e lógico — cobrar quem nos faz precisar lutar? As pessoas sem as quais nós teríamos paz? Note: se os homens pararem de nos xingar, bater, violentar, matar, não precisaremos nos posicionar. Poderemos passar o domingo em paz, sem escrever, gravar, postar, chorar, gritar.

Não canso de me impressionar com a tranquilidade de tantos homens em vociferar contra Leila Pereira. Eu jamais teria coragem de vir a público cobrar uma pessoa negra sobre um caso de racismo. Nem mesmo uma liderança. Como alguém que nunca sofrerá racismo, sinto que meu lugar de fala simplesmente não me autoriza.

Continua após a publicidade

Mas não o homem branco hétero confiante. Ele pode estar em qualquer lugar. Ele está autorizado a tudo. Ele tem o direito de ocupar todos os espaços.

Inclusive aqueles com histórico misógino estão por aí determinando o status da presidente na luta feminista. Afinal, quem mais qualificado do que um homem para julgar as atitudes de uma mulher diante do machismo?

É claro que eu gostaria de ver Leila hasteando todas as nossas bandeiras, implementando ações práticas, aproveitando o momento para passar uma mensagem clara aos desavisados: não passarão. Sei, porém, que ela não é a raiz do problema e que é — como todas nós somos — vítima diária desse tipo de imbecilidade. Não vou, portanto, investir minha energia jogando pedra nela.

A propósito, sabe o que eu também gostaria de ver? Gente que aponta o dedo para Leila sem nunca na vida ter se levantado diante de um ato machista tomar um pouco de vergonha na cara. Uma dosezinha de noção já cairia muito bem. Falar menos e aprender mais.

Se não vão ajudar, que pelo menos parem de atrapalhar.

Siga Alicia Klein no Instagram e no X (Twitter)

Continua após a publicidade

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

Deixe seu comentário

Só para assinantes