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Fábio Seixas

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Homenagem a Hamilton vira uma página: já podemos torcer pelos outros na F1

Lewis Hamilton recebe título de cidadão honorário do Brasil na Câmara dos Deputados, em Brasília - 7.nov.2022 - Adriano Machado/Reuters
Lewis Hamilton recebe título de cidadão honorário do Brasil na Câmara dos Deputados, em Brasília Imagem: 7.nov.2022 - Adriano Machado/Reuters

Colunista do UOL

08/11/2022 06h43

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Para além de toda a pataquada política envolvida, a entrega do título de cidadão honorário do Brasil a Hamilton, ontem, na Câmara dos Deputados, traz significados e reflexões para o esporte.

O mais importante talvez seja uma virada de página definitiva, a última ficha caindo: o Brasil finalmente prescinde de um ídolo nacional na F1. Já podemos torcer pelos outros, admirar talentos de outras nacionalidades, aplaudir vitórias de outras bandeiras. Não é mais pecado.

Cinquenta anos depois do primeiro GP em Interlagos, deixamos de ser absolutamente pachecos nas pistas.

E isso é bom, inclusive para quem é pacheco.

Um dia, algum jovem brasileiro há de chegar à F1, claro. E algo me diz que terá vida mais tranquila do que seus antecessores. Não haverá aquela cobrança cruel, aquela obrigação de seguir os passos dos campeões, de vencer logo de cara. Há hoje uma maturidade no ar. Tudo bem ser quinto, sexto, segundo...

Assim é mais fácil dar certo.

Tem a ver com o fato de a nova geração nunca ter visto Emerson, Piquet e Senna e, portanto, não inferir por tabela que somos um país de gênios do automobilismo.

Tem mais a ver com a globalização dos ídolos. Hoje, a molecada quer camisas do Arsenal, do Manchester City, do PSG e do Real Madrid, vibra com os gols de Haaland, joga FIFA com esquadrões supranacionais... O que importa é ser bom. A nacionalidade é um detalhe.

Essa mesma molecada e também a geração Z, dos nascidos em meados dos anos 90, assistiram às quatro temporadas de "Drive To Survive". Aprenderam a gostar de Ricciardo, Norris, Leclerc, Russell. Abraçaram até um dirigente, o caricato Steiner, da Haas. Apaixonaram-se pela F1 sem nunca verem um brasileiro disputando um campeonato. Para eles, tanto faz.

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Plenário da Câmara dos Deputados lotado durante homenagem a Lewis Hamilton
Imagem: Gabriela Vinhal/UOL

A homenagem a Hamilton é também um sinal de que a F1 passou a ser mais apreciada e entendida como esporte que é, com suas qualidades e defeitos, independentemente de quem esteja competindo.

É uma evolução natural. A categoria tinha pouco mais de duas décadas de existência quando correu pela primeira vez no Brasil. Era algo exótico, aqueles carros pareciam naves espaciais. Hoje, todos sabem exatamente do que se trata, a mensagem é espalhada de forma mais eficiente, fãs debatem sobre o teto de custos, efeito-solo e o uso do MGU-K.

Confirma, ainda, uma tecla em que sempre bato. Que me perdoem os fãs de outras modalidades, mas o automobilismo é o segundo esporte do Brasil.

Por fim, mesmo que por vias tortas, a cerimônia na Câmara ajudou a dar visibilidade para os valores defendidos pelo heptacampeão.

Em seu discurso, Hamilton falou de diversidade: "Sou um homem preto num esporte que ainda precisa progredir muito. Estou comprometido a mudar isso. E todas as vezes em que estou no Brasil, quando vejo as pessoas em toda a sua diversidade, lutando pelo que acreditam, isso me leva além".

É bonito saber, comovente até, que ele ainda tem uma visão romântica sobre quem somos...