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Pílulas do Dia Seguinte: Pilotos são paranoicos, e Jeddah comprovou isso
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Atletas de ponta têm um traço em comum. São paranoicos, todos eles. Paranoicos de babar. São obsessivos por performance. Querem sempre o melhor, o que é obvio: se não fosse assim, não teriam chegado aonde chegaram. Desde a mais tenra idade estão acostumados a destruir adversários, a passar por cima de obstáculos, a ignorar a compaixão. Balizam suas vidas por ciclos olímpicos, por Copas, por campeonatos mundiais. Cobram-se o tempo todo, abrem disputas internas contra si mesmos. Não há nada que odeiem mais do que ficar em segundo;
Por um capricho matemático, as voltas finais do GP da Arábia Saudita foram uma aula sobre essa psiquê esportiva. Pérez em primeiro e Verstappen em segundo significava Mundial de Pilotos empatado: ambos com 43 pontos. Mas havia o ponto extra. Quem cravasse a melhor volta, seria o líder isolado do campeonato. Até a 49ª das 50 voltas, o bônus estava com o mexicano. Na última, o holandês acelerou como um louco. Tomou-lhe o ponto e a ponta;
O resultado é que numa dobradinha, numa corrida que foi apenas a segunda etapa do mais longo campeonato da história, nenhum dos dois pilotos da Red Bull estava plenamente feliz no pódio. Pérez venceu a corrida de Jeddah, mas ficou em segundo na tabela. Verstappen assegurou a liderança do Mundial, mas foi o segundo na corrida...
Os diálogos durante e depois da prova ajudam a ilustrar esse quadro de obsessão. "Qual tempo o Max está fazendo?", perguntou Pérez, no fim da prova, quando a diferença entre ambos estava na casa dos 4 segundos. "32.6", respondeu seu engenheiro. "Então por que você está me pedindo para fazer 33.0?" Depois de uma pausa e de voltar a pisar mais forte, o mexicano voltou ao rádio e abriu o coração. "Estamos acelerando sem motivo!", protestou;
Sim, a corrida estava ganha para a Red Bull. Havia uma eternidade de 15 segundos entre Verstappen e Alonso, o terceiro. Seria a clássica situação de "tragam os carros para casa em segurança". Mas o holandês queria mais. Não estava satisfeito de largar em 15º e estar em segundo. E Pérez, conhecedor do companheiro, sabia que não podia sossegar. Precisava manter o ritmo forte o tempo todo, mesmo aumentando o risco sobre o equipamento;
Na salinha pré-pódio, o mexicano inquiriu o companheiro: "Não pediram para você manter o ritmo?" No que Verstappen respondeu: "Ah, em 33.0. Sim. Mas daí eu perguntei qual era a melhor volta, e acho que era só um décimo melhor do que estávamos fazendo";
Marko resumiu bem a situação: "Incontrolável. Max é assim. Ambos estavam constantemente perguntando sobre a melhor volta, e Max esperou até a última que Pérez não pudesse reagir";
São paranoicos, todos eles;
Mais uma vez a FIA se enrolou ao aplicar uma punição. O rolo com Alonso após o GP expôs uma enorme falha de comunicação e uma dificuldade linguística;
A primeira: Alonso cumpriu sua punição inicial de 5 segundos na 18ª volta da corrida. Os comissários locais, Bernoldi entre eles, nada notaram de estranho no procedimento da Aston Martin. Quem notou foi o Remote Operations Centre, o "VAR da FIA", em Genebra. Um mecânico tocou o carro com o macaco. A questão é: por que tanta demora na comunicação? Por que levaram tanto tempo para avisar os comissários? Como não resolveram isso antes do pódio? O interurbano não completava? O e-mail caiu? Ninguém olhava o whatsapp?
A segunda ficou evidente no comunicado final da FIA. Depois de demover o espanhol da terceira posição e entregar o troféu para Russell, a entidade voltou atrás. Alonso voltou a ser o terceiro colocado. A Aston Martin alegou que o artigo 54.4 do Regulamento Esportivo estipula que nenhuma equipe pode "trabalhar no carro" durante uma punição, e que o toque do macaco não se encaixaria nessa definição. Os comissários acataram. Precisam estudar mais as regras. Já a FIA, como instituição, prometeu "esclarecimentos". Descobriu a elasticidade idiomática. Tocar num carro é trabalhar nele? Saberemos antes do GP da Austrália;
"Definitivamente, nunca vi um carro tão rápido". A declaração foi de Hamilton, sobre o RB19. "Mesmo quando éramos os mais rápidos, nunca fomos tão rápidos. Especialmente em relação ao resto." O inglês descreveu assim o momento em que Verstappen chegou nele para ultrapassá-lo: "Nem me preocupei em defender. Nem sei bem como foi... Ele me passou muito rápido. A diferença de velocidade era enorme";
Essas declarações vêm de um atleta de ponta, de um heptacampeão mundial. De um paranoico, portanto. Devem calar fundo. Certamente causam dor;
Antes que novos rumores sobre seu contrato surgissem, Wolff apareceu para dizer que a renovação depende apenas de uma questão de "datas". Ou seja, de duração do novo acordo. Com a Mercedes do jeito que está, é mais provável que o inglês não queria assinar por mais do que uma ou duas temporadas;
Vasseur deixou Jeddah anunciando que a Ferrari deu um passo adiante. Sainz largou em quarto e terminou em sexto. Leclerc saiu em 12º, cruzou em sétimo e chiou pelo rádio: "Estar atrás desse jeito é uma merda. Não sei mais o que fazer". Se alguém souber apontar onde está essa evolução, por favor, informe na caixa de comentários;
A Alpine colocou seus dois pilotos na zona de pontos e é a quinta colocada no Mundial de Construtores, com 8 pontos. Depois vêm Alfa Romeo, com 4, Haas e Williams, com 1 ponto. AlphaTauri e McLaren estão zeradas. Que vexame, ainda mais da equipe inglesa, que um dia já foi tão dominadora como a Red Bull de Verstappen e Pérez;
Eis um belo tema para uma coluna nos próximos dias, aliás...
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