Como a Amazon montou com Rômulo e Bulgarelli o 'time dos sonhos' para a NBA
Quando a Amazon despontou no Brasil como compradora de direitos de transmissão, dois grandes movimentos foram deflagrados: a aquisição da Copa do Brasil, como sublicenciada da Globo, e o acordo com a NBA. No caso da maior liga de basquete do mundo, o projeto do streaming Prime Video logo começou a ganhar corpo com a montagem de um time que reunia nomes bem conhecidos dos fãs da modalidade na TV por assinatura, o narrador Rômulo Mendonça e o comentarista Ricardo Bulgarelli, ambos ex-ESPN.
Bulgarelli foi um dos primeiros nomes a se juntar ao time, ainda no começo do projeto, em outubro de 2022. Rômulo chegou em fevereiro do ano seguinte. Desde então, a dupla já viveu momentos inéditos em ambas as carreiras, principalmente com viagens para coberturas in loco, o principal ponto destacado pelos profissionais em uma conversa por videoconferência de quase uma hora com a coluna na última semana.
Rômulo e Bulgarelli também falaram sobre outras mudanças profissionais que ocorreram a partir da ida para a Amazon, e da empolgação com o futuro contrato de direitos de transmissão que vai mudar a forma como as finais serão exibidas no Brasil nos próximos anos. Além deles, o time do Prime Video é formado por outros nomes importantes, como Alana Ambrosio, Marcelo Gomes, e Estevan Ciccone.
A mudança nas vidas (e carreiras) de Rômulo e Bulgarelli
A notícia da saída de Rômulo Mendonça dos canais ESPN no começo de 2023 veio em um momento crucial para a mídia esportiva, que vivia já há alguns anos diversas mudanças em direitos de transmissão, a famosa fusão entre a própria ESPN e o Fox Sports, chegada com força do streaming, e a contratação do narrador pela Amazon era mais um importante capítulo dessa história. Afinal de contas, Rômulo era a grande voz da NBA nos canais da Disney, que já tinham sofrido com as baixas de Nivaldo Prieto e João Guilherme para o Paramount+, que chegava com o projeto de transmissões da Libertadores e da Copa Sul-Americana na mesma época.
Na entrevista exclusiva concedida à coluna, Rômulo lembrou que esse movimento em sua carreira o fez mudar de casa no meio de uma temporada da NBA. Mas que a presença de antigos companheiros ajudou na adaptação.
"Pegar o negócio no meio do caminho depois de quase 12 anos narrando na ESPN era uma coisa diferente. Mas, por outro lado, eu estreei narrando com o Bulgarelli, e fiz muitos também com a Alana (Ambrosio), então a maioria dos jogos eu já estava fazendo com gente com quem eu já tinha trabalhado, narrado anteriormente", disse Rômulo, que logo se empolgou com uma mudança trazida em sua vida pelo novo emprego: as viagens e coberturas presenciais.
"Por exemplo, eu nunca tinha ido em um All-Star Game presencialmente. Narrei muitos, sempre em fevereiro, e com duas semanas de Amazon Prime eu já fui para Salt Lake City. Foi uma cobertura jornalística, cobertura de rede social, mas já foi uma coisa que eu percebi ser um novo momento. E depois, em abril, a gente viajou para as finais de conferência, fizemos in loco, com o Bulgarelli, eu narrei lá Boston x Miami, a série final do Leste", contou.
Rômulo ainda disse que o "impacto" das viagens o motivou muito para "um mundo diferente de buscar coisas novas", segundo o narrador. "Eu valorizo muito essa coisa do 'in loco', que infelizmente nos tempos atuais... eu acho que eu era muito ingênuo quando mais jovem, porque eu imaginava que com o avanço da tecnologia todo mundo iria fazer in loco. Mas na verdade foi o contrário. Quando eu era adolescente, criança, é que tinha mais transmissões in loco, que a gente via os narradores em estádios, em corridas de Fórmula 1, a Bandeirantes fazendo a NBA in loco nas finais. Foi o contrário. Aumentou o gasto e diminuiu as possibilidades de viagens", disse.
Ricardo Bulgarelli concordou com o companheiro de transmissões. "Esse fato da viagem é importantíssimo, acho que é fundamental e o Rômulo tem razão em relação a isso. Quando a gente acha que modernidade vai acontecer e você sonha em participar dos eventos in loco, e é justamente o contrário. Nesse mundo de off tube, que você não se sente dentro do jogo totalmente, é fundamental você viajar", afirmou o comentarista.
