Em testamento, Zagallo pediu amizade dos filhos, hoje em guerra por herança
Mario Jorge Lobo Zagallo tinha um desejo: que existisse amizade e união entre seus filhos, mesmo quando ele não estivesse mais aqui. Passado quase 1 ano da morte do "Velho Lobo", a situação é bem diferente do que desejava em vida o ex-técnico da seleção.
Ao menos, essa foi a vontade expressa por Zagallo em seu primeiro testamento, registrado no Cartório do 11º Ofício de Notas da Capital, no Rio de Janeiro, e ao qual a coluna teve acesso.
"(Zagallo) Aconselha que seus 4 filhos se mantenham sempre unidos, amigos uns dos outros, conforme foram seus pais, e permaneçam assim pelo resto da vida, sem desentendimentos ou indisposições por motivos fúteis e, principalmente, por questões de bens", expressou o tricampeão do mundo no documento, datado de 1984.
Mais de 40 anos depois, Zagallo assinou um novo testamento, em 2016, mesmo ano em que perdeu a esposa e mãe de seus filhos. Na ocasião, a relação entre os herdeiros já havia ruído, segundo fontes próximas à família ouvidas pela coluna. Dinheiro, problemas familiares individuais e a herança do pai, um dos maiores nomes da história do futebol brasileiro, foram as causas. Justamente o contrário do que queria o Velho Lobo.
Ainda no primeiro testamento, ele pediu que seus sucessores "se abstenham de dar fiança ou aval em benefício de terceiros, assumir encargos que pudessem prejudicar o acervo patrimonial da família ou de cada um, evitando desta forma o surgimento de ingratidões, decepções e inimizades".
Essas foram justamente as causas das brigas entre os filhos, segundo constam em informações em um processo do inventário do Velho Lobo, que corre em segredo de Justiça no Rio de Janeiro. Três irmãos — Maria Emília, Maria Cristina e Paulo Jorge — acusam o caçula, Mario Cesar, de comportamento controverso que gerou rusga entre toda a família.
Eles dizem que o irmão mais novo passou a dificultar o acesso dos irmãos ao pai, tendo excluído os três de qualquer acesso ao condomínio do Velho Lobo. Para Maria Emília, Maria Cristina e Paulo Jorge, o caçula se valeu de mecanismos escusos e moralmente reprováveis para os distanciar do ex-técnico da seleção, manipulando-o para escrever um novo testamento que resguardava o caçula por completo.
Trechos como "(Zagallo) declara que essa escritura é feita sem qualquer tipo de constrangimento ou coação, de plena consciência e com o intuito de evitar futuros transtornos para seu filho (Mario Cesar)", "questão de absoluta confiança", "e por ter confiança absoluta no seu filho (Mario Cesar), e somente nele" e "que este filho é seu braço direito e merece sua total confiança" foram destacados pelos irmãos para comprovar que o caçula realizou uma manobra para evitar futuras contestações.
Para eles, existiu fraude na escritura do novo testamento, com a inclusão de uma blindagem ao filho inventariante, fugindo totalmente à praxe jurídica. No testamento, ainda é dito que Mario Cesar poderia movimentar todas as contas bancárias e de investimentos de Zagallo, sendo que todas as operações seriam "de seu conhecimento e principalmente a seu mando, que seu filho sempre lhe presta contas e lhe mantém informado, sendo todas as retiradas para seu exclusivo proveito, seja para manutenção do lar".
O trio diz que tudo isso foi feito com o intuito de dilapidar por completo o patrimônio do Velho Lobo, ainda enquanto ele estava vivo.
Isso começou, em um primeiro momento, com duas doações, em espécie, de R$ 5 milhões ao filho caçula, no mesmo ano da assinatura do novo testamento. Depois, com a alienação de todo o patrimônio imobiliário do pai, quando este já estava com 90 anos de idade, em 2021.
De acordo com os 3 irmãos, o mais novo vendeu 1 casa na serra da Granja Comary, um apartamento de frente ao mar no condomínio Atlântico Sul e um apartamento no condomínio Blue. E questionam: "para onde foi o montante colhido com a venda dos referidos imóveis de altíssimo padrão?"
Ainda acusam Mario Cesar de utilizar recursos financeiros do pai para adquirir bens a uma funcionária, que o acusou de estupro. Segundo os irmãos, ele usou o dinheiro do pai para "financiar a aquisição de um apartamento e veículos para a mulher, numa espécie de acordo, o que evidencia um comportamento abusivo, indicando desvio patrimonial, abuso de confiança e gestão fraudulenta, afetando diretamente o valor da herança".
O novo testamento dividiu o que restou do patrimônio em 62,5% para Mario Cesar, e o restante a ser dividido entre os três irmãos. Porém, o caçula alega que o pai deixou dívidas. Entre elas, três ações sofridas por cuidadoras — nas quais, inclusive, ele já fez acordo em duas delas para o pagamento de R$ 290 mil.
A coluna procurou os 4 irmãos para comentarem as alegações que constam na reportagem e no processo de inventário. Nenhum deles respondeu. A reportagem será atualizada caso queiram se manifestar.
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