Vini Jr. não curte seu salário milionário calado e isso irrita os racistas
Tirei umas miniférias antes da maratona de fim de ano e quando me reconectei com o mundo, uma grande surpresa: Vini Jr. não conquistou a Bola de Ouro.
Até bem pouco tempo, ninguém tinha dúvidas. Vini Jr. era o franco favorito. Depois de uma Champions League impecável, Vini fez o segundo gol da final contra o Borussia Dortmund e selou a 15ª "Orelhuda" para o Real Madrid.
Para coroar, há exata uma semana da premiação, Vini reencontra o Borussia Dortmund, em jogo pela primeira fase da Champions League de 2024/2025. Os alemães ganhavam por 2x0, mas levaram uma virada espetacular: 5x2, com três gols de Vini Jr em noite épica. A imprensa espanhola chegou a compará-lo a Pelé. Enquanto fã do REI, achei um exagero. A partir daí, os holofotes se voltaram para o brasileiro. Em "tierras brasileñas", foi dada como certa a conquista de Vini. Mas não foi o que rolou.
Pouco antes da premiação, uma notícia choca o mundo da bola: O resultado acabou vazando antes do tempo. Mesmo ausente da cerimônia, o Real conquistou seu troféu. Seu técnico, Ancelotti, também foi eleito. Vini Jr ficou de fora. Perdeu a disputa para Rodri, um espanhol que defende o inglês Manchester City. Rodri joga mal? Ah, longe disso, e também tem várias conquistas no currículo. Mas, será que o critério foi apenas o desempenho em campo?
Diversas razões são especuladas para que o brasileiro tenha sido preterido.
Rodri sagrou-se campeão da Copa da Europa pela Espanha, que por sua vez se tornou a primeira tetracampeã da história. Por outro lado, Vini foi mal na Copa América, assim como toda a seleção canarinho. Vítima constante de racismo, Vini deu uma declaração contundente que foi mal recebida na Espanha, país em que atua. Ele disse:
"Se a situação do racismo na Espanha não mudar antes de 2030, a Copa do Mundo terá que ser em outro lugar".
A Copa em 2030 está prevista para acontecer na Espanha, Marrocos e Portugal, junto com Paraguai, Uruguai e Argentina, que sediarão alguns jogos da primeira fase. A Espanha não gostou.
Sua atitude provocadora, fazendo dancinhas quando faz um gol irrita os torcedores adversários, que respondem com mais xingamentos racistas. As ofensas racistas incomodaram menos os jornalistas do que as comemorações do atacante, que respondeu que continuará dançando em campo, no sambódromo e onde mais quiser.
Em resumo, o argumento é que as atitudes desqualificaram o jogador para receber o prêmio. Ou seja, num prêmio sobre futebol não foi o futebol quem falou mais alto. Vini Jr, não teve um comportamento exemplar. Se isso for verdade, como explicar a homenagem póstuma a Maradona, gigante da bola, que ganhou manchetes do mundo inteiro como viciado em drogas?
Os argumentos são diversos, mas só um explica a não escolha de Vini. Racismo.
Não apenas isso, mas o fato dele ter se tornado um porta-voz importante da luta antirracista. Mas, convenhamos. Há quanto tempo um repórter não faz uma pergunta sobre futebol ao Vini Jr.? Quem assistir às entrevistas do craque nos últimos tempos sem saber de quem é, vai ter a certeza de que se trata de um ativista que só fala disso. Me lembra quando perguntaram a um jogador porque dão sempre as mesmas respostas. Ele respondeu: É porque as perguntas são sempre as mesmas.
Não é chororô. Vini Jr. tá cansado de falar sobre racismo. Ele não é um Malcolm X, nem um pantera negra. Só queria fazer o que mais ama e que faz muito bem, que é jogar futebol. Mas é obrigado a ser ativista. Porque a cada jogo é xingado de macaco. Porque no caminho pra casa, vê um boneco preto pendurado numa ponte. Porque jogam banana no campo. E depois reclamam que ele só fala disso.
Aqui no Brasil a gente tapa o sol do racismo com a peneira da questão social. Dizem que o preconceito é contra o pobre e como os pretos são pobres, as coisas acabam se confundindo. No caso de Vini, na Espanha, não tem essa confusão. Ele é rico, famoso, um dos maiores jogadores em atividade. Aí, o problema se torna outro.
Newsletter
OLHAR APURADO
Uma curadoria diária com as opiniões dos colunistas do UOL sobre os principais assuntos do noticiário.
Quero receberVini Jr. não se conforma em baixar a cabeça e dizer sim senhor. Não sabe fingir que as ofensas não o atingem. Não sabe curtir o seu salário milionário e ficar calado. Isso irrita os racistas .
"É só não falar do racismo que ele acaba". Mas até pouco tempo, ninguém falava e ele não acabou, se é que não piorou, se é que não ficou mais explícito.
A Europa passa por um período de conservadorismo extremo. Premiar Vini Jr não acabaria com o racismo no continente, seria até uma ótima forma de maquiá-lo. Mas nem isso eles quiseram. Acho que no fundo, o comitê da France Football não queria premiar um expoente da luta antirracista, provavelmente para não politizar a premiação. O tiro saiu pela culatra. E a decisão escancarou o racismo.
Deixe seu comentário