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Julio Gomes

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Inglaterra ganha o favoritismo. Agora, falta ganhar o troféu

Sterling comemora gol da Inglaterra contra a Alemanha - Robbie Jay Barratt - AMA/Getty Images
Sterling comemora gol da Inglaterra contra a Alemanha Imagem: Robbie Jay Barratt - AMA/Getty Images

29/06/2021 19h03

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Quando cheguei para uma curta temporada em Madrid (que acabou durando cinco ótimos anos), no fim de 2003, estava rolando o Mundial de Rúgbi. Na turma que estudava comigo, havia três ingleses, empolgadíssimos com o torneio e madrugando para assistir às partidas em pubs que ficavam lotados. A Inglaterra seria campeã do mundo, ganhando uma final histórica contra a Austrália.

No dia seguinte, vi uma capa de jornal, acho que era o saudoso "The Sun", com a seguinte manchete. "1966 all over again". Algo do tipo "Como em 1966", por aí. E eu perguntei a um dos colegas. "O que aconteceu em 1966?". Eu achava que era algum evento relacionado ao rúgbi, alguma vitória histórica, algum título, sei lá. Ele olhou para mim com cara de espanto. "Como assim você está me perguntando isso? 1966, oras. Quando fomos campeões do mundo!". Precisei de alguns segundos para a ficha cair e entender que ele (e a reportagem) faziam referência ao título da Copa do Mundo de futebol.

E assim a Inglaterra celebrava o fim de um "jejum". Misturando as modalidades esportivas. Coisa, convenhamos, de quem não ganha nada. Daqui a pouco vão juntar os sete títulos de Lewis Hamilton com aquele de 66 e se autoproclamarão octacampeões mundiais.

Ali, notei como a Inglaterra, para a potência que é, havia sido poucas vezes campeã de grandes coisas nos esportes coletivos. No futebol, aquela de 66 foi a única final na história das Copas. Em Eurocopas, nunca chegou. O máximo que fez foi disputar duas semifinais.

Acompanhei muito de perto algumas campanhas inglesas, cobrindo jogos, eliminações —estive trabalhando no estádio em todos os jogos daquela sequência de 2002, 2004 e 2006, quando Felipão derrubou a Inglaterra três vezes seguidas e ficou estampado o carimbo de "perdedora" para a geração de Lampard, Gerrard, Terry, Ferdinand, Rooney e cia.

A Inglaterra alterna momentos de soberba com derrotismo. As duas coisas são péssimas para um time de futebol ganhar um campeonato. Quem acha que não vai ganhar, não ganha mesmo. Quem se acha melhor que os outros, tampouco. Na maior parte das vezes, é a soberba que atrapalha mais os ingleses.

E aí você se pergunta: como podem ser soberbos, se não ganham porcaria nenhuma? Pois é. Mas aí eles logo vão pro derrotismo completo, não dá para entender nada.

Em 2018, de forma inesperada, a Inglaterra viu-se em uma posição espetacular para chegar a uma final de Copa do Mundo. Deu sorte no mata-mata, pegou uma chave tranquila, chegou à semifinal e tinha a Croácia pela frente. Saiu ganhando. E perdeu. Ali, não parecia haver nem soberba nem derrotismo. Parecia haver uma boa geração, mas bem menos badalada do que outras —o que é bom.

Para a Euro 2020, o status já era outro. Até porque seria e é uma Euro sem sede fixa, mas com um país com mais possibilidades de jogar em casa: a Inglaterra. A única das sedes que pôde jogar as oitavas de final em seu estádio e que terá a mesma vantagem caso avance às semifinais e à final.

Bom time, jogando em casa, já com experiência de Copa do Mundo e com alguns novos talentos que surgiram e explodiram de 2018 para cá, reforçando o grupo de jogadores.

A vitória de hoje, sobre a Alemanha, somada às derrotas de França e Portugal, as últimas finalistas, faz da Inglaterra a grande favorita a ser campeã da Euro. Ou, pelo menos, chegar à sua primeira final europeia. Nas casas de apostas, ela já está na primeira colocação.

O caminho está mais do que livre. Nas quartas de final, os ingleses enfrentarão a Ucrânia —uma seleção que estava tentando desesperadamente levar o jogo contra a Suécia para os pênaltis e, na prorrogação, deu a sorte de ficar com um homem a mais e achar um gol no último lance. O favoritismo da Inglaterra é brutal. Este jogo, diga-se, é o único que os ingleses jogarão fora de Wembley (será em Roma).

Passando pela Ucrânia, a Inglaterra terá na semifinal um confronto contra Chéquia (de quem já ganhou na fase de grupos) ou a Dinamarca. Duas boas seleções, perigosas. Mas, convenhamos, não dá para não jogar a responsabilidade da vitória para os ombros dos ingleses.

Se a Inglaterra não chegar a esta decisão, será um fracasso. É sempre perigoso falar este tipo de coisa no futebol, afinal, os caras estão lá trabalhando, jogando, se matando para ganhar. Ninguém entra para perder e o peso e a pressão são grandes. Mas a Inglaterra estará jogando contra uma seleção claramente inferior e, depois, em casa. Se não chegar agora, não chega nunca mais.