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Pílulas do Dia Seguinte: Sainz e o detalhe que pode ter mudado o rumo da F1
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Há momentos que definem as nossas vidas. Às vezes são detalhes alheios às nossas vontades, que independem de nossas ações. Você está fazendo tudo certo, mas surge algo e, tcham, muda tudo. Joga pra cima ou pra baixo. Transforma seu destino. A F1 é cheia de histórias assim. E acho que assistimos a mais uma no fim de semana, em Melbourne;
Em 1977, Hunt abriu mão da vitória no GP da França, que poderia colocá-lo em ótima posição para defender seu título, porque estava sofrendo no cockpit com dores de barriga. O motivo: comera muito escargot na noite anterior. A Brawn fez um carro revolucionário em 2009, mas Barrichello tinha dificuldades com os discos de freios. Seu companheiro, Button, não: venceu seis das sete primeiras corridas do ano e foi campeão daquela temporada. Não faltam causos como esses no esporte, não só nas pistas. Sainz que o diga...;
No futuro pouca gente vai lembrar que o espanhol liderou o primeiro treino em Melbourne e que ficou à frente de Leclerc no Q2. Depois de ratear em Jeddah, o espanhol estava no jogo, ciente da importância de não deixar o companheiro desgarrar. Aí veio o Q3. O plano era fazer duas saídas, com a mesma receita: aquecer os pneus por uma volta e então partir para marcar tempo. Mas o volante apresentou um pequeno problema elétrico, que os ingleses definem tão bem como "gremlin". Isso retardou a primeira saída. Quando foi pra pista, Sainz fez bem o trabalho. Na volta lançada estava 0s144 mais rápido que Leclerc, o pole provisório, ao fim do segundo setor. Tudo estava lindo. O espanhol apontou na reta para fechar a volta. Mas quando faltavam menos de dez metros, veio uma bandeira vermelha. E seu mundo caiu;
Alonso, seu compatriota, sofreu um problema hidráulico e bateu. A volta de Sainz foi anulada. Tentando manter o foco, voltou para os boxes. Teria mais uma chance, haveria mais uma saída. Ou não. Porque o "gremlin" voltou a aparecer, segurando-o por tempo demais nos boxes. Quando foi pra pista, não havia tempo para volta de aquecimento. Ficou apenas em nono. O potencial estava ali. O tempo do Q2 seria suficiente para colocá-lo em quarto no grid;
E veio a corrida. Sainz alinhou em nono, mas o "gremlin" ressurgiu. Correria. A Ferrari trocou seu volante quando faltava apenas 1 minuto para a volta de apresentação. "Este segundo volante não estava preparado para configurações de largada, o mapa do motor estava errado e meu carro soluçou nas duas largadas", explicou o espanhol. Resultado: caiu para 14º na primeira volta e, na segunda, rodou, atolou e abandonou. Dos boxes, viu Leclerc fazer uma prova perfeita e chegar aos 71 pontos no Mundial. Ele está empacado nos 33;
Alguma dúvida de quem será o homem da Ferrari na luta pelo Mundial? Ok, ok, Leclerc sempre foi o queridinho de Maranello. Mas no ano passado, em seu primeiro ano por lá, Sainz ficou à frente no campeonato. Tinha razões para sonhar. Não mais. E tudo por um "gremlin" elétrico;
Horner cutucou a Mercedes ao analisar a própria desgraça, o segundo abandono de Verstappen em três corridas. "Prefiro consertar um carro rápido do que ter um carro confiável, mas lento", afirmou. Bom, o Mundial de Construtores, até agora, diz outra coisa. A equipe alemã segue na frente da Red Bul na pontuação: 65 a 55;
Mas o que afinal houve com Verstappen? Ainda não está claro. "Foi um problema no sistema de combustível, fora do tanque. Podíamos ver pela telemetria que algo estava errado, e Max começou a sentir um cheiro. Foi algo totalmente diferente", explicou Horner, referindo-se ao problema na bomba que deixou seus pilotos a pé no Bahrein. O que se sabe é que não foi exatamente inesperado. A equipe estava preocupada com a possibilidade de um problema hidráulico na prova, tanto é que entupiu seus sistemas com fluidos;
Verstappen reagiu com dureza a mais um abandono. Disse que o problema é "inaceitável" e que "no momento não há motivo para acreditar" em defesa do seu título. Essa será outra história interessante de acompanhar na temporada: como o holandês vai se comportar no seu novo papel. Até o ano passado, ele era o garoto promissor e ousado lutando contra tudo e contra todos em busca do título. Hoje ele é o campeão, o alvo, o homem a ser batido;
Há mais um componente: bem no ano em que a Mercedes erra a mão no carro, surge uma Ferrari voadora e confiável para tirar seu sossego... Nos três primeiros GPs do ano, isso se traduziu em mensagens malcriadas pelo rádio sempre que enfrentou dificuldade. Como vai ser daqui pra frente? Verstappen vai jogar com a equipe ou contra ela? Tenho essa curiosidade;
Wolff saiu de Melbourne dizendo estar "muito otimista" com as perspectivas da Mercedes. "Ver Lewis e George pilotando em alto nível, embora não tenham um carro que ande no ritmo dos líderes, é um bom exemplo do espírito desta equipe. Sair daqui com P3 e P4 nos traz um sentimento muito bom", disse, olhando o copo meio cheio;
Mas há também o copo meio vazio. O ritmo da Mercedes ainda não é páreo para os de Ferrari e Red Bull. Nem de longe. Durante vários momentos da prova, Leclerc era 1 segundo por volta mais rápido do que Hamilton. Assim como no Bahrein, o pódio na Austrália tem um quê de ilusão: veio mais por problemas de terceiros do que por méritos próprios. Ainda há muito trabalho pela frente para a turma de Brackley;
Leclerc foi apenas o 26º piloto da história a conseguir um grand chelem: pole, melhor volta, liderança de ponta a ponta e vitória. A turma é seleta. O recordista é Clark: conseguiu o feito oito vezes, entre 1962 e 1965. Deve ser um dos recordes mais antigos da F1. Depois vem Hamilton, com seis, seguido por Schumacher e Ascari, com cinco. Senna conseguiu quatro. Piquet, três. Muitos campeões mundiais, como Emerson, nunca tiveram um fim de semana perfeito. Isso dá a dimensão do feito do monegasco em Melbourne;
Há outras estatísticas interessantes. Foi o primeiro grand chelem da Ferrari desde Alonso no GP de Singapura de 2010. Desde 2011, todo piloto que emplacou um grand chelem foi campeão ao fim do ano. E os 20s524 de Leclerc sobre Pérez na linha de chegada é a maior vantagem de vitória de um piloto da Ferrari desde os 35s629 de Schumacher para Montoya no GP da Espanha de 2002. O alemão conquistou aquele Mundial com seis etapas de antecedência. Tudo isso deve indicar alguma coisa.
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