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Fábio Seixas

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Pelo bem da Fórmula 1, FIA e Liberty precisam acalmar os ânimos e conversar

Mohammed Ben Sulayem, presidente da FIA, e Stefano Domenicali, CEO da F1 - Lars Baron - Formula 1/Formula 1 via Getty Images
Mohammed Ben Sulayem, presidente da FIA, e Stefano Domenicali, CEO da F1 Imagem: Lars Baron - Formula 1/Formula 1 via Getty Images

Colunista do UOL

25/01/2023 09h24

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Era bola cantada e decantada. Aconteceu. A tensão entre FIA e Liberty Media extrapolou os escritórios de uma e de outra e tornou-se pública.

O que eram muxoxos nos corredores e paddocks tornou-se um barraco internacional.

Em uma carta enviada na terça-feira às equipes, a Liberty, que comanda os direitos comerciais da Fórmula 1, repudiou os comentários feitos pelo presidente da FIA na véspera, no Twitter.

Em uma série de três posts, Ben Sulayem reagiu à informação publicada pela Bloomberg de que o fundo soberano da Arábia Saudita teria tentado comprar a F1 no fim do ano passado por US$ 20 bilhões. Segundo a agência de notícias, a Liberty rejeitou a oferta, mas os sauditas seguem interessados no negócio e devem voltar à carga.

"Como guardiões do automobilismo, a FIA, uma entidade sem fins lucrativos, mantém a cautela sobre a alegação de uma etiqueta de preço inflada de US$ 20 bilhões que estaria sendo colocada na F1", afirma o dirigente, no primeiro tweet. "Recomendamos que qualquer potencial comprador use o bom senso, que considere o bem do esporte e que venha com um plano claro e sustentável, não apenas com um monte de dinheiro", diz, no segundo. "É nossa obrigação considerar o impacto de taxas mais caras para os promotores e outros custos comerciais, além de qualquer outra consequência adversa para os fãs", completou o emirático.

A Liberty não gostou de nada, mas irritou-se especialmente com o comentário sobre o valor da F1. Julgou-o depreciativo, prejudicial aos negócios.

Considerou, ainda, que Ben Sulayem cruzou uma fronteira estabelecida em 1995, quando a FIA repassou os direitos comerciais da categoria para a FOM. Este contrato foi estendido na virada do século, com longuíssima duração: só termina daqui a 87 anos, em 2110.

Pelo acordo, a FIA cuida da regulação do esporte. Os donos dos direitos (ao longo desses anos, FOM, SLEC, EM.TV, Kirch Group, bancos, CVC e Liberty) ficam com o lado comercial. Cada um no seu quadrado.

Na carta enviada às equipes, a Liberty argumenta que Ben Sulayem interferiu na sua área.

"A FIA assumiu compromissos inequívocos de que nada fará para prejudicar a propriedade, gestão e/ou exploração dos direitos da F1. Consideramos que os comentários feitos pelo presidente da FIA nas redes sociais interferem com esses direitos de maneira inaceitável".

Quem acompanha o blog não se surpreende. A relação entre os dois lados vem sofrendo tremores sucessivos há meses. Se nada mudasse, o racha aconteceria. Aconteceu.

FIA e Liberty têm visões diferentes sobre muitos assuntos cruciais do esporte: número de etapas no calendário, quantidade de sprint races, gestão do Regulamento Esportivo, divisão de receitas, políticas de inclusão, dinâmica das corridas, eletrificação dos motores, liberdade de expressão dos pilotos, entrada de novas equipes...

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O italiano Stefano Domenicali, que comanda a operação de F1 da Liberty Media
Imagem: Fórmula 1

Escrevi em julho de 2021: "Há um pano de fundo importante: uma questão política, um choque de culturas que deve se acirrar a partir de agora. De um lado, a Liberty, que tenta transformar a F-1 num esporte mais empolgante, com mais disputas, mais próximo do que acontece no automobilismo americano. De outro, a FIA, com seus velhos hábitos e seus livros de regras que seguem a escola europeia de corridas de automóveis. Em algum momento os dois lados vão ter que sentar numa mesa e chegar a um consenso".

O que a Liberty quer dizer ao classificar os tweets da Ben Sulayem como "inaceitáveis"? Vai fazer algo a respeito? Vai judicializar a queda de braço?

E o emirático? O que o moveu a riscar o fósforo? O que ele está vendo no horizonte? É alguma estratégia ligada à sua pressão para colocar novas equipes no grid?

O presidente da FIA, é bom lembrar, é aliado de Ecclestone, a mais astuta raposa que o esporte a motor já viu.

O momento de sentar numa mesa e conversar chegou.

Que toda a louça seja lavada antes do início do Mundial, pelo bem do esporte.