Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Com "emenda Globo", Lei do Mandante ganha "segurança jurídica"
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Por Gabriel Coccetrone
As discussões sobre os direitos de transmissão de uma partida de futebol no Brasil voltaram com tudo nos últimos dias. Isso por que a Câmara dos Deputados deve votar ainda nesta semana o Projeto de Lei nº 2336/2021, também conhecido como Lei do Mandante, que mexe nesse modelo de negócio.
O texto da nova legislação garante ao clube mandante o direito de negociar a transmissão da partida, não havendo necessidade de ter contrato com a mesma emissora da equipe visitante, conforme obriga a legislação que está em vigor, seguindo a Lei Pelé (Lei 9.615).
No entanto, para evitar todo o imbróglio e insegurança jurídica que aconteceu durante a vigência da MP 984 no ano passado, o relator da Lei do Mandante, o deputado federal Julio Cesar Riberio (Republicanos-DF), fez acordo e inseriu no texto final parte da chamada "emenda Globo", na noite desta terça-feira (13).
A Globo, principal detentora dos direitos de transmissão do futebol brasileiro, possui contratos referentes ao Campeonato Brasileiro Série A até 2024 e da Série B até 2022, defendendo que a nova legislação passe a valer apenas a partir do próximo ciclo de negociações, em 2025 e 2023, respectivamente, respeitando os acordos já celebrados. Esse argumento foi classificado de "emenda Globo" e proposto pelo deputado Alex Manente (Cidadania-SP).
"A gente fez o que é, no meu ponto de vista, justo. Os clubes já têm contrato com algumas emissoras e contratos vigentes não podem ser quebrados", disse o relator Julio Cesar ao 'UOL'.
"A solução encontrada vai nesse sentido. Respeita os contratos em vigor, e prevê que os clubes que não tenham contrato em vigor possam celebrar contratos imediatamente obedecendo a regra proposta pela lei", avalia Tiago Gomes, advogado especialista em direito comercial.
Consenso entre os deputados, a única discussão que faltava ser resolvida à cerca do PL 2336 era sobre essa questão: o respeito aos contratos já celebrados.
Antes da inclusão da emenda, o advogado Maurício Corrêa da Veiga explicou que era preciso "respeitar o Ato Jurídico Perfeito", conforme estabelece a Constituição Federal.
"Assim que o PL 2336 for aprovado, os seus efeitos serão imediatos (salvo eventual disposição em contrário no próprio texto legal). Todavia, os contratos que firmados sob a égide da lei anterior continuam vigentes em razão do princípio constitucional do respeito ao Ato Jurídico Perfeito e não podem ter sua validade questionada em razão de edição de lei posterior. Tal qual ocorreu recentemente em Portugal", afirma o advogado especializado em direito desportivo e colunista do Lei em Campo.
Tiago Gomes segue a mesma linha. Para ele, a garantia de uma segurança jurídica sobre o tema passaria necessariamente pelo respeito aos contratos já celebrados.
"Sob uma perspectiva de segurança jurídica, me parece não haver dúvidas que o melhor caminho para qualquer alteração da legislação será respeitar os contratos anteriormente celebrados, inclusive para que não se possa questionar sua constitucionalidade", avaliou.
Após a decisão de incluir o trecho da "emenda Globo", o Movimento Futebol Livre, formado por grande parte dos clubes das Séries A e B, considerou que "a Câmara avançou em torno de uma lei equilibrada, que abre o mercado imediatamente para os clubes sem contrato e preserva os direitos adquiridos de contratos em vigor".
De acordo com a informação revelada pelo 'UOL Esportes', representantes de clubes das Séries A e B do Brasileirão estiveram em Brasília na manhã desta terça-feira (13) para se reunir com o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), em audiência com o deputado Fred Costa (Patriota-MG).
A principal intenção do encontro foi de pressionar para que a votação da Lei do Mandante não incluísse a "emenda Globo". No entanto, houve um acordo para que o trecho fosse incluído.
Essa discussão levou a uma verdadeira batalha judicial entre Athletico-PR e a Globo no ano passado.
Na ocasião, o Furacão se aproveitou da Medida Provisória 984 e criou seu próprio pay-per-view para transmitir suas partidas. A Globo decidiu entrar com um processo e obteve duas liminares que impediam a exibição. No entanto, o clube conseguiu reverter as decisões.
Após a MP do Mandante caducar e perder a validade, em outubro, o Athletico anunciou a venda dos direitos para a empresa 'Livemode' para serviço de pay-per-view. A Globo não gostou do que viu e acusou o clube de má-fé por fechar contrato com uma empresa de forma escondida.
O Athletico conseguiu liminar que autorizava o clube a exibir as partidas em sistema fechado diretamente. A alegação era de que o contrato foi fechado com a legislação vigente naquele momento e que, portanto, tudo estava dentro do permitido. Por outro lado, a emissora entendeu que acordos jurídicos celebrados anteriormente foram quebrados.
Em dezembro do ano passado, a Globo chegou a conseguir uma liminar que impedia o Athletico de exibir as partidas, mas, no mesmo mês, o clube conseguiu derrubar essa liminar.
Caso a Lei do Mandante não incluísse a "emenda Globo", a tendência é de que fosse instalado um caos jurídico, com uma chuva de ações nos tribunais, como ocorreu recentemente. Um dos beneficiários com o texto seria a 'TNT Sports', dona dos direitos de sete clubes - Palmeiras, Santos, Athletico-PR, Bahia, Fortaleza, Ceará e Juventudes - na TV fechada, que poderia escolher qualquer partida em que uma dessas equipes fosse o mandante para realizar a transmissão, garantindo a exibição de uma maior quantidade de jogos do que estava previsto inicialmente.
Esse ponto também foi alvo de judicialização no ano passado, após a Globo acionar a Justiça para impedir que Turner transmitisse as partidas do Campeonato Brasileiro dos times de futebol com os quais possui contratos de exclusividade de transmissão para todas as plataformas.
Por fim, Andrei Kampff, jornalista e advogado especializado em direito esportivo e autor dessa coluna destaca que "segundo levantamento da FIFA, 88% dos organizadores de competições negociam seus acordos de direitos de TV de forma coletiva. Ou seja, Brasil vai na contra-mão do mundo negociando individualmente. Ainda mais importante do que mudar a lei, é mudar uma cultura do futebol brasileiro. Adversário em campo, é parceiro na construção do melhor evento esportivo. Para isso, negociação coletiva e equilíbrio competitivo são indispensáveis. O mundo nos apresenta vários exemplos."
A Lei do Mandante chegou a entrar em pauta nesta terça, mas a sessão foi encerrada antes da votação. O texto voltará a ser discutido nesta quarta (14).
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