Allan Simon

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Leifert é nova chance de dar 'cara' ao futebol do SBT, mas problema é outro

O jornalista Tiago Leifert foi anunciado oficialmente hoje pelo SBT como novo narrador do futebol na emissora, com estreia marcada para o próximo dia 21, quando Benfica e Barcelona se enfrentam pela sétima rodada da fase de grupos da Champions League com transmissão do canal. Leifert também vai comandar as partidas da Copa Sul-Americana exibidas pelo canal a partir de março.

A contratação do ex-apresentador global é uma espécie de terceira chance que o SBT tem de dar uma 'cara' ao seu futebol desde o retorno da emissora ao esporte em rede nacional ocorrido há quase cinco anos. Nesse período, Téo José e Cleber Machado ocuparam a função de narrador titular no canal. Luiz Alano, apesar de ter ido muito bem em todas às vezes que precisou ser acionado, segue como o segundo da casa.

Em 2020, durante a pandemia e aproveitando as mudanças nos cenários de transmissão, o canal da família Abravanel abraçou de vez o futebol comprando a Libertadores após a saída da Globo em pleno contrato vigente, isso depois de ter uma boa experiência exibindo a final do Campeonato Carioca entre Flamengo e Fluminense, outra oportunidade aproveitada pelo SBT após a implantação da "Lei do Mandante" (na época ainda por força de medida provisória assinada pelo então presidente Jair Bolsonaro).

Nessa época, a escolha de Téo José juntou o útil ao agradável. O narrador tinha história com o SBT, onde foi o principal nome das bem-sucedidas transmissões da Indy (ou Fórmula Mundial) entre 1995 e 2000 e também atuou algumas vezes no futebol, e estava no Fox Sports em plena época de fusão com a ESPN. O casamento era questão de tempo e deu muito certo.

O SBT deu muita sorte não apenas ao ver cair em seu colo a chance de transmitir a Libertadores a partir de setembro de 2020 e ocupar o resto do período de contrato que era da TV Globo até 2022, como também ao se deparar nesse tempo com três finais 100% brasileiras na competição, com os títulos do Palmeiras sobre Santos e Flamengo, nas edições de 2020 e 2021, respectivamente, e do Flamengo sobre o Athletico Paranaense em 2022.

Téo José representava esse SBT mais raiz, era a "cara" da emissora do passado, mas mesmo assim o canal não conseguia imprimir uma marca realmente notável no futebol de hoje. Não por causa do narrador, dos comentaristas, repórteres, nada disso. O formato do futebol de hoje é mais engessado, todas as competições que o SBT transmite nacionalmente desde 2020 são torneios com geração de imagens centralizada na organização, com regras bem definidas, não dá mais para ser criativo como era o SBT dos anos 1990.

Naquela época, quando Téo integrava uma equipe composta ainda por outros nomes da narração como Nivaldo Prieto, Silvio Luiz, Luiz Alfredo, Osmar de Oliveira e Oscar Ulisses em diferentes anos da década de 1990, e ainda comentaristas do porte de Orlando Duarte e Juarez Soares, o SBT tinha mais liberdade para criar e ousar. Quem viveu aquela época se lembra bem das vinhetas de gol, da interação de narradores com as imagens na tela, do clima mais descontraído.

Só que o SBT parou no tempo após uma decolagem gigante vivida em 2021, ano em que conseguiu a Copa América com exclusividade em TV aberta, com direito a uma final Brasil x Argentina, e mostrou as duas finais do Palmeiras contra Santos e Flamengo na Libertadores, e que o canal também resgatou para esta mídia a Champions League. Depois disso, pouca coisa veio no mercado para o canal.

Em 2022, o SBT perdeu para a TV Globo a concorrência promovida pela Conmebol para os direitos da Libertadores em TV aberta no ciclo 2023-2026, e teve que se contentar com a compra da Copa Sul-Americana nesse período. A Champions League, com modelo de negociação diferente, foi renovada para o período entre as temporadas 2024/25 e 2026/27 só depois de muita negociação e da aprovação da TNT Sports, detentora exclusiva dos direitos no país.

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Nesse meio tempo, o Paulistão foi parar na Record, o Carioca passou pela Record e foi para a Band, emissora esta que levou até uma edição do Mundial de Clubes da Fifa com o Palmeiras, outra oportunidade de mercado que o SBT deixou passar. A Fórmula 1 surgiu como oportunidade rara após a saída da Globo, mas também foi parar na Band em 2021.

