Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Pódio com três negras enterrou de vez o elitismo da ginástica artística
Mil palavras não seriam suficientes para dimensionar a representatividade de Rebeca Andrade, Simone Biles e Jordan Chiles no pódio do solo da ginástica artística nos Jogos de Paris 2024. Três mulheres negras, empoderadas e, acima de tudo, empoderadoras.
O oposto da triste cena da garotinha negra ignorada na entrega de medalhas de uma competição na Irlanda em 2022, que chocou o mundo ao se tornar pública em setembro de 2023.
Desta vez, as milhares de meninas cujos olhos brilham a cada salto, a cada pirueta e a cada sorriso exibido sobre o tablado puderam vislumbrar não apenas um futuro, mas um presente diferente de outros tempos, afinal, nem tão distantes, independentemente da cor de sua pele e de sua raça.
Um momento bem diferente do que perdurou por décadas nas quais quem se encantava com a ginástica via um desfile de jovens brancas exibindo seu talento. Ainda que não seja inédito em competições da modalidade—no Mundial de 2023, Biles, Rebeca e a também americana Shilese Jones dominaram no individual geral— o pódio olímpico tem um significado simbólico.
Parece inacreditável que apenas em Londres 2012, a ginástica —presente no programa olímpico desde a primeira edição moderna em Atenas 1896— teve sua primeira campeã olímpica negra, a americana Gaby Douglas. Afinal, saltos, cambalhotas e piruetas são geralmente parte do desenvolvimento básico de qualquer criança. Mas a ginástica de competição sempre foi um esporte elitista e limitado em sua diversidade racial. No Brasil, então, essa realidade sempre esteve elevada em algumas potências.
Daiane dos Santos abriu a porta para que brasileirinhas, incluindo a própria Rebeca, sonhassem tão alto quanto a impulsão para o duplo twist carpado de sua apresentação campeã no Mundial de 2003 —primeiro título do país na modalidade. O mundo viu a potência da brasileira negra conquistar seu espaço e brilhar.
Rebeca chegou para solidificar este pertencimento. Provou que ao superarmos as barreiras de acesso a oportunidades —indiscutivelmente ligadas a questões de raça e sociais— o Brasil só tem a ganhar. Hoje mini-Rebecas, Daianes e Lorranes chegam confiantes em seus sonhos tanto quanto minis Jades, Julias, Flavinhas, Danieles, Luisas e tantas outras que já voaram alto.
E aqui cabe lembrar um outro salto, o em altura de Aída dos Santos, em Tóquio 1964, no atletismo, primeira mulher brasileira finalista olímpica. Negra que, solitária naquela delegação olímpica, simbolizou com perfeição a célebre frase de Maya Angelou: 'Ainda assim eu me levanto'
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