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ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Roberto Salim - As duas comemorações do grande Evaristo

Evaristo comemorou o aniversário de 88 anos ontem, ao lado da seua família - Arquivo pessoal
Evaristo comemorou o aniversário de 88 anos ontem, ao lado da seua família Imagem: Arquivo pessoal
Roberto Salim

23/06/2021 11h39

No apartamento 1201, no bairro de Ipanema, a semana é de festa para um velho ídolo do futebol brasileiro: o carioca Evaristo de Macedo comemorou 88 anos no último 22 de junho. Hoje, ele assiste de camarote ao jogo entre Brasil e Colômbia.

É uma partida que lembra um fato muito importante da carreira de Evaristo, que só não jogou a Copa do Mundo de 1958, por puro capricho da diretoria do Barcelona. O time espanhol não o liberou para seguir com a seleção brasileira para a Suécia.

"Neste aniversário de 88 anos, lembro também da conquista do Campeonato Brasileiro pelo Bahia, que foi em 1988", brincou Evaristo, exaltando com sua família aquela conquista inesquecível em um time que tinha Bobô, Charles e Zé Carlos.

O bolo da celebração de ontem era de chocolate, mas o velho jogador estava mesmo derretido pelo seu grande xodó atual: a bisneta Maria Augusta, de um ano e quatro meses.

Apesar da pandemia e dos cuidados tomados, Evaristo acredita que estará presente, firme e forte, no Campeonato Mundial em 2022, porque é um verdadeiro ídolo no Catar, onde foi lenda dentro de campo e, depois de pendurar as chuteiras, um técnico histórico.

Em sua carreira nos gramados, o velho jogador atuou em Madureira, Flamengo, Barcelona, Real Madrid e na seleção nacional, onde é até hoje o recordista de gols em uma só partida. E adivinhem contra quem o atacante Evaristo fez 5 gols?

"Sim, foi na Colômbia, e até agora ninguém bateu o recorde do meu pai", conta o advogado Pepe, o único dos três filhos de Evaristo que nasceu em território brasileiro. "O meu irmão mais velho nasceu na Catalunha e a irmã mais nova em Madri", acrescenta.

A façanha de Evaristo aconteceu no dia 24 de março de 1957, quando os brasileiros golearam os colombianos por incríveis 9 a 0, no Estádio Nacional, em Lima, em partida válida pela Copa América.

"Engraçado que meu pai sempre diz que não liga para essa marca, mas uma vez falou ao Neymar que torcia muito por ele, e que quando fizesse quatro gols em um jogo, ele ia torcer para o atacante parar de fazer gols para não igualar o seu recorde", confessa Pepe, lembrando um encontro do pai com o jogador do Paris Saint-Germain, na Cidade Esportiva Joan Gamper, em Barcelona.

Depois dos cinco gols contra os colombianos, Evaristo de Macedo participou dos jogos da seleção brasileira contra o Peru pelas eliminatórias da Copa da Suécia.

"Pouca gente sabe, mas a Venezuela desistiu da disputa e então uma vaga foi definida em duas partidas entre Peru e Brasil. No primeiro jogo houve empate de um a um, em Lima. No segundo, no Maracanã, aconteceu o gol da folha seca do Didi. O Brasil ganhou de 1 a 0 e carimbou o passaporte para a Copa", relembra o filho de Evaristo, que dá um outro detalhe da vitória brasileira. "Quem sofreu a falta cobrada por Didi foi o meu pai".

Nesse jogo contra os peruanos, a seleção era comandada por Oswaldo Brandão e, na época, já se falava muito de um menino chamado Pelé. Apesar disso, o Brasil entrou em campo com Gylmar; Djalma Santos, Bellini, Zózimo e Nilton Santos; Roberto Belangero e Didi; Joel, Evaristo, Índio e Garrincha.

Evaristo era nome certo no grupo convocado por Vicente Feola, o técnico que comandaria o Brasil na Copa do Mundo de 1958. Mas, como dito anteriormente, ele foi negociado com o futebol espanhol. Foi ser ídolo primeiro no Barcelona.

Um outro detalhe que pouco se comenta é que todo o ataque do Flamengo foi para a Suécia: Joel, Moacyr, Dida e Zagallo.

"Faltou só o meu pai. Mas como a Espanha não se classificou para a Copa de 1958, o campeonato local continuou normalmente e o Barcelona não deu a liberação para ele se juntar à delegação brasileira na Europa. Ele ficou chateado, mas não podia reclamar. Na época, foi para lá ganhando muito dinheiro", diz Pepe.

Foi uma pena mesmo, porque Evaristo jogou apenas 14 vezes pela seleção. Inclusive, quando ainda era um jovem atacante do Madureira, foi convocado e disputou os Jogos Olímpicos de 1952, em Helsinque. Sua trajetória com a camisa do Brasil terminou com oito gols anotados, sem o gostinho de ter formado dupla com o menino Rei.

Mas para quem viu Evaristo de Macedo jogar, deve ser difícil não imaginar do que seria capaz um ataque com Mané Garrincha, Didi, Evaristo, Pelé e Pepe ou Zagallo. Enfim, são coisas do destino. Evaristo de Macedo teve uma carreira inacreditável na Espanha, onde foi ídolo primeiro do Barcelona e depois do Real Madrid.

"Há duas semanas, teve um pessoal da Uefa aqui no Rio de Janeiro para gravar com meu pai, para relembrar um gol histórico que ele marcou nas semifinais da Liga dos Campeões de 1961, quando o Barça eliminou o Real por 2 a 1. Foi um gol de peixinho, que entrou para a história", conta Pepe.

Na decisão daquele ano, disputada em Berna, o adversário era o Benfica. "Meu pai diz que mandou umas três bolas na trave, que era quadrada. Dizem que depois desse jogo é que a Fifa mudou as traves, que passaram a ser redondas. Se já fosse assim, as chances criadas poderiam ter virado gols. E o Barcelona seria o campeão", acrescenta.

Quando voltou da Europa, o artilheiro encerrou a carreira no seu Flamengo, o clube em que se consagrou antes de marcar seus primeiros gols pelo Madureira. O futebol não saiu da vida de Evaristo: ele se tornou técnico e chegou a comandar a seleção brasileira em 1985.

Evaristo também dirigiu Vasco da Gama, Flamengo, América e Fluminense, no Rio de Janeiro. Ganhou o Campeonato Brasileiro de 1988 com o Bahia, onde tem seu nome ao Centro de Treinamento. Ele também conquistou a Copa do Brasil pelo Grêmio e é ídolo até hoje no Catar, em que treinou a seleção principal e levou a equipe sub-20 à final do Campeonato Mundial de 1981.

"Há dois anos, foi homenageado no país que vai ser a sede da próxima Copa do Mundo. Foi muito festejado em Doha. E esteve também em Salvador em 2020, quando o CT do Bahia recebeu seu nome. Mas aí veio a pandemia e ele não saiu mais de casa", disse o filho de Evaristo.

E foi lá, no apartamento 1201, que ele soprou as velinhas de 88 anos na terça-feira. No mesmo lugar, ele vai torcer pelo Brasil contra a Colômbia hoje.

"O Brasil é superior e vai ganhar a partida. Mas não acredito que ninguém vai marcar cinco gols...", comentou Evaristo com seus familiares. E foi deixando um aviso para os jogadores de Tite: "Se alguém marcar quatro gols, que não conte mais com a minha torcida".

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