Bulgarelli trouxe na bagagem duas passagens diferentes pela ESPN, a primeira entre 1995 e 2002, como produtor e editor, e a segunda, entre 2015 e 2023, como comentarista de basquete. "E a minha história muda um pouquinho em relação a do Rômulo porque ele chega em fevereiro do ano passado, eu chego em outubro do ano anterior (2022), eu era funcionário da NBA Brasil. A NBA Brasil, com a saída do sportv, com a saída da Budweiser, que era a grande patrocinadora, e a entrada do Amazon Prime, ela acha interessante eu ser um dos caras da NBA no Prime Video", relembrou.
O comentarista, que recentemente virou fixo da Amazon no Brasil, precisou inclusive parar de ser escalado na ESPN em jogos da NBA quando se dividia entre dois locais, já que Bulgarelli passaria a aparecer no Prime Video, um concorrente direto do Star+, serviço de streaming que carregava na época os conteúdos esportivos da Disney, papel hoje desempenhado pelo Disney+. Nos canais ESPN, passou a comentar outros jogos de basquete fora da liga. E ganhava por jogo.
"Eu lembro de ter feito um jogo do Brasil numas eliminatórias, e de ser um jogo com o Rômulo e ele falar 'eu tava com saudade de você'. E eu sabia que ele estava com o contrato para vencer e que ele seria assediado", contou Bulgarelli, que viu como passo natural o Prime Video ter ido atrás de contratar o narrador.
"O Rômulo é a voz da NBA no Brasil hoje. Ele não só narra com emoção, como ele ama, é apaixonado por basquete. É um cara profissional, ama todos os esportes, porém a NBA é algo que remete ele a interior, Divinópolis, em gravar os VHS. Eu nunca imaginei encontrar alguém tão apaixonado por NBA quanto eu, por isso a gente se dá tão bem", disse o comentarista. "Era natural que a NBA, com o crescimento do Prime Video, fosse atrás do melhor", completou Bulgarelli, em referência ao narrador.
Sobre a própria trajetória, Bulgarelli disse que não se sentiu valorizado pela ESPN pelo tempo de casa e pelas duas passagens. "E era natural, entre você ganhar por jogo na ESPN ou ser contratado em algum lugar, eu seria muito idiota se eu deixasse passar essa oportunidade. Era continuar fazendo o que amo, que é comentar basquete, trabalhar com a NBA, fora a possibilidade de estar em uma nova casa, de poder plantar esse semente de fazer in loco, como o Rômulo falou", afirmou.
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A final do Leste entre Boston Celtics e Miami Heat, na temporada 2022/23, ficou na memória da dupla do Prime Video. "Sete jogos, 20 dias, uma loucura, viaja-joga/narra. É um trabalho árduo, mas prazeroso, de estar lá. Fazer parte do maravilhoso mundo da NBA", define Ricardo Bulgarelli.
Rômulo Mendonça e Ricardo Bulgarelli passaram a ter a chance de fazer mais coberturas presenciais na NBA além das primeiras viagens. A dupla esteve na Copa NBA, em Las Vegas, na primeira edição do torneio realizada no fim do ano passado. Os dois destacaram também a presença na abertura da temporada 2023/24.
"Com o Bulgarelli eu transmiti a noite de abertura da temporada com a entrega de anéis em Denver. Nunca uma TV brasileira fez isso, TV ou streaming", contou Rômulo. Neste ano, a dupla não viajou para fazer as finais de conferência in loco, mas uma outra oportunidade surgiu: narrar a disputa do título da temporada na TV aberta.
A final da NBA na Band - com o Prime Video
Uma limitação que o contrato da Amazon com a NBA trazia para sua equipe era não poder fazer as finais da liga. O Prime Video tinha direitos até a final da Conferência Leste, mas não podia fazer os jogos que definiriam o grande campeão da temporada.
Em temporadas anteriores, a Band transmitia a NBA em TV aberta e fazia concorrência para a ESPN nas finais, mas a marca da Disney jogava com a exclusividade total entre plataformas pagas, o que impede a Amazon de exibir esses jogos em seu streaming. Mas a Band não quis mais transmitir a liga na temporada passada, e foi aí que uma brecha se abriu para o time do Prime Video: por que não fazer uma parceria com a emissora aberta e levar a equipe da Amazon para o canal?
