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Lei em Campo

Lei proíbe contratos com atletas com prazo inferior a 3 meses. Entenda

13/04/2020 11h41

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A pandemia do novo coronavírus colocou a economia do planeta em risco, e o futebol não driblou essa. Assustados, os clubes tentam encontrar alternativas de sobrevivência. Em reunião na sede da Federação do Rio de Janeiro na semana passada, os clubes propuseram ao presidente do Tribunal de Justiça Desportiva carioca, Marcelo Jucá, que fosse permitido firmar contrato especial de trabalho desportivo com os atletas por período inferior a três meses.

São duas as questões jurídicas que trariam insegurança e essa ideia: a Lei Pelé, que traz no artigo 30 proibição expressa para contratos com prazos inferiores a 3 meses; e o outro impeditivo, também fundamental: a Justiça Desportiva não tem competência para deliberar sobre esta matéria, basta olhar o artigo 217 da nossa Constituição Federal, e o artigo 50 da mesma Lei Pelé que atribuem quando esse órgão especializado pode agir.

"A Lei Pelé diz que o mínimo de tempo de contrato de trabalho desportivo é de três meses, mas provavelmente eles vão ter que fazer contratos de dois meses para terminar o Estadual e mesmo a Lei Pelé vedando todos concordando e fazendo um pedido ao tribunal, é passível de homologação. Isso na questão desportiva. O tribunal vai entender que o contrato trabalha válido. Logo, ele preenche o requisito para o atleta ser escalado regularmente", argumenta Jucá, em entrevista ao Lei em Campo.

A Justiça Desportiva tem competência para determinar a elegibilidade, condição de jogo, do atleta. Mas com relação ao vínculo trabalhista, alguns especialistas entendem que essa decisão provocaria uma insegurança jurídica, e esses contratos poderiam ser discutidos posteriormente na Justiça do Trabalho.

A advogada especialista em Direito Esportivo Fernanda Soares explica: "o momento é excepcional e diversas medidas estão sendo tomadas pelo poder público por conta dessa excepcionalidade; são medidas que visam mitigar os efeitos econômicos da pandemia. Nesse sentido, por exemplo, observa-se a adoção de várias medidas provisórias na área trabalhista para enfrentamento do estado de calamidade pública".

"Não existe relativização de lei trabalhista. O jogador não precisa entrar em campo depois da data estipulada em seu contrato de trabalho. O TJD-RJ não tem competência funcional para dizer que um contrato de trabalho pode ser estendido apenas porque o clube precisa terminar a competição. O empregado tem de ser escutado e pode não querer continuar naquele clube. Não se pode prorrogar sem a concordância do atleta, o que gera um contrato novo, e que por ser novo precisa ser de no mínimo mais três meses", afirma o advogado trabalhista Higor Maffei Bellini.

Mas a questão é complexa e o entendimento não é unânime. O fato de o mundo passar por uma situação inédita pode flexibilizar o que foi visto até então em termos contratuais.

"Não vejo problema na decisão. É questão relativa à competição. Logo, a decisão isolada não está sujeita a ser questionada na Justiça do Trabalho. Na verdade, no que concerne ao direito do trabalho, é possível interpretar que se trata de uma prorrogação, um aditivo contratual, interpretação essa baseada na flexibilidade em razão do momento vivido e princípios do direito civil. Além disso, ainda sobre direito do trabalho, poder-se-ia fazer um acordo coletivo, prevalecendo o negociado sobre o legislado", avalia o juiz Ricardo Miguel, do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-RJ).

Outro ponto importante sobre essa decisão do TJD-RJ fica na possibilidade de, no futuro, um clube que se sinta prejudicado, ir ao Tribunal alegando escalação irregular de um jogador que teve o contrato estendido só para disputar as rodadas finais do Campeonato Carioca. Para o presidente do órgão, essa questão está superada sem risco de qualquer questionamento no próprio tribunal.

"No documento todos concordam", afirmou Jucá, de forma enfática. "Não terá denúncia. O pedido é impossível. O contrato está válido", completou o presidente do TJD-RJ.

Claro que a pandemia traz uma situação atípica, totalmente imprevisível e que gera uma insegurança jurídica muito grande. Nessa hora, o movimento esportivo ao lado do mundo jurídico precisam trabalhar em conjunto.

A Fifa emitiu um manual com orientações sobre contratos para as entidades filiadas, e já mudou regras sobre transferência. Inclusive, orientando que contratos sejam estendidos até o fim da temporada, ou fim de campeonatos. Todas essas medidas visam combater os efeitos econômicos provocados pela Covid-19.

Além disso, o trabalho legislativo segue. No início de abril, o Senado aprovou um projeto de lei emergencial que modifica temporariamente leis do Direito Privado e modifica profundamente diversas relações jurídicas.

Foi apresentada uma emenda à Lei 13.982/2020, que é a lei que institui e delibera sobre as regras do Auxílio Emergencial. Ela inclui atletas e paratletas entre os trabalhadores que podem receber o benefício.

A emenda diz que "os trabalhadores do esporte, entre eles, atletas, paratletas, técnicos, preparadores físicos, fisioterapeutas, nutricionistas, psicólogos, árbitros e auxiliares de arbitragem, de qualquer modalidade, incluindo aqueles trabalhadores envolvidos na realização das competições".

O projeto já foi aprovado pelo Senado e agora segue à Câmara do Deputados para votação e, se aprovado, fica no aguardo da sanção presidencial.

A situação é grave e todos devem participar das discussões, para se encontrar os caminhos legais possíveis para diminuir um prejuízo que já é inevitável. O Direito está agindo, seja através de Medidas Provisórias editadas pelo Executivo, seja pelo poder constitucionalmente constituído para isso, o Legislativo, ou mesmo pelo Judiciário. O movimento esportivo também vai adequando regulamentos, e orientações, aproveitando sua autonomia, mas observando sempre os limites jurídicos estatais.

Com Thiago Braga

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