Agora, só resta torcer para João Fonseca ser um cara legal
João Fonseca é o novo ídolo do Brasil. O moleque de apenas 18 anos já vem sendo falado por quem acompanha tênis há algum tempo. É um talento puro, lapidado e preparado para os grandes momentos. E o primeiro deles veio hoje: estreia em Grand Slams com um contundente 3 sets a 0 para cima de um top 10 - a vítima foi o russo Rublev, número 9 do mundo, na primeira rodada do Aberto da Austrália.
O que vem a partir de agora, não sabemos. Assisti ao terceiro set junto com meu filho de 6 anos, que pediu uma raquete para o Papai Noel e começará a fazer aulas de tênis na semana que vem. E a impressão que tive é que ainda estaremos falando de Fonseca quando meu filho tiver essa mesma idade que João tem hoje. Meu filho quer muito jogar porque me vê jogando. Quantos vão querer jogar por verem João Fonseca jogando? Centenas. Milhares. Milhões, por que não.
Se ele vai ser top 10, se vai batalhar contra os Sinners e Alcaraz, se vai ganhar Grand Slams, como fizeram Guga e Maria Esther, tudo isso o tempo dirá. Para muitos, é o que mais importa. Para mim, nem tanto. Eu olho para esse menino, o potencial de estragos e coisas boas que um ídolo possa trazer, e apenas torço para que ele seja um cara legal. Que se torne um adulto decente.
Vivemos um mundo de cada vez menos curadoria. Foi-se o respeito, foram-se algumas convenções que acreditávamos serem consolidadas, estamos em uma era de ultraconexão, em que quase tudo é individual, raso e efêmero, em que estradas são derrubadas e a ordem do dia é conseguir tudo aqui e agora, sem percorrer caminhos e muito menos respeitar conhecimento ou hierarquias.
O ideal seria que João Fonseca pudesse só se preocupar em jogar tênis. Mas não é assim que a banda toca. Ele não estará isolado do mundo, das ideias, dos conflitos, do glamour, do escrutínio diário que não será mais feito por um punhado, mas, sim, por todas as pessoas. Seus passos serão avaliados, cada palavra, cada gesto e, o pior, ele será "interpretado", justa ou injustamente, de acordo com o prisma que interessar naquele momento. Novak Djokovic está aí para nos mostrar como um ídolo é facilmente capaz de cruzar a linha e jogar até vidas - não só a imagem dele - no lixo.
Eu sei que muitos dirão "já quer politizar tudo", "já quer que o menino se posicione". Como eu disse acima, o ideal é que ele apenas pudesse jogar tênis. Mas a realidade, quem faz, não somos eu ou ele.
Cinco minutos depois da vitória sobre Rublev, recebi a mensagem de um amigo. "O mais importante no momento é não deixar o Neymar se aproximar dele em nenhuma hipótese".
Exagero? Sei não. Aposto que já tem gente do entorno querendo convidar o menino para alguma festa. Assim é o mundo das celebridades. Mais uns cinco minutos e já apareceu postagem de Neymar "assistindo e torcendo".
O tênis é um esporte um pouco diferente nesse sentido, o circuito é intenso não dá muito tempo e margem para ficar pensando em bobagem. Aliás, sequer dá muito tempo de tenista ficar vendo futebol, como futebolistas assistem a qualquer coisa, ainda mais os que não jogam. Tênis é um esporte individual, se você sair do rumo pode passar seis meses sem ganhar uma partida sequer. João Fonseca não precisa de um Instagram de 200 milhões de seguidores para ganhar dinheiro, o que ele precisa é jogar e ganhar, como fez a vida toda e fez hoje para todo mundo ver. Espero que o entorno dele e quem administra a carreira saibam disso. E sim, que ele seja um exemplo mais positivo do que Neymar.
Não sei quem cuida do João Fonseca. Não sei quem são pai e mãe. Não sei como ele se posiciona, se é que já se posiciona, ou o que fazem e falam familiares e amigos. Tudo isso é inevitável, porém. Aqui do meu lado, só resta torcer. Tomara que João Fonseca seja um cara legal.
237 comentários
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Jorge Luiz Dantas
Excelente texto! Que ele seja tão gente boa como o Guga!
Wilson Roberto Tozzi
Já estão preocupados com quem ele vota. Quem ele apoia. Essa imprensa esquerdista é umLixo.
Paulo Ricardo Menezes Junior
Ah pronto! Ele só vai ser um cara legal se for esquerdista? Se votar no Lula? Se apoiar causas identitárias? Tá difícil acompanhar a imprensa no Brasil.