Os velhos "truques" de Abel Braga que colocam o Inter na rota do título
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Aos nove minutos de jogo no Beira-Rio, o Internacional já vencia o Fortaleza por 2 a 0. Gols de Yuri Alberto e Rodrigo Dourado. O primeiro com bola rolando, o segundo completando cobrança de falta de Moisés.
Sempre pela esquerda, o "atalho" do time gaúcho desde o início da partida. Com Moisés, Patrick e também Praxedes no setor do perdido Tinga. E não melhorou com Enderson Moreira tirando Osvaldo e colocando Gabriel Dias na lateral para adiantar Tinga. Pela esquerda saíram também as jogadas dos gols de Peglow e o contra de Carlinhos que definiram os 4 a 2.
Quando Wellington Paulista diminuiu de pênalti para o time cearense, o Inter tinha apenas 29% de posse de bola no jogo. Terminou com 45%. Nas seis vitórias seguidas que levaram a equipe à vice-liderança, agora a apenas um ponto do líder São Paulo antes do confronto direto no Morumbi pela próxima rodada, sempre ficou menos com a bola do que o adversário. Foi assim também no empate por 2 a 2 com o Atlético Mineiro e só teve superioridade na posse no empate sem gols contra o Atlético-GO que iniciou a série invicta no Brasileiro.
Impossível não lembrar da entrevista exclusiva que este que escreve, na época trabalhando na ESPN Brasil, teve com o treinador Abel Braga em 2012, logo depois da confirmação do título brasileiro do Fluminense, o único em nível nacional da carreira do técnico veterano que alcançou suas maiores glórias justamente no Internacional, com os títulos da Libertadores e Mundial de Clubes em 2006.
No papo com o "Abelão", com direito a campinho e botões nas Laranjeiras, ele disse algo que ficou na memória do colunista: "O problema é quando você tem a bola". Ou seja, mais posse significa maior possibilidade de erro e dar chance aos rivais.
Ao longo da conversa, o treinador foi revelando sua preocupação com os adversários na montagem do próprio time. Se o oponente tivesse dois atacantes, ele recuava o volante Edinho como terceiro zagueiro. Caso contasse com três homens pelo meio, ele puxava Thiago Neves do lado esquerdo para o centro e variava o 4-3-3 para um 4-3-1-2. "Nunca posso perder o meio-campo", disse Abel.
Agora a variação é do 4-2-3-1 para o 4-1-4-1, de acordo com a movimentação de Praxedes. Mas no futebol atual importa mais a altura da marcação. Normalmente é mais recuada, mas se houver confiança, como no início contra o Fortaleza, o time pode adiantar as linhas e até lembrar a pressão sufocante dos tempos de Eduardo Coudet.
Mas é numa visão mais geral e estratégica que está um "truque" de Abel Braga que nesta edição do Brasileiro vem sendo muito útil, assim como aconteceu há oito anos.
O treinador foi o primeiro a insistir na ideia de que campeonato por pontos corridos se vence jogo a jogo. "Toda partida é uma final". Hoje um clichê na boca dos treinadores. Mas com uma diferença: para Abel, é decisão e com 50% de chances para cada time. Ou seja, a sua equipe não assume favoritismo, nem protagonismo.
Enquanto o Atlético Mineiro de Cuca jogava um futebol mais encantador e assumindo o papel de time mais qualificado e que busca o ataque, perdendo pontos ao ceder espaços aos adversários, Abel fazia seu Fluminense, mesmo com estrelas como Deco e Fred, muitas vezes vencer nos contragolpes puxados por Wellington Nem. E se garantir atrás com o desempenho espetacular de Diego Cavalieri, única vez na era dos pontos corridos com 20 clubes em que o goleiro campeão foi também o mais acionado do campeonato.
Em 2020, São Paulo, Atlético-MG e Flamengo vêm se enrolando com o favoritismo que obriga a atacar e se abrir. O time de Coudet se atrapalhou contra a retranca do Corinthians em Itaquera quando era líder da competição. Abel vai na contramão. Hipervaloriza todos os adversários para vencê-los em jogos de transições e aproveitando a bola parada. Sem vergonha.
Até no time mais estelar que comandou, ainda que brevemente, o treinador sabia recolher suas linhas para ganhar espaços e fazer suas estrelas brilharem: o Vasco campeão da Taça Guanabara em 2000. Mesmo contra os pequenos cariocas, a equipe cruzmaltina pressionava para abrir logo o placar e recuar com o objetivo de acionar a dupla Edmundo-Romário, que vivia às turras - com auge no episódio "rei, príncipe e bobo da corte" - e Abel soube usar a competição interna de seus craques para marcar mais gols.
Agora o técnico que parecia viver um ocaso na carreira, depois de trabalhos não tão bem sucedido no Flamengo e ruins em Cruzeiro e Vasco, na volta ao clube em que é ídolo, Abel não dispõe de um elenco de craques, mas vai encontrando soluções. Sem Galhardo, contundido e em baixa, faz de Yuri Alberto o artilheiro do time, com seis gols no Brasileiro. Perdeu Rodrigo Moledo, com lesão grave no joelho, e dá oportunidades ao jovem Lucas Ribeiro na zaga.
No meio, resgatou Rodrigo Dourado na vaga que era de Musto ou Lindoso. Na frente, sem confiança em Marcos Guilherme, subiu Caio Vidal e usa João Peglow como opção de velocidade. Para quem no início do trabalho disse, entre outras frases infelizes, que não conhecia o jovem atacante reserva, Abel está bem atento.
E com sangue nos olhos para buscar uma virada improvável em sua própria história com uma conquista que parecia impossível até para o próprio Inter, que depois das eliminações na Copa do Brasil e na Libertadores já pensava na próxima temporada com Miguel Àngel Ramírez. Mas antes pode levantar a taça que não vê desde 1979.
Em um campeonato atípico e maluco, os "macetes" de Abel que pareciam ultrapassados vêm funcionando. Na quarta, uma decisão em São Paulo. Certamente deixando a bola e transferindo a responsabilidade de atacar para o instável time de Fernando Diniz. Pode dar certo novamente.
(Estatisticas: SofaScore)
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