Julio Gomes

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OpiniãoEsporte

Ninguém joga mais em casa na Olimpíada do que o Brasil no vôlei

A Arena Paris Sud 1 está, obviamente, no sul da cidade. Não dá para dizer que a Olimpíada está mal organizada. Já passei por perrengues e coisas absurdas, como ter de dar a volta inteira em um estádio para entrar nele no único portão disponível e, uma vez dentro, ter de dar a volta inteira de novo para chegar ao meu lugar. No caso da Arena improvisada em um pavilhão de convenções no sul da cidade, há um metrô na porta. A estação chama-se Porte de Versailles. Mas, possivelmente por segurança, talvez preciosismo, a estação fica fechada. E é necessário descer em outra e caminhar uns 10 ou 15 minutos.

Foi meu trajeto para ver de perto a seleção de José Roberto Guimarães, o maior treinador que o Brasil já teve, em qualquer modalidade, qualquer categoria, qualquer gênero. O vôlei feminino do Brasil dá gosto de ver. Entre outras coisas, porque é comandado com caráter, não só competência.

No metrô, a quantidade de camisetas da seleção brasileira era grande. Nas redondezas da arena, só dava Brasil. Um outro grupo de poloneses tentava ensaiar um "Polska", para logo ouvir um "le le ô Brasil" na orelha. Os voluntários que vão apontando os caminhos já aprenderam. É "bom dia" para lá, "bom dia" para cá.

Durante a caminhada, comecei a ouvir aquilo que não havia ouvido nenhuma vez na Olimpíada. "Tem ingresso? Tô comprando!". "Compro e vendo ingresso, compro e vendo ingresso". "Tem ingresso eu compro, tem ingresso eu compro".

Passei por um, dois, três... possivelmente uns oito entre o metrô e a entrada da arena. Os ingressos olímpicos são uma moleza para os cambistas. É só ter uma conta no site de venda de ingressos, transfere para cá, transfere para lá, basta um celular, o app dos ingressos e um WhatsApp. Não existe cambista em outros lugares do mundo? Sei lá, deve ter. Mas putz grila, como tem brasileiro atrás de dinheiro fácil, não é mesmo? Não sei se é esperteza, oportunismo ou genialidade.

Bem, cambistas à parte, lá fomos nós para dentro. E o ambiente era extraordinário. Eu não frequento jogos de vôlei no Brasil, mas obviamente sei que a modalidade se transformou em algo realmente relevante e consistente com as décadas de boa organização e ótimos resultados, tem campeonatos organizados e casas cheias. O brasileiro, em resumo, sabe torcer no vôlei. Compreende o esporte, o momento de colocar mais intensidade, de gritar mais alto. Dos 12 mil lugares na arena, mais da metade estavam ocupados por brasileiros. Bem mais, eu diria.

A única nota triste é que o tonto aqui quis colocar sua bandeira da Lusa na arquibancada. Escolhi um lugar a dedo, que não atrapalhava ninguém e nem tampava avisos de segurança ou dos Jogos. Amarrei e fui para o meu lugar. Todos de pé para o hino. Começa o jogo e... some a bandeira! Me disse um voluntário que só podem ser expostas bandeiras dos países que estão em quadra. "É uma regra estúpida, mas é a regra", disse ele. Não encontramos o canalha que levou a bandeira embora. Apesar de minha tentativa de rastreá-la ao final do jogo, não teve jeito. A bandeira da Lusa foi confiscada e estará agora tristemente jogada em algum canto de Paris. Que decepção. Já sabem o que me dar de presente quando eu voltar ao Brasil.

Mas voltando ao vôlei, que é o que importa. Fui a muitos eventos nestas Olimpíadas e vi torcidas entusiasmadas pela França, mas não presenciei nada tão intenso quanto o jogo de vôlei feminino e a vitória por 3 a 0 sobre a Polônia, com direito a segundo set épico e 38 a 36 no placar.

A gestão do som é muito bem feita. Ela traz o público de forma natural e menos boboca do que vi com o basquete em Lille. A cada ponto do Brasil é escolhido um pedaço de música que tomos conhecemos - no caso da Polônia, eram usadas músicas mais genéricas. É nítido o assombro de quem só comprou ingresso para um joguinho de vôlei olímpico e não tem nada a ver com o Brasil. Realmente, não dá para se sentir mais em casa do que isso.

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A seleção masculina tem os Estados Unidos pela frente, a feminina tem a República Dominicana nas quartas de final. Certeza de vitória, não há, mas, com o apoio barulhento, podemos contar. Franceses à parte, duvido que haja tanto torcedor de um só país em uma modalidade como há de brasileiros seguindo o vôlei. Pode chamar a Arena Sud 1 de Marrrracanãzin. É tudo nosso.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

8 comentários

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Kingston Rock

Me Envia seu endereço no mail, que chegaram preciosidades da Lusa pra vc! Abrax 

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Edson Shigueru Sakai

Ótima reportagem, mas, é uma vergonha não haver colunistas especializados em vôlei em NENHUM lugar, nem especial pras olimpíadas, com mais de 15 milhões de praticantes no Brasil, até colunista de tênis tem, com menos de um milhão, outro absurdo é a Globo priorizar o restritíssimo vôlei de praia masculino, nada contra, em detrimento deste jogão.

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Amaral Pavan S C Ltda Me

Bandeira da Lusa na olimpíada? Teje dó.

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