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Membros da quadrilha acumulam processos por festas sexuais, ameaça e calote
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Os membros da quadrilha responsável por comandar a máfia de apostas no futebol brasileiro possuem diversas passagens pelo sistema judiciário brasileiro. Um deles, Romário Hugo dos Santos, conhecido como Romarinho, é réu em processo por desordem durante a pandemia de Covid-19 por promover festas com bebedeiras, gritos de cunho sexual e ameaças aos vizinhos. Outros têm processo por dívida em universidades e até uma transação ilegal de venda de iPhone.
Festas com gemidão na pandemia
No início de 2020, Romarinho se mudou para um condomínio de casas no bairro de Vila Invernada, São Paulo, e trouxe o caos ao local, segundo relatos de diversos moradores. Foram 3 meses de estadia antes de ser expulso. Entre abril e julho, no auge do isolamento social, promoveu festas, que prejudicaram a paz do local e tumultuaram a vida dos vizinhos.
O condomínio de 12 casas não possui portaria ou segurança 24 horas. Com isso, Romarinho aproveitou a brecha para burlar as restrições sanitárias e promoveu festas, especialmente entre 22h e 7h, em dias úteis e finais de semana.
"As festas eram regadas a bebidas, som alto, gritarias, gemidos de atos sexuais, palavras de baixo calão e aglomeração de pessoas", disseram os vizinhos, em petição enviada em julho de 2020 à Justiça.
O documento diz que, antes da chegada de Romário, o local tinha ambiente familiar, com todos confraternizando de forma harmônica e respeitosa. Segundo os moradores, Romarinho ameaçava quem ia até o local reclamar do barulho. Eles anexaram vídeos ao processo, reiterando que estavam em meio a uma pandemia.
"Pelo fato de as casas do condomínio serem lado a lado e frente a frente, todos os moradores escutavam claramente o desregramento e libertinagem que acontecia nas festas do sr. Romário, locatário da casa nº 9", destacaram os vizinhos.
Eles acrescentaram que Romarinho - chamado de "perturbador contumaz" pelos moradores - se recusou a cessar as "balbúrdias", como chamaram. Os vizinhos, que estavam em home office pela crise sanitária, disseram que ele não respeitava nem as crianças.
"Essas festas, frise-se, 'bagunças', vem impossibilitando os moradores de descansarem e terem a paz em seus próprios lares, e, ainda, expondo toda sua prole a situações extremamente vexatórias praticadas pelo locatário".
Em 20 dias no local, Romarinho colecionou 3 boletins de ocorrência, todos com natureza de "perturbação de sossego público". Dois deles foram por volta de 3h da madrugada, e o outro às 13h54 de um domingo. Ainda foram registrados pelo menos outros 3 boletins de ocorrência nas semanas seguintes, por "algazarras, bebedeiras, palavras de baixo calão, gemidos altos e ameaças aos moradores". Um inquérito policial também foi aberto.
O administrador do local disse à Justiça que Romário o ameaçou, dizendo "que iria me bater e me arrebentar", tudo isso na frente de seus dois filhos pequenos. Em outra ocasião, tentou agredir um morador de uma casa ao lado. Em outro episódio, com a chegada da polícia, Romarinho simplesmente se ausentou no meio da ocorrência, tendo que ser buscado dentro de casa e conduzido para retornar à delegacia.
Mesmo assim, as festas não pararam. "Continuaram cada vez mais tumultuadas e barulhentas, com mulheres entrando e saindo da casa, motos e carros buzinando na entrada, gritaria e gemidos escandalosos", segundo os vizinhos. Após inúmeras tentativas, em vão, de interromper as festas, eles acionaram a Justiça contra Romarinho e os donos do local, pedindo pela expulsão do locatário e ainda aplicações de multas e danos morais que chegam a R$ 120 mil.
Mesmo após quase 3 anos do processo, Romarinho ainda não foi encontrado pela Justiça para responder. Já os donos do imóvel se defendem dizendo que não era tão simples expulsá-lo do local, ainda mais em meio a uma pandemia. Eles entraram em acordo abrindo mão de mais de R$ 100 mil que teriam direito a receber pelos aluguéis restantes e isentando Romarinho da multa contratual pela saída antecipada, apenas para que ele saísse do local o quanto antes. Ele desocupou a casa em julho.
A Justiça não encontrou Romário e determinou a expedição de ofício à CBF, após ser informada pelo condomínio de que ele seria jogador de futebol profissional, com passagem pela Ponte Preta, que foi procurada pelos moradores e não respondeu.
Romarinho também chegou a atuar na base do Palmeiras, sendo marcado, inclusive, por atos de indisciplina. Em entrevista à ESPN, em 2016, ele confessou que o excesso de festas o atrapalhou. "Da minha parte, faltou foco e maturidade", afirmou. Segundo a Globo, ele ficou no clube alviverde de 2009 a 2013.
Depois, também passou por Atibaia, Atlético Sorocaba, Ypiranga, Passo Fundo, Guaratinguetá e Ponte Preta, seu último registro como profissional, em 2019. Em entrevista ao GE.com, César Maluco, ídolo do Palmeiras, lembrou da passagem do ex-atleta pela base do clube, dizendo que chamava sua atenção por indisciplina, inclusive aplicando multas.
Sem conseguir localizar Romário, ou encontrar bens em seu nome para penhora, os moradores do condomínio pediram que ele seja julgado à revelia. A Justiça, porém, ainda busca seu paradeiro. O último mandado de citação foi expedido no mês passado.
