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André Rocha

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Rocha: Ronaldo no Cruzeiro será o primeiro mecenato "oficial"?

Ronaldo no anúncio como novo dono do Cruzeiro - Reprodução/Instagram
Ronaldo no anúncio como novo dono do Cruzeiro Imagem: Reprodução/Instagram

Colunista do UOL Esporte

20/12/2021 05h30

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O anúncio de que Ronaldo Fenômeno, através da empresa Tara Sports, havia comprado 90% das ações da SAF (Sociedade Anônima do Futebol) do Cruzeiro caiu como uma bomba no fim de semana e repercutiu mundo afora, até pela visibilidade do segundo maior artilheiro da história das Copas do Mundo.

Entre muitos cruzeirenses nas redes sociais, a notícia foi recebida com festa, como se o clube com dívida de cerca de 1 bilhão de reais tivesse encontrado sua resposta, com mais carisma e representatividade por ter sido revelado pelo clube, aos mecenas do rival Atlético Mineiro.

Ou seja, tinha chegado o "homem". Como Emil Pinheiro, bicheiro apaixonado pelo Botafogo que foi alçado à condição de presidente em 1991 depois de montar, como diretor de futebol, o time campeão carioca de 1989, encerrando jejum de 21 anos. Ou Castor de Andrade, folclórico contraventor que deu protagonismo ao Bangu e foi muito bem retratado na série "Doutor Castor", na Globoplay.

É claro que a relação entre Ronaldo e Cruzeiro será bem mais formal, firmada em contratos e com regras claras, ao menos no papel. Mas o que o torcedor espera, e se acostumou a ver no Brasil há décadas, é alguém injetando dinheiro como se não houvesse amanhã, resolvendo os problemas imediatos e formando times competitivos rapidamente.

Para o torcedor comum, o que importa é voltar a vencer e poder zoar os rivais. Mesmo sem uma estrutura institucional e investimentos a longo prazo para que o clube se torne autossustentável. Doping financeiro mesmo.

Até porque o Cruzeiro é a prova final de que clube grande no Brasil não vai à falência, mesmo com a gestão mais irresponsável. O Botafogo parece seguir o mesmo caminho. Vira SAF e tudo se resolve, ou ao menos garante uma vida menos caótica no curto/médio prazo.

No caso de Ronaldo, ao menos no Valladolid a coisa tem seguido um curso menos ilusório. O agora empresário é até visto como "ausente" e o time foi rebaixado para a segunda divisão. Mas no Brasil sabemos que tudo pode ser bem mais "flexível". Foi assinado um protocolo de intenções, depois haverá uma auditoria do novo sócio. A SAF tem obrigação de usar 20% das receitas e metade dos dividendos para equacionamento das dívidas.

Oficialmente serão 400 milhões investidos em cinco anos de operação. Como é algo novo, tudo ainda soa um tanto nebuloso. Ronaldo pediu ajuda a Andrés Sanchez, ex-presidente do Corinthians. Um personalismo meio estranho e, em tese, contraproducente, já que o dirigente aumentou consideravelmente a dívida do clube paulista. Em que ele poderia contribuir com um potencial rival nacional?

Filosoficamente, digamos assim, é estranho ver um clube de futebol com tanta história ganhar um dono. Uma instituição que desperta paixões em tanta gente virar um produto de compra e venda. Intuitivamente talvez este que escreve até prefira mesmo que Ronaldo aja mais por gratidão do que com a frieza de um empresário pragmático. Visando apenas lucro, sem nenhuma subjetividade.

O torcedor celeste, no geral, não quer saber. Espera sair logo da Série B e voltar a lutar por grandes títulos. Talvez agora com um pouco mais de cautela, pois viu o inferno por dentro. Mas com a certeza de que no Brasil quase tudo é possível. Até um mecenato "oficial" que vai inundar o futebol nacional de times "biônicos", desestimulando aqueles que já se sacrificaram em busca da estabilidade financeira e os que pretendiam seguir o mesmo caminho.

Está aí o possível "atalho". Com o conhecido "jeitinho brasileiro".