Pódio para Todos: não é só sobre esporte paralímpico, é sobre mudar o mundo
Eu quero fazer um convite para vocês. Assistam ao documentário "Rising Phoenix", que foi lançado no último dia 26 de agosto, na Netflix. O filme foi produzido durante oito anos e mostra os bastidores da vida de nove atletas paralímpicos, além de tratar de questões muito importantes sobre o mundo das pessoas com deficiência. Todo mundo tem que assistir! De ontem para hoje, eu já vi duas vezes. A gente precisa que nossos filhos assistam. Estamos falando de algo muito maior do que o esporte paralímpico nele.
Depois que vi a primeira vez fiz uma análise negativista de algumas questões. É inacreditável que no século XXI ainda tem gente que diz que esporte para pessoas com deficiência não é esporte de verdade. Outro dia tive que escutar de uma pessoa que o esporte paralímpico iria ganhar vantagem porque a sociedade está do nosso lado por termos deficiência.
Sinceramente, isso é tudo que não precisamos. Temos lutado para sermos vistos como cidadãos que pagam seus impostos e que contribuem para o desenvolvimento social. Podemos trabalhar, ser esportistas, casar e ter uma vida como qualquer outro indivíduo. Não precisamos que as pessoas nos olhem e tenham pena. Não é nada disso.
Mudar um paradigma é algo que leva anos e mais anos. Afinal, chegaram a acreditar que as pessoas que nascem com algum tipo de deficiência é presságio de maldição. Em alguns lugares, a gente tinha que se esconder porque poderíamos assustar os outros com nossas diferenças. Mas os olhos do mundo têm mudado muito em relação às capacidades e a caminhada das pessoas com deficiência. E precisamos mudar mais.
É importante a gente dizer que a qualquer momento qualquer pessoa pode adquirir uma deficiência. Vale também pensar que uma criança que nasce com deficiência precisa de ter uma família preparada para recebê-la e enxergá-la como um membro da sociedade que pode produzir, ganhar dinheiro, se destacar, ser um funcionário, ser um atleta e, que para isso basta ele se adaptar ao mundo real. Por que o mundo ainda não está adaptado para ele.
Chegar ao meio termo da narrativa e da linguagem tem sido um desafio também. De um lado, temos a abordagem fincada no "coitadismo" ou exacerbada na superação. De outro lado, temos a responsabilidade de falar sobre nós que ainda não temos reconhecimento o suficiente, que ainda lutamos por direitos e que ainda precisamos ter mais voz. Chegar ao meio termo na nossa área é o que temos que alcançar sempre.
A linguagem é importante, porque é ela que vai ajudando o paradigma a se quebrar e a construir uma nova imagem do que nós realmente somos. O filme fala de tudo isso com uma linguagem fantástica. Sem "peninha", sem superação exacerbada. É simplesmente nossas vidas.
Os pais que têm oportunidade deveriam pegar seus filhos e assistirem. Eu tenho certeza que o processo de aprendizado será incrível. Volto a falar não é porque o filme aborda nossas deficiências ou superação. Todo mundo tem alguma deficiência e várias pessoas se superam. O grande lance é de como estamos falando sobre isso. Sem amarras, de alma aberta e sobre como enfrentamos nossos medos, os preconceitos, como queremos ser vistos e como estamos mudando o mundo, entusiasmando o mundo, inspirando o mundo. E como não precisamos para isso sermos dignos de pena. Ninguém precisa.
Esses nove atletas representam não só àqueles que praticam o esporte paralímpico, mas uma porcentagem significativa de pessoas com deficiência no planeta, somos mais de 1 bilhão de pessoas. É óbvio que precisamos ser vistos. Não vamos mais nos esconder.
No documentário a gente aprende sobre refugiados de guerra, sobre quem foi prejudicado por ser judeu, sobre mudança de legislação, sobre não ser valorizado, sobre o impossível que não existe, sobre a luta diária da vida de levantar e cair, sobre a importância de ter um sonho, sobre os ídolos, sobre o quanto a união entre os povos é importante, sobre como somos fortes juntos. São tantos ensinamentos que não tem como não assistir. Esse não é um filme somente sobre atletas com deficiência é sobre o que existe no mundo real e sobre partes da história dele. E as pessoas com deficiência estão nesse mundo. Entende?
Se eu chorei? Chorei sim. Mas não foi por pena. Chorei porque estou vivendo para ver uma revolução acontecer em vários sentidos. A garantia de reintegrar as pessoas com deficiência pelo esporte é algo indescritível. O esporte pode e tirar pessoas "de lugares sombrios", como diz o filme. E isso ocorre na vida das pessoas independente se elas têm ou não algum tipo de deficiência.
O que a gente precisa com urgência é de ter a capacidade para entender que podemos ocupar todos os lugares. E trabalhar pela inclusão e pela acessibilidade é iluminar o mundo. Já está explicito que boa parte da sociedade está preparada para mudar paradigmas como o nosso. E tantas coisas já melhoraram. É cada vez mais nítido que as pessoas querem aceitar as diferenças umas das outras. Não existe mais espaço para não ter espaço.
Estou tão feliz com o filme. Em como ele pode abrir nossas visões. Em como os personagens nos dizem que o esporte paralímpico é um movimento para o bem. Que ninguém pode nos derrubar fácil, porque antes de lutarmos pelo que lutamos agora, nós já passamos por muitas barreiras e uma delas foi escutar várias vezes que tudo seria impossível.
Hoje eu tenho tanto orgulho de fazer parte de um movimento que é muito maior do que o esporte paralímpico. Nossa missão não é só ganhar medalhas é ajudar a mudar o mundo. Assim como vários segmentos têm lutado. Nós temos que transformar o planeta em um lugar melhor para viver.
Uma pessoa com deficiência ilumina um ambiente, ensina coisas importantes para o amigo ao lado, faz com que as necessidades estejam implícitas e dá o recado principal: não precisamos de pena. "Minha deficiência é minha força", é uma das falas do filme. "Todo mundo tem um super poder que é descoberto em algum lugar na vida", mais uma frase do documentário que não saí da minha cabeça. "É só você aceitar a sua situação e descobrir a beleza que ela tem".
Esse filme fala muito além de ganhar medalhas. É sobre a sociedade. Sobre nós. Sobre algo muito maior do que esporte paralímpico. Não deixem de assistir! Alguma coisa vai mudar em você. Tenho certeza!
Excelente quinta-feira e abraços aquáticos para todos!
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