CEO do Pacaembu, Mancha, Petraglia: Quando agredir virou o novo normal?
Tivemos uma terça-feira de agressões. Com diferentes contextos e quase sempre a mesma consequência: nenhuma.
No Parque palestrino, a Mancha insultou Anderson Barros e vaiou o time. É claro que torcedores de futebol entendem bem pouco de como gerir um clube e as finanças para montar elencos, mas alguém tem orquestrado as "críticas" a um executivo que trabalha quieto e bem. O Palmeiras é um exemplo a ser seguido, e não é porque outros clubes gastam o que não têm (eu ia dizer "não podem", mas pior que podem) que a diretoria verde tem de fazer o mesmo.
A pena é o Palmeiras fazer um trabalho tão bom na base, possivelmente o melhor da história de qualquer clube brasileiro, e perder os jogadores de forma tão rápida. Isso sim merece vaias. De quem é a culpa? Essencialmente, do entorno dos jogadores (familiares e empresários), ávidos por ganhar muito dinheiro aqui e agora. Mas é também dos clubes, que não se importam em colocar milhões para dentro rapidamente, e dos próprios jogadores, que hoje em dia estão mais preocupados em jogar fora do que triunfar aqui.
Não é porque vende jogador por muito dinheiro, no entanto, que tem que gastar o mesmo dinheiro automaticamente comprando outros atletas. E olhem que o Palmeiras fez uma contratação de muito valor e que terá muito impacto - Paulinho, que estará pronto para jogar na parte da temporada que realmente importa. É de uma miopia terrível de parte da torcida do Palmeiras insultar quem está no comando do clube - importante ressaltar que outra parte do estádio vaiou as vaias.
Quando é que xingar o time virou algo normal? Sei lá. A origem possivelmente passe pelo brilhantismo de quem cunhou a seguinte aberração: "O torcedor paga ingresso e tem direito de xingar". E passa pelos tempos atuais. Tempos de falta total de respeito, em que todo mundo acha que pode agredir, gritar, apontar o dedo para todo mundo. O senhor Abel é vítima, mas faz muito disso também - com arbitragens, jornalistas, etc.
Na Arena athleticana, Mário Celso Petraglia, o presidente do clube, em condições delicadas de saúde, apareceu para ver o time empatar com o Cianorte. Ele não ia ao estádio havia quase um ano e estava no hospital durante quase todo o Brasileirão. Sem uma devida passagem de bastão, após anos de grande trabalho, o Athletico foi rebaixado no Brasileiro. Pagou o preço do excesso de centralização de poder exercido por Petraglia.
Torcedores xingaram o presidente na Arena. E o que ele fez? Mostrou o dedo do meio, com as duas mãos simultaneamente e muita vontade. Não é de se espantar, já que Petraglia sempre tratou torcedores de futebol como um mal necessário do negócio - e nunca fez questão de esconder isso.
Torcedores não deveriam estar xingando ninguém, mas vai fazer o quê? É parte da nossa má educação. São os sentimentos medievais que o futebol desperta, aqui e em qualquer lugar. Agora, um presidente fazer gestos obscenos para os torcedores? Isso é uma total falta de decoro. No Brasil, nos acostumamos nos últimos 10 ou 12 anos a esmagar certas liturgias.
Em tempos civilizados, um presidente de clube que fizesse isso seria afastado imediatamente do cargo. Hoje em dia, virou o novo normal. Os xingamentos, que antes ficavam restritos ao trânsito e aos estádios de futebol, hoje são entoados por presidentes da República, nos espaços de debate político, contra jornalistas em qualquer lugar e a qualquer hora, contra professores, na feira, no supermercado, no hospital, no meio da rua. Todo mundo se sente empoderado para xingar quem quiser.
E antes fosse só isso! Agora, todos se sentem empoderados a bater em quem quiser. Como fez Eduardo Barella, CEO do novo Pacaembu, ao desferir um soco contra o repórter da Folha de S.Paulo, Demétrio Vecchiolli. Por sorte, o assessor de imprensa do estádio privatizado notou que a agressão estava a caminho e conseguiu evitá-la.
Repito, há certas liturgias que deixaram de ser respeitadas. Hoje em dia, um deputado passa a mão em uma deputada em plena luz do dia na Assembleia paulista e nada acontece com ele. Se isso não é falta de decoro, por que será falta de decoro socar um repórter que tenha feito alguma reportagem que desagradou o machão?
Se um prefeito de São Paulo ou um administrador público de estádio socasse alguém ou tentasse socar alguém em outros tempos, seria imediatamente impedido de seguir no cargo. Hoje, é capaz que aplaudam. De qualquer maneira, quando se trata da coisa pública, a população sempre terá voz de quatro em quatro anos. Mas e quando a coisa pública é colocada nas mãos de gente desqualificada por 10, 20 ou 30 anos? A que tipo de avaliação está sujeito o CEO da empresa que toca o Pacaembu privatizado?
Se você aluga tua casa e o inquilino faz barbaridades, você faz o quê? Tira o inquilino. Me parece que os donos do Pacaembu (os contribuintes paulistanos, neste momento representados pelo prefeito Ricardo Nunes) deveriam pedir satisfações ao atual inquilino e administrador por sua atitude covarde e medieval.
Não sou contrário à privatização do Pacaembu. Apenas não gosto da demonização de tudo o que é público e a santificação de tudo o que é privado. Em geral, os entes das duas esferas têm níveis parecidos de incompetência - e, como vemos, de falta de educação e respeito pelos cargos que ocupam.
A tentativa de soco, os dedos de Petraglia e os xingamentos a profissionais decentes do Palmeiras possivelmente passarão impunes. É nosso novo normal.
7 comentários
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Paulo Luque Cáceres
Quanto ao Anderson Barros, se faz necessário um exercício de memória. Quando ele chegou ao Palmeiras, o time base do Palmeiras era Weverton, Marcos Rocha (Myke), Gustavo Gómez, Luan (F. Melo) e Mathias Viña. Danilo (Patrick de Paula), Gabriel Menino (Zé Rafael), Rafael Veiga, Gustavo Scarpa. Dudu e Luiz Adriano. Desse time, acrescido por Rony, que venceu a Libertadores daquele ano, já saíram Luan, F. melo, Viña (esse é o único que foi devidamente substituído pelo Piquerez), Danilo, Patrick, Gabriel Menino, Scarpa, Dudu e Luiz Adriano. Agora, pegando quem chegou, podemos, verdadeiramente, dizer que Anderson Barros fez um bom trabalho? As contratações supriram bem as saídas? Na minha opinião, a torcida palestrina tem razão em vaiar o Barros. O time decaiu, e vem decaindo ano a ano. Não vou nem citar o Endrick, Luiz Guilherme, Giovane, Estevão. O fato é que, as contratações feitas pelo Barros são ou foram esdruxulas, e o torcedor sabe disso.
Camilla de Vilhena Bemergui
Excelente coluna: mostra como três ações distintas dizem tanto da nossa falta de educação. E isso porque ficamos restritos à elite do futebol e às esferas de poder político de SP. Se formos estado por estado, divisão por divisão, o chorume alimenta a grande produção agrícola brasileira.
Luiz Carlos de Moraes Hecker
No futebol tudo é fase e a do parmera está acabando!!!