Em 2023, no mês de setembro, o SBT fazia uma nova tentativa de mudar sua 'cara' no futebol. Contratou Cleber Machado, que havia saído da Globo em março, passou rapidamente pela Record na final do Paulistão daquele ano, e estava narrando apenas no streaming com a Amazon no Prime Video.

Quando Cleber foi anunciado, a emissora dizia publicamente que a ideia era manter Téo José como narrador também. E esta coluna questionava: e os eventos? Manter três narradores, Cleber, Téo e Alano, parecia demais, tendo apenas jogos da Sul-Americana e da Champions para fazer.

O SBT ainda conseguiu uma vitória pontual ao levar os jogos do Vasco como mandante no Cariocão 2024, mas não exibiu para todo o Brasil. Foram os últimos trabalhos de Téo José na emissora. Os eventos não vieram, e o narrador que mais tinha a 'cara' do canal acabou saindo após quase quatro anos, três grandes finais de Libertadores, duas de Champions League, uma de Carioca, uma de Copa América e outra de Copa América Feminina. Era também o narrador, entre todos os canais abertos, mais envolvido e interessado com o dia a dia do esporte na casa.

Com Cleber Machado, o SBT agora abraçava o 'recall' que o narrador trazia de suas mais de três décadas de Globo. Era notável a sensação de achar estar sintonizado na TV Globo se estivesse com o televisor ligado durante uma partida sem prestar muita atenção nela. Cleber também abraçou a causa (ou a casa) e ficou mais livre para ser leve nas transmissões, fez diversas brincadeiras relacionando a marcas e tradições da casa. Era um jeito diferente, que resgatava mais os símbolos do SBT enquanto trazia uma força comercial de Globo, inclusive fazendo do 'Arena SBT' um programa semanal mais parecido com os da TV paga, com o próprio 'Arena SporTV' que Cleber comandou por anos.

Mas essa era acabou de outro jeito, não por opção do SBT, mas por consequência de tudo o que aconteceu até aqui. Se Téo José foi dispensado no começo de 2024 muito por falta de eventos, e o SBT continuava sem ousar, sem se mexer, Cleber Machado saiu porque o SBT não conseguiu comprar o Brasileirão. Era a chance de ouro, a maior de todos os tempos.

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Pela primeira vez, o Campeonato Brasileiro fazia uma disputa verdadeiramente aberta entre emissoras, e a Globo não tinha poder de barrar suas rivais. Com a divisão dos clubes em blocos, Libra e LFU, e a Globo fechando com a Libra, o pacote de plataformas abertas da LFU parecia cada vez mais perto do canal da família Abravanel. Mas, de novo, a oportunidade foi parar em outras mãos, as da Record. Que levou Cleber Machado também para liderar o novo projeto esportivo. Braisleirão até 2027, Paulistão até 2029.

O SBT que contrata Tiago Leifert deve ficar com uma aparência mais jovem, mais descontraída, mais informativa até, principalmente nos jogos de futebol europeu, mas continuará sendo uma emissora que não se provou ainda capaz de lidar com as chances que apareceram após aquela escalada inicial de eventos.

Leifert tem a chance de construir sua carreira de vez como narrador, depois das experiências no YouTube, na Amazon e no Globoplay, que consolidaram a imagem daquela voz que marcou a série FIFA por tantos anos entre os jovens gamers.

Deve ter sucesso entre boa parte desse público que também é muito fã da Champions League. Talvez a melhor oportunidade até aqui de bater um pouco mais de frente com a TNT Sports na preferência do apaixonado por futebol europeu, um desafio que vários profissionais da emissora já reconheceram à coluna ser muito difícil entre o nicho mais 'maluco' pela competição.

Na Sul-Americana, dificilmente muda a lógica: os times é que fazem a audiência. O SBT foi dependente do Corinthians em todos os momentos desde que assumiu esse torneio em 2023. Tanto que o escolheu sempre que foi possível por contrato. Agora, porém, isso só será possível em 2025 se o Timão cair fora na última fase preliminar da Libertadores, ou ficar posteriormente em terceiro na fase de grupos.

Tiago Leifert é uma boa aposta e carrega um grande nome, uma grande fama e leva na bagagem tudo o que construiu na Globo - e isso começou com a renovação do Globo Esporte em 2009, veja só, para fazer o programa esportivo parar de ser incomodado na audiência pelo 'Chaves', justamente atração histórica do SBT.

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Mas quando é que o SBT vai voltar a ser forte no mercado de direitos? Haverá outros eventos para que Leifert tenha mais chances de mostrar seu trabalho e marcar grandes momentos do futebol na sua voz? A pergunta que esta coluna fez quando Cleber Machado foi contratado, em 2023, está renovada.

Opinião

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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