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Diego Garcia

REPORTAGEM

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Empresa que Santos contratou para vídeo polêmico tem histórico em política

Vista geral do estádio Vila Belmiro  - Duda Bairros/AGIF
Vista geral do estádio Vila Belmiro Imagem: Duda Bairros/AGIF

Colunista do UOL

25/05/2021 12h26

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Com Thiago Braga, colaboração para o UOL

A Red Vision, contratada pelo Santos para a criação de um polêmico documentário, foi fornecedora de vídeo para campanhas políticas nas últimas eleições federais e municipais. Atualmente, a empresa executa o clube na Justiça por um contrato de R$ 220 mil.

O acordo tinha como finalidade a produção de um documentário chamado "Santos Futebol Clube - O Tempo Não Para". O contrato foi assinado pelo ex-presidente Orlando Rollo em 17 de novembro, 25 dias antes das eleições presidenciais do clube. A entrada foi paga no dia 10 de dezembro, e o pleito ocorreu dia 12.

Ligação com a política local

A produtora Red Vision pertence a Carlos Stephan e, segundo documentos obtidos em portais de transparência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), prestou serviços a campanhas, pelo menos, de PSB, PSDB e DEM — nas últimas eleições municipais, por exemplo, trabalhou para a campanha de quatro políticos do litoral paulista, sendo três do PSDB e um do DEM.

Entre os clientes da empresa estão o ex-governador Márcio França e o deputado Caio França, que é membro do Comitê de Gestão do clube na época do acordo. Ambos são filiados ao PSB. A produtora recebeu R$ 600 mil por serviços fornecidos ao ex-governador nas eleições de 2018 e R$ 152,3 mil do deputado Caio França por serviços prestados.

Caio França explicou que, justamente por essa ligação com a Red Vision, não participou do processo de contratação para o documentário. "Eu me abstive da votação no Conselho Gestor, pelo fato de já ter contratado o serviço deles anteriormente e, portanto, achei que seria antiético votar nessa questão. Inclusive, deixei bem claro isso na reunião", afirmou. Orlando Rollo, presidente do Santos na época, confirmou a informação.

Entenda o caso Red Vision

O contrato do Santos com a Red Vision fez o clube ser executado na Justiça. A data do pagamento e o valor total do contrato — R$ 220 mil, mais multa de R$ 30 mil — são motivos de contestação no Santos. O time alvinegro não quitou as parcelas após a mudança da diretoria, o que gerou um processo na Justiça.

O juiz Claudio Teixeira Villar já publicou decisão mandando citar o Santos. Assim que for citado, o clube deve quitar a dívida em três dias e arcar com os custos advocatícios de 10%. Se não desembolsar a quantia, pode sofrer penhora de bens. Por outro lado, pode oferecer defesa em até 15 dias.

Em documento ao qual a coluna teve acesso, o departamento jurídico do Santos admite que o material foi entregue, mas questiona sua qualidade, dizendo que o filme foi entregue sem aprovação prévia. Segundo esses documentos, o documentário ficou à disposição para análise por profissionais gabaritados do audiovisual que consideraram que a produção tem indícios de entrega às pressas, com um trecho de lances de gols que dura cinco minutos.

Outro documentário

Além disso, acusa a Red Vision (então com nome fantasia Jubarte Mídia e Entretenimento) de ter sido contratada antes, em 2019, sem produzir o acordado. A produção que não teria sido entregue é o documentário "Santos FC, o DNA do futebol brasileiro". O contrato em questão é de abril de 2019 e previa que o filme custaria ao clube R$ 94 mil.

A informação de que a empresa foi contratada é confirmada por José Eduardo de Abreu Lopes, presidente do Conselho Fiscal e reiterada por documentos do departamento jurídico do clube aos quais a coluna teve acesso e que foram anexados no processo aberto pela Red Vision.

José Carlos Peres, presidente da época, foi procurado para comentar o assunto, mas disse desconhecer o contrato em questão. Orlando Rollo, que assumiu o clube logo depois, afirma não ter participado da gestão Peres, apesar de ser vice-presidente eleito — eles romperam logo no início do mandato.

Segundo fontes ouvidas pela coluna, o dono da Red Vision já teria prestado serviços em campanhas eleitorais envolvendo Orlando Rollo no clube. Questionados sobre isso, nenhum dos dois respondeu.

Pedidos de investigação interna

O assunto é discutido nas demonstrações financeiras do clube. Em auditoria independente, ao qual a coluna teve acesso, o Santos diz que o acordo de 2020 fere o estatuto social do clube em pelo menos cinco artigos. A Comissão de Estatuto teve o mesmo entendimento, segundo consta na documentação. E pede que os contratos sejam analisados pelo departamento jurídico do clube no tocante a suas possíveis nulidades.

Além disso, querem que os documentos sejam objeto de análise e apuração pela Comissão de Inquérito e Sindicância do Conselho Deliberativo.

Em documento enviado ao Conselho, Orlando Rollo diz que a questão com a Red Vision "é mais uma ilação maldosa e irresponsável" da Comissão Fiscal do Santos. E que os valores remanescentes do contrato seriam pagos dentro da previsibilidade de fluxo de caixa e de acordo com o orçamento aprovado pelo Conselho Fiscal.

O ex-presidente ainda afirmou existir um "gabinete do ódio" dentro do Santos, com vazamentos sistemáticos de informações à imprensa. Ele cita nome de conselheiros e diz que pertencem ao grupo político situacionista, atuando livremente.