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REPORTAGEM

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Com SAF em alta, é preciso discutir investimentos e compromisso social

Ivana Negrão

12/08/2022 17h50

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Na última segunda-feira (8), o Vasco deu início à transição para Sociedade Anônima do Futebol. Assim, o clube se torna o terceiro, entre os mais tradicionais do país, a virar empresa. Cruzeiro e Botafogo já trilharam esse caminho, que só foi possível graças à aprovação da Lei n° 14.193, em agosto de 2021. A "Lei da SAF" traz possibilidade para os clubes atraírem mais investidores, mas também compromissos sociais.

"O esporte tem uma função social e não se afasta da proteção de direitos humanos, assim como toda atividade econômica traz responsabilidade social. Isso está inclusive na Constituição Federal, e a Lei da SAF reforça esse compromisso moral e constitucional", lembra Andrei Kampff, advogado, jornalista e autor dessa coluna.

Por ser uma novidade, a SAF ainda traz muitas interrogações. É preciso discutir compromisso social, capacidade de investimento e regras de governança. Em setembro, a Brasil Futebol Expo (BFExpo), uma feira que vai reunir pessoas que trabalham com esporte na América Latina, vai ter um painel justamente para tratar do tema.

"O objetivo é debatermos o processo de evolução da indústria do futebol e como ela tem sido modificada através do estabelecimento de diferentes modelos de sociedade, dentro e fora do Brasil. Com este painel poderemos falar sobre o retorno positivo de projetos desportivos aplicados de maneira institucional, por meio de uma lógica de gestão sustentável e perene", explica Pedro Martins, diretor de futebol do Cruzeiro.

Pedro foi o primeiro funcionário da SAF do time mineiro e defende a necessidade e importância de se implantar um modelo de gestão eficiente, independentemente de ser uma associação ou clube-empresa. E esse modelo passa por um projeto esportivo, que inclui estilo de jogo, base, futebol feminino, além da responsabilidade financeira.

Atualmente, 95% dos clubes brasileiros estão endividados. Por isso, muitos deles, assim como o Cruzeiro, Botafogo e Vasco, têm buscado a mudança do modelo associativo para o societário como forma de sobrevivência ou ressurgimento. O Bahia, que negocia com o Grupo City há algum tempo, pode ser o próximo clube-empresa do Brasil.

Mas como administrar as dívidas deixadas pelas antigas gestões das agremiações? Algumas decisões na justiça tem apontado a responsabilidade da SAF em dívidas trabalhistas e fiscais da associação.

"Cada um dos mecanismos previstos na Lei da SAF para gestão do passivo dos clubes tem o seu papel e o seu potencial: ao regulamentar o RCE, por exemplo, a lei estabelece que o clube não pode sofrer penhoras ou bloqueios de receita enquanto estiver pagando em dia a fila de credores. Mas isso não altera o valor das dívidas que o clube precisa pagar dentro dos prazos previstos", informa Vitor Butruce, advogado especialista em direito esportivo.

Outra alternativa seria a recuperação judicial, na qual o clube pode propor um plano que prevê deságio de algumas dívidas e pagamento em períodos mais longos do que os do RCE.

"E, na esfera dos tribunais esportivos, o que ocorre é a aplicação de sanções em razão do descumprimento de obrigações financeiras, com possibilidade do clube ficar impedido de registrar novos jogadores, mas seus ativos são preservados. Ou seja, o clube não sofre penhoras, pode transferir jogadores para outros clubes, mas fica impedido de contratar enquanto não pagar a dívida, o chamado 'transfer ban'", acrescenta Vitor Butruce.

Na Europa, 90% dos clubes são empresas e tiveram um aumento significativo das receitas, passando de 600 milhões de euros por ano, na década de 1990, para até 5,8 bilhões de euros anuais atualmente, segundo levantamento da consultoria Ernst & Young. Os investidores, em sua maioria, são os próprios empresários dos países, americanos ou chineses.

Mesmo movimento que acontece agora no Brasil. A Lei da SAF cria incentivos ao investimento, oferece alternativas de gestão do passivo e confere tratamento tributário que estimula essa migração. "Ela não se propõe a regulamentar a disputa de competições, que é o campo das propostas sobre fair play financeiro. O tema surgiu no Projeto de Lei Geral do Esporte, cujas últimas versões apontam a necessidade de as entidades organizadores criarem regulamentos específicos sobre fair play financeiro em suas competições", finaliza Vitor Butruce.

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