"O fato de trazer a transmissão para uma TV aberta, a ideia foi do Rômulo. Lá em Denver, quando começa a temporada, ele chega e fala para as pessoas da Amazon: 'se a Bandeirantes não for fazer, ou nenhuma TV aberta for fazer, eu acho que vale a gente tentar fazer uma parceria com alguma TV aberta'. É óbvio que a Bandeirantes seria a primeira opção, porque foi quem trouxe a NBA para o Brasil, teve Luciano do Valle, eu comecei na Bandeirantes em 1995, e o Prime viu como uma possibilidade", contou Ricardo Bulgarelli, sem saber exatamente se poderia revelar isso.
Rômulo brincou e confirmou a autoria da ideia, mas em um momento diferente. "Fui eu mesmo que sugeri. Ele é meio linguarudo (risos). Não foi nem em Denver, foi antes em um jantar aqui em São Paulo, mesmo. Eu tenho umas ideias mirabolantes, eu fico pensando em situações legais para buscar a transmissão. Eu já tinha umas ideias, e em um jantar eu falei para eles porque eu já tinha visto a notícia que a Bandeirantes não iria transmitir a temporada", disse o narrador, que afirmou ter aguardado a confirmação de que o canal aberto desistiria mesmo da NBA para poder sugerir essa solução.
"Caso a Band transmitisse a temporada, como transmitiu em outros anos, eu nunca iria sugerir isso. Porque eu ia achar uma situação muito desagradável, antiética, o pessoal lá da Band narrar a temporada inteira e quando chegasse nas finais viria a equipe do Amazon Prime e eles não fazem. De forma alguma eu iria sugerir isso. Mas quando eu vi a notícia de que eles não tinham interesse de transmitir e só estavam avaliando a possibilidade de fazer as finais, aí eu vi uma brecha para falar 'já que não vão transmitir a temporada, por que não sugerir isso?'", contou Rômulo.
A dupla transmitiu pela Band a conquista do título do Boston Celtics sobre o Dallas Mavericks, uma série definida com um 4-1. Logo no canal que trouxe a NBA para o Brasil nos tempos de Luciano do Valle, Álvaro José e tantos outros nomes. Rômulo disse que procurou sempre resgatar essa história durante as transmissões.
"Eu fiz questão em cada jogo de iniciar citando alguma coisa relacionada à transmissão da Band nos anos 1980 e 1990. Pena que a final foram só cinco jogos, não foi uma final competitiva, então acabou não tendo essa atração especial porque o Boston foi muito dominante. Mas teve jogo que eu iniciei citando (por exemplo) algo que o Álvaro José narrou, aproveitando efemérides, diferente da Copa do Brasil que a final é (disputada) em um mês diferente, a NBA, tirando pandemia, a final é sempre em junho, então as datas casavam e me ajudavam nesse sentido", contou o narrador, que também levou sua conhecida irreverência para a TV aberta ao brincar com uma atração 'conhecida' do canal.
"Eu pedi para uma moça lá da Band, 'me passa a sinopse do Cine Privê'. Aí eu lia do nada no ar, fazia a chamada, 'vem aí no Cine Privê'. Brincava também com o Datena, pegava lembranças, datas, essa coisa de ter conexão com memórias de infância", disse Rômulo, que também relatou ter tido um encontro com José Luiz Datena nos bastidores da emissora em um sábado de junho. O narrador disse ao apresentador que suas primeiras lembranças de Datena eram do esporte, e não do jornalismo policial. Segundo Rômulo, Datena ficou contente ao ouvir essa fala.
Liberdade para sugestões
O exemplo da final da NBA exibida na Band com o trabalho do time do Prime Video é usado por Rômulo e Bulgarelli para abordar mais um ponto que está agradando a dupla nessa nova fase no Prime Video: a liberdade para sugerir novas ideias.
"(Esse caso da final foi) muito simbólico nessa mudança, por essa abertura para que eu pudesse fazer uma sugestão, eles ouvissem, achassem interessante, viável, e colocassem em prática a conversa e depois a transmissão em si. É muito bom ter essa liberdade para sugestão", disse Rômulo Mendonça.
"É a confiança que a empresa tem nos funcionários de você poder ser ouvido e ter a liberdade de dar uma sugestão como essa", completou Ricardo Bulgarelli.
