Topo

Fábio Seixas

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Pílulas do dia seguinte

O inglês Lewis Hamilton, que alcançou no Bahrein sua 96ª vitória na Fórmula 1 - Clive Mason/Getty Images
O inglês Lewis Hamilton, que alcançou no Bahrein sua 96ª vitória na Fórmula 1 Imagem: Clive Mason/Getty Images

Colunista do UOL

29/03/2021 10h23

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Começando pelo momento decisivo da corrida. Volta 51. Sob pressão, Hamilton trava as rodas na sequência de curvas 9 e 10 e definitivamente abre caminho para o ataque de Verstappen. Volta 52. Hamilton está na pequena reta que leva à curva 4 e tem à frente um retardatário, Giovinazzi. O italiano desacelera e coloca o carro à direita, saindo da trajetória dos duelistas. Hamilton fica no meio. A Verstappen, só resta tentar passar por fora. Os dois chegam à curva lado a lado. Embalado como uma vaca louca, por fora e sem espaço, o holandês espalha, coloca as quatro rodas na área de escape e sai da curva na liderança da corrida. Por pouco tempo. Logo recebe instruções pelo rádio para devolver a posição, o que faz imediatamente. O GP do Bahrein estava decidido. Alguns pontos a considerar...

Reforço o que escrevi ontem, ainda no calor da corrida: a Red Bull não precisava ter passado por tanto sofrimento. Verstappen liderou todos os treinos do fim de semana, cravou a pole e tinha um carro mais rápido do que a Mercedes com alguma folga. Mas sete temporadas de domínio dos alemães devem ter mexido com seu ego coletivo, com sua confiança. E ontem o time quis ir à forra. Menosprezou o ritmo ruim de Verstappen com os pneus médios usados ao fim do primeiro stint e acreditou que ele voltaria à ponta assim que pusesse os médios novos, enfrentando um Hamilton e seus pneus duros já com 4 voltas de uso. Era muito cedo para tanta soberba;

verstappen blog - Andy Hone/Getty Images - Andy Hone/Getty Images
Hamilton e Verstappen na entrevista pós-corrida
Imagem: Andy Hone/Getty Images

Ainda sobre os pneus, outro erro primário da Red Bull: deixou Verstappan com apenas um jogo de pneus duros novos para a corrida, contra dois de Hamilton e Bottas. Vale lembrar que os pneus macios nunca foram exatamente uma opção para o fim de semana, dada a alta abrasividade do asfalto barenita. E aí, amigos, quando não é pra dar certo, não dá mesmo. Sem outra opção, Verstappen colocou pneus médios no primeiro pit e viu seu desempenho cair. Segundo a Pirelli, o jogo que ele usou apresentou "uma pequena queda de performance" em comparação com os duros;

Aplausos para Hamilton, que soube administrar com maestria o desgaste dos pneus. Seu último pit foi na 28ª volta. Verstappen parou na 39ª. Mesmo com pneus 11 voltas mais velhos e com um carro mais lento, o inglês não se desesperou: foi até o fim num ritmo constante e se defendeu dos ataques do adversário com lealdade. Que pilotaço;

Por fim, para encerrar o assunto da borracha, vejam que ironia: parte do processo de conservar os pneus só aconteceu porque Hamilton foi alertado pela equipe, na 37ª volta, para não abusar da curva 4. "Aquele aviso me ajudou a prestar mais atenção nos pneus, então sou grato a ele", disse, após a prova;

Falemos então da curva 4. As orientações da direção de prova mudaram ao longo do fim de semana, mas estavam bem claras desde o briefing pré-GP. Os pilotos poderiam colocar as quatro rodas na área de escape daquele setor desde que isso não se transformasse em "vantagem duradoura". Em outras palavras: não poderiam usar aquele trecho para uma ultrapassagem. Verstappen tinha mesmo de devolver a posição;

Entendo, porém, o questionamento da Red Bull. Por voltas e voltas, Hamilton colocou sua Mercedes ali, ganhando obviamente alguns milésimos de segundo. No acumulado, isso não configura "vantagem duradoura"? Não pode definir uma corrida? Claro que sim. Por isso a Mercedes foi avisada, e Hamilton recebeu o alerta já mencionado aqui. Mas até aquele momento, quanto ele ganhou? Precisava a Red Bull ter que se queixar para a FIA tomar uma atitude? Os comissários não estavam observando isso?

Como diz meu pai, "o combinado não sai caro". Um esporte do nível da F-1, com alto grau de tecnicidade, não pode ficar à mercê de interpretações e questões semânticas. Toda regra, toda orientação, precisa ser a mais clara e a mais detalhada possível;

Hamilton chegou ontem a 5.126 voltas na liderança de GPs na F-1, superando o recorde anterior, de Schumacher: 5.111. Um fosso separa os dois dos pilotos que vêm na sequência: Vettel (3.495), Senna (2.987) e Prost (2.684);

Queria ter visto mais de Alonso, que abandonou na 33ª volta. O espanhol vinha fazendo um fim de semana excelente, e aquela muvuca com Vettel, Sainz, Raikkonen e Tsuonoda estava divertida. Chamou minha atenção também a nova postura do espanhol, humilde, dizendo que precisará de "3 ou 4 corridas" para se adaptar à nova F-1. Quem te viu, quem te vê...

perez blog - Bryn Lennon/Getty Images - Bryn Lennon/Getty Images
Pérez, que deu show no Bahrein
Imagem: Bryn Lennon/Getty Images

E o Pérez? O carro apagou na volta de apresentação, ele largou do pit lane, fez um pit stop precoce e terminou em quinto lugar. Só se consegue isso dando um show de pilotagem. Continuo curiosíssimo para ver como a Red Bull vai lidar quando seus dois pilotos começarem a se estranhar. Porque vai acontecer;

O outro destaque da prova foi um novato: Tsunoda, primeiro japonês a pontuar na corrida de estreia na F-1. Largando em 13º, terminou em 9º. Mas o que mais impressionou foi sua confiança e sua assertividade em duelos contra pilotos muito mais experientes. Ao longo do GP, ele enfrentou e ultrapassou três campeões mundiais: Raikkonen, Vettel e Alonso. Quer mais?

Na F-2, um fim de semana muito ruim para os pilotos brasileiros. Após três corridas, apenas Drugovich pontuou, com o nono lugar na prova de domingo. Todos precisam melhorar já a partir da segunda rodada. Terão tempo para refletir: a próxima rodada será só em Mônaco, no fim de maio.