Alteração na Carta Olímpica poderá trazer mudança histórica para o esporte
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Por Gabriel Coccetrone
O Comitê Olímpico Internacional (COI) analisa fazer uma importante mudança no mundo do esporte. Pressionado por atletas e federações, a entidade lançará em outubro uma pesquisa para discutir alterações na Regra 50, que proíbe qualquer tipo de manifestação ou propaganda política em eventos olímpicos ou esportivos. Em caso de alteração, a reforma passará a valer para as Olimpíadas de Tóquio 2021.
Atletas têm voz importante na sociedade e são cobrados cada vez mais a se manifestarem. A Global Athlete (Movimento Internacional dos Atletas) foi uma das principais responsáveis em conseguir com que a entidade olímpica reveja e discuta mudanças na Regra 50 da Carta Olímpica. A pressão acontece há anos, porém ganhou ainda mais força depois que o presidente do COI, Thomas Bach, dizer que puniria os competidores que protestassem nos Jogos Olímpicos por causa da morte de George Floyd, homem negro asfixiado até a morte por policias nos Estados Unidos e que gerou uma onda de manifestações contra o racismo no mundo.
Segundo Andrei Kampff, advogado especializado em Direito Dsportivo e colunista do Lei em Campo, "tensão gera mudança, de fora para dentro. Mobilizados, os atletas mostraram a força que muitos ainda desconhecem ter, como se viu na NBA. Eles fazem parte da cadeia associativa do esporte. E, por isso, precisam ter voz nas discussões, inclusive sobre regras, A verdade é que a Lex Sportiva (sistema em que o esporte se organiza) sofre um "déficit democrático", como bem definiu o professor e colunista do Lei em Campo Wladimyr Camargos."
A Regra 50 da Carta Olímpica determina que "nenhum tipo de demonstração ou propaganda política, religiosa ou racial é permitida em qualquer evento olímpico, local, ou outras áreas". Atualmente, só é liberado que o atleta se manifeste livremente nas zonas mistas e durante entrevistas. Caso aconteça o descumprimento, é previsto punições desportivas, suspensões e multas, podendo, inclusive, causar a perda dos patrocínios ao competidor.
O COI alega que mantem a regra dessa forma para "proteger a neutralidade do esporte e dos Jogos Olímpicos".
Para a advogada especialista em direito esportivo e colunista do Lei em Campo, Ana Paula Terra, é necessário que aconteça uma adequação da regra para os tempos atuais.
"O objetivo da regra não foi proibir a liberdade de expressão, mas seu conteúdo tem essa consequência. Não considero que a regra deva ser abolida, mas adequada aos novos tempos em que o atleta é conhecido por sua performance esportiva, mas a usa para promover causas e ideias. Assim, acredito que a regra deveria conter uma ressalva que ligasse a liberdade de expressão à competição, justamente os valores olímpicos. Crenças e agendas que fossem, ao contrário, racistas, a favor do nazismo, não deveriam ser permitidas, justamente por não combinarem com o espírito de união pregado pelo Olimpismo. Esse é o cuidado", ressaltou a advogada.
Recentemente, casos como o da brasileira Carol Solberg que gritou 'Fora Bolsonaro' durante a premiação, do piloto inglês Lewis Hamilton e dos jogadores da NBA que cobraram justiça nos casos de racismo, chamaram a atenção do mundo. A jogadora de vôlei brasileira irá a julgamento, na próxima terça-feira (6), no STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva) pelo ato e poderá ser punido com multa em até R$ 100 mil e suspensa das próximas competições.
"A liberdade de expressão não é absoluta. Nenhum direito fundamental é absoluto. No Brasil, a interpretação constitucional dessa liberdade é 'com responsabilidade'. Cada vez mais os atletas, principalmente em países com maior tradição democrática, se sentem à vontade para fazer declarações e impor isso em jogos. Um exemplo é a NBA, que está fazendo isso agora, com a camisa dos jogadores contendo o nome deles e frases contra o racismo. Isso está ganhando um espaço cada vez maior, e o COI, e até o próprio Brasil, terão uma maior liberação para que os atletas possam se manifestar, inclusive dentro de quadra e do campo", avaliou o advogado constitucionalista Daniel Falcão.
Nas discussões sobre possíveis mudanças na Regra 50, atletas que participaram da pesquisa divergem sobre o assunto. Alguns acreditam que é preciso um relaxamento total da regra, enquanto outros que se deve preservar o pódio olímpico e sua mensagem histórica. Há um consenso, ninguém quer posições extremistas, mas sim, liberdade de expressão na proteção de Direitos Universais, podendo se manifestar em casos que os direitos humanos forem feridos.
"As ideias que servissem para justamente reafirmar os valores olímpicos, deveriam ser, inclusive, incentivadas. Assim, defesas do meio ambiente, da diversidade, da igualdade entre os povos, que sejam contrárias ao racismo e à exclusão de qualquer natureza, deveriam, na minha opinião, passar a ser aceitas em qualquer local, devendo ser regulado o que poderia ser usado em prol dessa manifestação de ideias", completou Ana Paula Terra.
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