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André Rocha

Nem o VAR tira a bengala que é reclamar de arbitragem no Brasil

Jogo entre Botafogo e Inter termina com aparelho do VAR derrubado após chute do goleiro Gatito - Reprodução
Jogo entre Botafogo e Inter termina com aparelho do VAR derrubado após chute do goleiro Gatito Imagem: Reprodução

Colunista do UOL Esporte

01/09/2020 10h03

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No sábado, Gatito Fernández chutou o equipamento do VAR no Estádio Nílton Santos, revoltado com o real grande erro de arbitragem nos principais jogos do fim de semana: o gol de Bruno Nazário no segundo tempo de Botafogo 0x2 Internacional.

Porque a falta de Mateus Babi sobre Patrick não foi tão clara a ponto de invalidar a interpretação de disputa normal do árbitro de campo. O VAR não deve interferir a esse ponto. Nada que justifique a truculência do jogador do Botafogo, mas algo que precisa ser discutido internamente para que seja evitado.

Curiosamente o fato que repercutiu tanto na abertura da sexta rodada foi soterrado pelas discussões sobre Santos 0x1 Flamengo. Sem sair, obviamente, do tema principal e onipresente: a arbitragem, com VAR incluso.

É óbvio que o tempo para definir se houve impedimento ou não precisa diminuir. E a falta da torcida pressionando na Vila Belmiro certamente deixou a equipe do VAR mais confortável para demorar na decisão. E, convenhamos, os árbitros devem vibrar com a imagem da TV focada neles, como o centro das atenções por tanto tempo. Protagonismo também para os comentaristas de arbitragem.

A vontade de aparecer e se destacar está nas entranhas de toda discussão sobre arbitragem no Brasil. Ainda mais em tempos de redes sociais. No futebol é disparado o assunto que gera mais engajamento. Porque o brasileiro adora uma teoria de conspiração.

Os times mais populares ou os dominantes historicamente são acusados de favorecimento. Mesmo que o tempo dilua essas críticas. Até o Flamengo de Jorge Jesus foi alvo enquanto construía o domínio absoluto no cenário nacional e sul-americano. Houve gritaria, por exemplo, na virada sobre o Fortaleza no Castelão por conta do pênalti sobre Rodrigo Caio e da presença de uma segunda bola em campo no momento em que Reinier cabeceou para as redes nos acréscimos para decretar os 2 a 1.

Os "debates" intermináveis são cômodos para todas as partes. Os torcedores rivais têm uma suspeita para contrapor a nítida superioridade do time odiado. Antes era "apito amigo", agora é "VAR+ nome ou apelido do time". Os apaixonados pelo alvo do ódio ficam atentos para responder e contestar as acusações, mesmo as veladas - ainda mais em tempos de milícias digitais de grandes torcidas.

Os comentaristas sem muito conteúdo para analisar o que acontece no campo têm um prato cheio para preencher o tempo dos programas com as "polêmicas" sobre arbitragem e capturar a narrativa sem correr o risco de perder espaço para os que querem e sabem discorrer sobre as questões técnicas e táticas. E ainda podem virar o assunto mais comentado no Twitter.

Por isso a discussão interminável e inútil sobre os impedimentos marcados em Santos, especialmente o segundo na cobrança de falta direta de Marinho. O gesto de Wilton Pereira Sampaio logo após a anulação do gol, passando a mão na frente do rosto deixava claro: o volante Jobson estava impedido e com seu movimento, inclusive tentando colocar o braço na bola, teria interferido diretamente no ataque e atrapalhado o goleiro Diego Alves.

É a regra, que pode e deve ser discutida. Assim como o absurdo que é anular um gol porque a bola bate no braço do atacante durante uma queda, em movimento totalmente involuntário. Aconteceu com Bruno Henrique, no lance que terminou em gol de Gabigol contra o Botafogo.

O que não pode é apelar para absurdos como dizer que "é estranho, mas está na regra" para um time e "está na regra, mas é estranho" quando se trata de outra agremiação. Isso não é polêmica, mas desonestidade mesmo. Como os que olham camisa para reclamar acusando o árbitro de olhar camisa para apitar.

De qualquer forma, é mesmo uma tremenda ingenuidade pensar que as reclamações sobre arbitragem deixariam de ser bengala no futebol brasileiro por causa do VAR. O importante é causar, mesmo defendendo absurdos como "impedimento de centímetros não pode ser marcado". Deixou de ser impedimento? A tecnologia não está lá justamente para evitar o equívoco em lance capital?

Só que a roda precisa continuar girando. Dirigentes, treinadores e jogadores precisam do "álibi" para desviar o foco de seus erros. A mídia precisa da discussão com imagens indo e voltando para manter o espectador atento , sem o risco dele zapear ou desligar a TV para olhar o celular. E, principalmente, a arbitragem disfarça a falta de conteúdo do jornalista e é a desculpa perfeita para a zoação do torcedor do time que venceu.

Por mais que a CBF melhore as práticas dos árbitros no campo e no vídeo, vai demorar para mudar esse modus operandi. Continua bom para todo mundo, menos para quem gosta mesmo de futebol.