Novo contrato com finais da NBA no Prime Video
A conversa avança para o futuro, especialmente sobre o novo contrato de transmissão da NBA, que começa a valer na temporada 2025/26 e terá 11 anos de duração. Nesse novo acordo, fechado nos EUA, a Amazon adquiriu 66 jogos da temporada regular, incluindo uma rodada dupla de abertura na semana inicial, além de um novo jogo na Black Friday, Copa NBA, exclusividade das Finais de Conferência em seis temporadas, e a principal novidade no pacote expandido válido no Brasil e em países como México, França, Itália, Espanha, Alemanha, Reino Unido e Irlanda, um ponto que Rômulo Mendonça fez questão de trazer no papo.
"Eu posso estar errado, mas não vi muito na mídia esportiva a questão do novo contrato da NBA que será iniciado no ano que vem e válido por 11 anos, que vai ter a sequência da Disney, com ESPN e ABC. A NBC voltando. Sai a TNT nos EUA e entra a Amazon. E esse contrato vai replicar no Brasil. E eu não vi ninguém destacando que no Brasil, nos próximos 11 anos, em seis deles as finais vão ser na Amazon. O que é uma mudança muito grande de todo o histórico de direitos de transmissão da NBA no Brasil", disse o narrador.
De acordo com a Amazon, além dessas finais, o pacote expandido conta também com um mínimo de 20 jogos adicionais da temporada regular em horário nobre a cada ano. Até hoje, a ESPN detinha a total exclusividade das finais de temporada nas plataformas pagas todos os anos, razão pela qual a equipe do Prime Video precisou recorrer à Band para fazer a decisão que teve o Boston como campeão no meio deste ano. Nos EUA, a Disney continua com a exclusividade da série do Finals.
E a atual temporada, quem leva?
Enquanto não chega o próximo contrato, a equipe da Amazon já está trabalhando na atual temporada da NBA, que começou em outubro. Hoje, por exemplo, o Prime Video começa as transmissões da Copa NBA com uma rodada dupla contando com Philadelphia 76ers x New York Knicks, a partir de 21h30 (horário de Brasília), e Golden State Warriors x Dallas Mavericks, na virada para amanhã, à 0h. No ano passado, em sua primeira edição, o Los Angeles Lakers foi campeão desse torneio.
Mas o título mais importante, o da temporada, o grande campeão, esse ficou com o Boston Celtics. Que é o grande favorito na opinião de Rômulo e Bulgarelli para levar um bicampeonato, apesar de outros times serem citados como equipes a serem observadas.
"O Oklahoma City Thunder é o time mais jovem da liga e tem uma defesa incrível, tem muito talento, está preparado para dar um salto e avançar. A Conferência Oeste é muito disputada. No Leste, além do Boston, agora tem o Cleveland Cavaliers que tem uma campanha incrível de início da temporada, é um time muito forte, tem o New York Knicks. A NBA não tem um bicampeão consecutivo desde o Golden State Warriors, temporada 2017/18. Talvez seja desde então o momento em que haja o momento de maior favoritismo para que isso ocorra. Mas, como é uma longa maratona, e tem toda uma questão de contusões e equipes em evolução, é algo muito aberto. Mas o Boston é o grande favorito a um bicampeonato", disse Rômulo.
"São seis campeões diferentes nas últimas seis temporadas. Você não consegue ter um campeão em 2019 que seja o mesmo em 2023. A NBA nos últimos anos tem ficado bem equilibrada, na Conferência Oeste nem se fala. São campeões diferentes, cada representante nas finais, para você ter uma ideia, nas últimas seis temporadas tivemos cinco finais inéditas, a final não se repete, não é somente ter um campeão novo. E estou com o Rômulo, é a maior possibilidade, mesmo o Boston começando a temporada com o Porzingis lesionado, o Jaylen Brown já se machucou, mas a profundidade de elenco, a manutenção de 15 jogadores do ano passado para esse, a motivação que o Jayson Tatum pode encontrar por ter amargado um banco de reservas em Paris, o Jaylen Brown por ter sido preterido e não ter ido para a seleção olímpica depois da dispensa do Kawhi Leonard, acho que eles podem usar esses fatores, e também essa ausência de um bicampeonato, e o Boston não é bicampeão desde os anos 1960. Então eles podem usar várias coisas para se motivar. A qualidade do time é incrível. E concordo com o Rômulo, de olho em Cleveland, Oklahoma", analisou Bulgarelli.
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