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Boicote de ex-atletas à Copa do Mundo deve ajudar futebol na defesa de DH

Andrei Kampff

20/09/2022 10h00

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Nelson Mandela já escreveu que o esporte "tem o poder de transformar o mundo. Tem o poder de inspirar, tem o poder de unir as pessoas de um jeito que poucas coisas conseguem'. A Copa do Mundo no Qatar tem mostrado isso. Desde que o país foi escolhido como sede do mundial, um grande movimento global de proteção de direitos humanos entrou em ação, com personagens importantes do futebol se manifestando.

Diversos atletas e ex-atletas têm reforçado um coro coletivo contra a realização da Copa no Qatar. O país árabe tem sido alvo constantes de denúncias de violação a direitos humanos.

A postura do país-sede da Copa do Mundo deste ano em relação aos direitos das mulheres, da comunidade LGBTQ+ e dos trabalhadores migrantes responsáveis pela construção dos estádios em exibição no Qatar 2022, entre muitas outras infraestruturas gera além de manifestações públicas de repúdio, como também processos judiciais.

Já comentei aqui no Lei em Campo a notícia de que o grupo - incluindo a Anistia Internacional, Human Rights Watch, Football Supporters Europe e a Federação Internacional de Trabalhadores - esta cobrando da Fifa um pagamento de cerca de US$ 440 milhões (R$ 2,1 bilhões) a trabalhadores imigrantes que tiveram seus direitos humanos violados durante as obras para a Copa do Mundo do Qatar, prevista para ser realizado em novembro deste ano.

Além das batalhas judiciais, o coro civil tem força para mudanças importantes. E a comunidade esportiva decidiu falar.

A pressão da comunidade do futebol

Eric Cantona, ex-craque francês, ator e cantor, usou as redes sociais recentemente para dizer além de não ir ao Mundial, não vai assistir a nenhum dos jogos. O ex-jogador lembrou os "milhares de mortos" ocorridos durante a construção dos estádios que vão receber os jogos do Campeonato do Mundo.

Jordan Henderson, destaque do Liverpool, descreveu o histórico de abusos de direitos humanos do Qatar como "chocante, decepcionante e horrendo" depois jogadores da Inglaterra receberam um briefing detalhado sobre a situação no estado do Golfo.

O ex-lateral Philipp Lahm, ídolo do futebol alemão, também afirmou que não viajará ao Qatar para acompanhar a Copa. Ele também citou as infrações aos direitos humanos cometidas no país como motivo para o boicote pessoal.

— Não sou parte da delegação e não estou entusiasmado em viajar como torcedor. Prefiro acompanhar o torneio de casa — disse à revista Kicker. — Direitos humanos deveriam ter um peso importante na hora de decidir as sedes das competições. Se um país vai tão mal nessa área, você começa a se perguntar quais foram os critérios que orientaram a decisão.

Esses são alguns exemplos de atletas que se posicionaram. Isso se junta ao trabalho de coletivos globais de proteção de direitos humanos e de grandes patrocinadores do esporte que levantam bandeiras sociais. A pressão aumenta não só sobre o país sede, mas também sobre a entidade que organiza o evento.

Pressão gera mudança

Os Jogos Olímpicos de Sochi em 2014 são um exemplo de como pressão gera mudanças. Depois de escolhida a cidade russa como sede dos Jogos de Inverno, o governo do país promulgou uma lei proibindo qualquer mensagem publicitária com conotação homossexual.

Isso gerou uma repercussão internacional negativa. Houve pressão gigante, inclusive com atletas ameaçando o boicote. O Comitê Olímpico Internacional - pressionado - teve que agir e mudou a Carta Olímpica. Um pouco depois dos jogos, o Comitê alterou o sexto princípio acrescentando a expressão "orientação sexual ". E mais, colocou uma cláusula antidiscriminação nos contratos a serem celebrados com os países que sediarão os próximos jogos olímpicos

No futebol, a pressão também mudou regulamentos internos.

Depois do escândalo do Fifagate, a Fifa precisava criar uma agenda positiva. Dentro dessa estratégia, a valorização de direitos humanos ganhou destaque. Em 2017 foi lançada a Política de Direitos Humanos da entidade.

Como avanço trazido por essa política, há que se destacar a Copa de 2026, com sede em três países - Canadá, México e Estados Unidos. Ela é a primeira a ter no contrato com o país-sede cláusulas de direitos humanos.

Como parte dessas medidas, os países sedes do Mundial precisam se comprometer a seguir obrigatoriamente os princípios orientadores da ONU sobre empresas e direitos humanos e a desenvolver estratégias nessa proteção.

Avanços

A pressão que ocorre agora contra a Copa do Qatar e já aconteceu anteriormente acaba por trazer para o ambiente esportivo o debate necessário e contemporâneo indispensável à sociedade, aos Estados e aos organismos internacionais. O esporte não se afasta do direito e o direito não se afasta da proteção de direitos humanos.

Se as leis estatais no Qatar - e é preciso entender realidade local - dificilmente mudarão, o esporte precisae aprender com essas irritações avançar na proteção de compromissos inseparáveis.

As medidas tomadas para escolhas das sedes de grandes eventos esportivos decorrem também de recomendações constantes em suas novas políticas e regramentos internos. Isso mostra uma resposta efetiva do movimento esportivo às críticas que sofreu relacionadas a questões como sustentabilidade, transparência, gestão e respeito aos direitos humanos.

E a pressão de todos - atletas, sociedade civil, coletivos globais e patrocinadores - tem um papel importantíssimo.

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