Como ele não apresentou defesa nos processos, a reportagem não localizou contatos para ouvir sua versão dos fatos. A defesa dele no caso das apostas também foi procurada. A reportagem será atualizada assim que tiver uma resposta, caso queiram se manifestar.
Quem é Romarinho
Romarinho é um dos cabeças do esquema de manipulação de resultados que atingiu o futebol brasileiro. Segundo o Ministério Público de Goiás, ele é um "integrante com atuação relevante na organização criminosa, principalmente no financiamento do grupo e também viabilizando as promessas e entregas de valores espúrios aos atletas".
Ou seja: era ele um dos principais intermediários para pagar os valores empregados nas corrupções e manipulações dos eventos esportivos. Ele foi preso no início do mês, e dezenas de atletas do futebol brasileiro são citados na investigação do MP-GO. Até o momento, 16 pessoas viraram réus e respondem pelos crimes.
Em uma das mensagens, Romarinho diz a Bruno Lopez, considerado o chefe da quadrilha: "Você tem os jogadores. Vem com nós (sic) que eu banco a operação", afirmou. O MP diz também que ele aliciava os jogadores em prol do grupo criminoso, além de efetuar cobranças e intimidar fazendo menção a uso de arma de fogo aos atletas que não cumprirem o prometido.
Foi ele, por exemplo, que manteve conversas com Gabriel Tota, do Juventude, para negociar a corrupção esportiva, encaminhando comprovante de pagamento e tratando também com Paulo Miranda, outro do Juventude, sobre a manipulação de um cartão amarelo. Em outra conversa, ele fala em matar o jogador do Santos, Eduardo Bauermann, que não cumpriu o acordo com o grupo.
Calotes, sumiços e venda ilegal de iPhone
Outros membros da quadrilha das apostas também foram levados à Justiça por problemas comportamentais. Ícaro dos Santos, por exemplo, foi processado por duas faculdades da região do ABC, em São Paulo, por não pagar as mensalidades dos cursos de administração e relações públicas.
Em nenhuma das duas ações, porém, ele foi encontrado para responder e pagar as dívidas, que somavam mais de R$ 20 mil até 2019. Assim como ocorreu em outros processos de membros da quadrilha, a Justiça tentou bloquear suas contas bancárias ou achar bens em seu nome, em vão.
Na máfia das apostas, Ícaro é tratado como parte da organização criminosa e participou, por exemplo, da manipulação do resultado de diversos jogos manipulados no esquema.
Pedro Gama, também réu no processo das apostas, possui dois processos na Justiça de São Paulo. Em um deles, a Associação dos Proprietários de Lotes do Loteamento Condomínio Novo Horizonte cobra R$ 50 mil em taxas de condomínio não pagas, entre dezembro de 2020 e outubro de 2022. Em outro, uma cooperativa de crédito cobrou R$ 22 mil em valores atrasados. Ele fez acordo no ano passado.
Pedro aparece com participação na promessa de pagamento de R$ 100 mil a Victor Ramos, seu amigo pessoal, de acordo com o Ministério Público de Goiás. para fraudar o jogo entre Guarani e Portuguesa. Segundo o MP-GO, ele intermediou os contatos entre o jogador e Bruno Lopez, chefe da quadrilha de apostas.
Já Thiago Chambó foi condenado em 2021 por ter recebido dinheiro de uma loja de roupas para prestar serviços de marketing, com a promessa de, utilizando a imagem do ex-BBB Felipe Prior, aumentar o número de seguidores da empresa nas redes sociais, mas não cumpriu o combinado e sequer apresentou contestação no processo.
Chambó é colocado no processo como parte do grupo de financiadores do esquema. O MP o chama de "figura proeminente no esquema delitivo", aparecendo em discussões sobre negociações com atletas para assegurar a ocorrência de eventos determinados nos jogos, os modos de cobrança aos envolvidos e valores a serem pagos em troca da corrupção.
A defesa de Chambó, feita pelo advogado William Albuquerque de Sousa Faria, enviou uma nota à coluna "lamentando a devassa feita na vida do seu cliente e reafirma que esclarecerá todos os pontos da acusação do Ministério Público. O criminalista ainda garante que seu cliente nunca fez parte de qualquer organização criminosa que envolva esquema de corrupção envolvendo manipulação de resultados no futebol. Ressalte-se que não há qualquer denúncia formal sobre Thiago Chambó dar ou prometer vantagem com o fim de alterar ou falsear o resultado de uma competição esportiva porque inexistem indícios de qualquer ilegalidade".
William Souza, conhecido como McLaren, por sua vez, foi acionado por vender um celular, um iPhone 8, que posteriormente foi descoberto como parte de um lote fraudado. O aparelho, então, teve que ser devolvido ao verdadeiro dono por algum motivo anterior à sua compra, por ordem da Polícia Civil. Na Justiça, ele fez um acordo para devolver os valores pagos pelo comprador.
McLaren foi identificado pelo MP-GO como parte do núcleo de financiadores da quadrilha de apostas, tendo fornecido, por exemplo, diversas contas para utilização no esquema de resultados manipulados, com ampla ciência das corrupções perpetradas.
A coluna não encontrou contatos da defesa dos citados para comentarem as informações. A reportagem será atualizada caso queiram se manifestar.
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