Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Para presidente da FIA, piloto bom é piloto calado
![Mohammed Ben Sulayem (à dir.) com o príncipe Albert no fim de semana do GP de Mônaco - Twittter/Mohammed Ben Sulayem](https://conteudo.imguol.com.br/c/esporte/be/2022/06/08/mohammed-ben-sulayem-a-dir-com-o-principe-albert-no-fim-de-semana-do-gp-de-monaco-1654711568382_v2_900x506.jpg)
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Agnes Carlier é uma veterana das salas de imprensa da F1, uma das jornalistas mais respeitadas do paddock, daquelas que sabem fazer um entrevistado falar. Ela entrevistou o novo presidente da FIA. E Mohammed Ben Sulayem revelou uma incômoda faceta autoritária.
Há seis meses no cargo, o emirático tem uma lista extensa de tarefas a cumprir. Entre suas promessas de campanha, prometeu levar o esporte a motor a países emergentes e em desenvolvimento. Precisa acertar a situação financeira da entidade, que descreveu como "fraca". No lado da mobilidade, há muitos nós a desatar para a expansão da eletrificação. E, na joia da coroa, a F1, ainda há muito trabalho a fazer após as lambanças do último Mundial.
Mas ele está preocupado com o que os pilotos pensam e falam, especialmente sobre direitos humanos. Eleito com um discurso de modernidade, mostra uma mentalidade do século passado. Para Sulayem, pilotos não deveriam ir muito além de temas como pneus e aerofólios.
"Lauda e Prost só pensavam em pilotar. Agora, Vettel pedala uma bicicleta com as cores do arco-íris, Lewis é apaixonado por direitos humanos e Norris fala de saúde mental. Todos têm direito a pensar. Mas, para mim, é uma questão de decidir se vamos ficar o tempo todo ofuscando o esporte com nossas crenças", disse, na entrevista que está no site GrandPrix247.
"Minha cultura é árabe. Sou muçulmano. Eu tento impor minhas crenças para os outros? Não! Nunca! Olhe para nossa operação nos Emirados Árabes. Temos gente de 16 nacionalidades. Mais de 34% são mulheres e há seguidores de sete religiões. Há mais cristãos do que muçulmanos. Mostre-me uma federação com tanta diversidade! Mas eu fico expondo minhas crenças? Não. As regras estão lá. Agora, por exemplo, há uma questão sobre o uso de joias. Eu não escrevi essa regra", afirmou o dirigente.
O parágrafo acima é o equivalente à frase "mas eu tenho até amigos que são gays", comumente tirada da manga por quem comete alguma ofensa homofóbica. Sulayem usa a diversidade da FIA _nada mais que a obrigação, diga-se_ para justificar a besteira anterior.
Mas o ponto central é outro: a confusão entre levantar bandeiras e "impor crenças".
Até onde sei, Vettel não força ninguém a defender a causa LGBTQIA+, Hamilton não amarrou ninguém numa cadeira para ouvir seus discursos sobre diversidade, Norris não provoca problemas ao falar sobre a óbvia necessidade de as pessoas cuidarem da saúde mental.
(Aliás, esta é inédita pra mim: alguém se opor à defesa da saúde mental...)
Por que uma bicicleta ou um tênis ou um capacete com as cores do arco-íris incomoda tanto? O esporte não deveria ser uma plataforma para tornar o mundo melhor, mais igualitário? A razão final do esporte não deveria ser a saúde? E a saúde mental não entra nessa?
Todas as respostas confluem para a mesma conclusão. O novo presidente da FIA não quer que as estrelas do esporte falem. Para ele, devem apenas pilotar e ponto final.
Ex-piloto de rali, ex-membro do Conselho Mundial da FIA, ex-vice-presidente de mobilidade da entidade, Sulayem estudou nos EUA e na Europa e carrega o título de Doutor em Ciência pela Universidade de Ulster, na Irlanda do Norte.
Era de se esperar que fosse mais iluminado...
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